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Pequenas Exposições e Meditações Espirituais - Parte 3/4

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ÍNDICE


Pequenas Exposições e Meditações Espirituais

Parte 3/4

J. G. Bellett

Deus Manifestado em Carne

 

Ao longo do Evangelho de João, podemos perceber que um senso da glória de Sua Pessoa está sempre presente na mente de Cristo. Isso é assim, quer O acompanhemos de cena em cena em Seu ministério público (João 1-12), quer por Suas palavras de despedida com Seus eleitos (João 13-17), quer no caminho de Suas dores finais (João 18-19), ou na ressurreição (João 20-21).

 

Esta plena glória pessoal que Lhe pertence é declarada logo no início deste Evangelho (João 1:1), e ali reconhecida pela Igreja, consciente, como ela é, de que ela discerniu essa glória (João 1:14). Mas, como acabei de dizer, essa glória está sempre presente em Sua própria mente. Ele está no lugar onde os arranjos da aliança O colocam, e está realizando aqueles serviços que zelam pela manifestação da glória do Pai depositada sobre Ele; mas ainda assim, Ele toma conhecimento de Si mesmo na plenitude da glória da Divindade que Lhe pertencia, essencial e intrinsecamente Sua. (Veja João 2:21; 3:13; 4:14; 5:23; 6:46, 62; 7:37; 8:58; 9:38; 10:30, 38; 11:11, 25; 12:45; 14:15; 16:15; 18:6; 19:30; 20:22).

 

O Espírito no santo, dessa maneira, ainda O glorifica. O santo pode reconhecê-Lo no lugar da sujeição à aliança, ou pensar n’Ele em Suas tristezas e sofrimentos, mas (como Ele mesmo nos dias de Sua carne) nunca perde o senso daquela glória pessoal que é essencial e intrinsecamente Sua. O próprio caminho de Cristo quando esteve aqui, e a experiência presente do santo, estão, portanto, em perfeita concordância. E quando olhamos um pouco para as epístolas, encontramos algo ainda em harmonia – quero dizer, neste particular. O Espírito nos apóstolos não enfrenta um tratamento injurioso dirigido a Pessoa de Cristo com o mesmo tom com que trata um erro, concernente à verdade do evangelho. E essa diferença de tom é muito significativa. Por exemplo, na epístola aos Gálatas, onde a simplicidade do evangelho é defendida, há uma súplica e um anseio em meio a raciocínios sinceros e urgentes. Portanto, há medidas e métodos recomendados (como admoestar, acusar, repreender, calar a boca, 1 Timóteo 1 e Tito 1), e não um processo sumário e de exclusão imediata, quando se trata de corrupções Judaizantes. Mas quando é a Pessoa do Filho de Deus que está em questão, quando Sua glória deve ser afirmada, não há nada disso. O tom é outro. Tudo é absoluto. “Saíram de nós, mas não eram de nós; porque, se fossem de nós, ficariam conosco”; “não o recebais em casa”; “Todo aquele que ultrapassa a doutrina de Cristo e nela não permanece não tem Deus” (ARA)[1].

[1] Comer apenas legumes e observar dias santos, se interpretados integralmente, são costumes que depreciam o evangelho ou afetam a plena beleza da verdade. Mas tais coisas devem ser suportadas (Rm 14). E nossa alma tem plena consciência disso: a depreciação da Pessoa do Filho não receberia um decreto em seu favor dessa maneira.

 

O Espírito, como posso dizer, considera o decreto como o mais sagrado e o guarda com zelo instintivo, “Para que todos honrem o Filho, como honram o Pai” (João 5:23).

 

Tudo isso a respeito de Sua plena glória divina é precioso aos pensamentos de Seu povo. Somos, no entanto, levados também a contemplar o Homem n’Ele, e por meio de uma sucessão de condições, vemos n’Ele o Homem apresentado a Deus com uma satisfação e deleite infinitos, ainda que variados. Há muito tempo, O tenho seguido da seguinte maneira, como Homem em toda a perfeição:

 

Nascido – O material, por assim dizer, moral e físico, é apresentado em Jesus como Aquele que nasceu. Ele era um feixe imaculado da colheita humana. O homem n’Ele era perfeito como criatura (Lucas 1:35).

 

Circuncidado – Jesus, nesse sentido, estava sob a lei, e a guardou, como seria de se esperar, com toda a perfeição. O homem n’Ele era, portanto, perfeito como se estivesse sob a lei (Lucas 2:27).

 

Batizado – Nesse caráter Jesus é visto Se curvando à autoridade de Deus, reconhecendo-O em Suas dispensações, e o homem n’Ele é perfeito em toda a justiça, bem como sob a lei (Lucas 3:21).

 

Ungido – Como ungido, Jesus foi enviado para o serviço e o testemunho. Nesse sentido, o homem é visto n’Ele como um Servo perfeito (Lucas 3:22).

 

Devotado – Jesus entregou-Se a Deus, deixou-Se em Suas mãos para cumprir toda a Sua vontade e beneplácito. N’Ele, o homem era, portanto, perfeito como um sacrifício (Lucas 22:19-20).

 

Ressuscitado – Este inicia uma série de novas condições nas quais o homem se encontra. Este é o primeiro estágio do novo estado. João 12:31-32 indica um novo curso no homem, como aqui mencionado. O grão de trigo, tendo caído na terra e morrido, agora está capacitado para ser frutífero. O homem em Jesus ressuscitado está em vida indestrutível.

 

Glorificado – O Homem ressuscitado, ou Homem em vida indestrutível, veste uma imagem celestial. O novo homem tem um novo ou glorioso corpo.

 

Reinando – O Homem ressuscitado e glorificado recebe, no devido tempo, autoridade para executar o julgamento. O domínio é d’Ele. A soberania perdida do homem é recuperada. A Escritura nos conduz por esta série de contemplações sobre o Filho do Homem. E embora eu fale aqui do Homem, como antes falei da glória divina, não divido a Pessoa. Em tudo isso, é “Deus manifestado em carne” que temos diante de nós.

 

Precisamos caminhar suavemente sobre esse terreno, e não multiplicar palavras. Sobre um tema tão elevado, precioso para o coração amoroso e adorador, podemos nos lembrar do que está escrito: “Na multidão de palavras não falta transgressão” (ARC).

Jesus Cristo Veio em Carne

 

A arca e o arraial eram, em certo sentido, necessários um ao outro durante a jornada pelo deserto. A arca, assentada no tabernáculo sobre o qual repousava a nuvem, tinha que guiar o arraial; e o arraial, em sua ordem, tinha que acompanhar e guardar a arca e tudo o que estava relacionado a ela.

 

Esta era a missão do arraial. Deveria haver sujeição à vontade d’Aquele que habitava na nuvem; dependência d’Aquele que os guiava diariamente; liberdade consciente por terem deixado o Egito para trás, e esperança por terem Canaã diante deles. Uma mentalidade como esta deveria estar no arraial; mas sua missão era conduzir a casa mística de Deus para o seu descanso, a “posse da terra das nações” (AIBB).

 

A jornada deles por aquele deserto não teria constituído uma peregrinação divina. Muitos já haviam percorrido aquele caminho sem ser estrangeiros e peregrinos com Deus. Para que fossem assim, a arca precisava estar em sua companhia.

 

A mente do arraial, da qual falei, poderia revelar sua fraqueza, ou esquecer-se de si mesma, e isso poderia levar, como sabemos que levou, a repetidos castigos. Mas se seus deveres, dos quais também falei, fossem abandonados, haveria perda de tudo. E isso de fato aconteceu. O tabernáculo de Moloque foi erguido em lugar da arca de Jeová, e o arraial, portanto, teve seu caminho desviado para Damasco ou Babilônia, longe da Canaã prometida (Amós 5:25; Atos 7:1-3).

 

E assim acontece conosco. Devemos manter aquelas verdades ou mistérios que o tabernáculo e seus móveis representavam: e o apóstolo confia nossa entrada em Canaã a isso. “Se... permanecerdes... na fé”; e novamente: “se o retiverdes tal como vo-lo tenho anunciado”. Nossa segurança, nosso descanso na Canaã celestial, depende de guardarmos a verdade.

 

Contudo, deve-se acrescentar que a verdade deve ser guardada não apenas para a nossa própria segurança, mas para a honra de Cristo. Isso deve ser muito considerado. Suponhamos, por um momento, que a nossa própria segurança não estivesse em questão, mas sim a honra de Cristo, e isso bastaria. Tal coisa é contemplada em 2 João 10: a senhora eleita estava dentro de casa – ela estava em segurança pessoal, mas tinha um dever a cumprir com a “doutrina de Cristo”; de modo que, se alguém chegasse à sua porta e não trouxesse essa doutrina, ela deveria mantê-lo do lado de fora e recusar-se a recebê-lo.

 

O título de entrada é a confissão dessa doutrina, uma confissão de “Jesus Cristo vindo em carne” (ARA), uma confissão que envolve ou assegura a glória de Sua Pessoa. Uma confissão completa de Sua obra não serve. Quem está do lado de fora pode trazer consigo uma fé sólida quanto à expiação, à soberania da graça e a verdades semelhantes; mas tudo isso não é garantia para deixá-lo entrar. Deve haver confissão à Pessoa também. “Todo aquele que vai além do ensino de Cristo e não permanece nele, não tem a Deus; quem permanece neste ensino, esse tem tanto ao Pai como ao Filho. Se alguém vem ter convosco, e não traz este ensino, não o recebais em casa, nem tampouco o saudeis. Porque quem o saúda participa de suas más obras” (AIBB).

 

Certamente isso é claro e final. Creio que isso merece muita consideração. A verdade concernente à Pessoa de Cristo deve ser mantida por nós, mesmo que a segurança de nossa alma não esteja envolvida nisso. Admito que nossa salvação esteja envolvida. Mas isso não é tudo. Aquele que não reconhece essa verdade deve ser mantido fora. Isso desperta ternura, bem como força, ao ver que o nome de Jesus está assim confiado à guarda dos santos. É isso que Lhe devemos, se não a nós mesmos. O muro de separação deve ser erguido pelos santos entre eles e a desonra de Cristo.

 

A mera jornada do Egito para Canaã não basta. Mesmo que a jornada seja acompanhada de todas as provações de uma estrada tão árida, desprotegida e sem trilhas, ainda assim não é uma peregrinação divina. Uma mera vida laboriosa e abnegada, mesmo que suportada com aquela coragem moral que convém aos peregrinos, não basta. É preciso carregar a arca de Deus, confessar a verdade e manter o nome de Jesus.

 

Ora, nas epístolas de João, o nome “Jesus Cristo” expressa ou indica, creio eu, a Divindade do Filho. O Espírito Santo, ou a Unção, encheu de tal forma a mente daquele apóstolo com a verdade de que “o Verbo” que “Se fez carne” era Deus, que, embora fale d’Ele por um nome que expressa formalmente o Filho em Sua Humanidade ou em Seu ofício, para João isso não importa. O nome não é nada – pelo menos nada que possa interferir no pleno poder da firme certeza de que Ele é “Aquele que era desde o princípio”, o Filho na glória da Divindade. Isso é visto e sentido logo no início de 1 João, e assim, creio eu, em todo o texto. (veja 1 João 1:3, 7; 2:1; 3:23; 4:2; 5:20; 2 João 3-7).

 

Nos pensamentos desta epístola, “Jesus Cristo” é sempre, por assim dizer, este Ente divino, a Vida eterna manifestada. Para João, “Jesus Cristo” é “o Deus verdadeiro”. Jesus é o “Ele” e o “d’Ele” no argumento de sua primeira epístola; e este “Ele” e “d’Ele” sempre mantém diante de nós Aquele que é Deus, embora em relacionamentos assumidos e em tratamentos de aliança.

 

A confissão, portanto, que é exigida por eles é esta: que foi Deus Quem Se manifestou, ou que veio em carne (veja 1 João 4:2; 2 João 7). Pois nestas epístolas, como vimos agora, “Jesus Cristo” é Deus. O Seu nome como Deus é Jesus Cristo. E presume-se ou conclui-se que “o verdadeiro Deus” não é conhecido, se Aquele que estava em carne, Jesus Cristo, não for conhecido como tal; e tudo isso simplesmente porque Ele é Deus. Qualquer outro recebido como tal é um ídolo (1 João 5:20-21). A alma que não permanece nesta doutrina “não tem a Deus”, mas quem permanece nela “tem tanto ao Pai como ao Filho” (2 João 9).

 

Isto, julgo eu, é a mente e a importância da confissão exigida: “Jesus Cristo vindo em carne” (ARA). Falo aqui de Deus sob o nome de Jesus Cristo, e esta é, portanto, a exigência de uma confissão do grande mistério de “Deus manifestado em carne”.

 

O próprio adjunto (como alguém me escreveu), “vindo em carne”, destaca fortemente a Divindade de Cristo; porque, se Ele fosse um homem, ou qualquer coisa inferior ao que Ele é, não seria de admirar que Ele viesse em carne. E 1 João 1:2-3 nos guia aos pensamentos de João quanto ao uso do nome “Jesus Cristo”. Aquele que era desde o princípio, a Vida eterna que estava com o Pai, era a Pessoa que ele lhes declarou. As palavras “com o Pai” são importantes, tornando evidente que o Filho era o Eterno, sendo o nome deste Filho eterno “Jesus Cristo”. E é interessante comparar o final com o início desta epístola: “Este é o verdadeiro Deus e a (com o artigo) vida eterna”.

 

Desejo bendizer ao Senhor por dar à minha alma uma renovada certeza, em tão simples base da Escritura, de que recai sobre nós o dever de manter a honra do nome de Jesus.

 

No decorrer da jornada de nosso Senhor na Terra, nós O vemos das seguintes maneiras:

 

Como o Nascido – santo, satisfazendo o pensamento de Deus na natureza ou no material humano.

 

Como o Circuncidado – perfeito sob a lei, satisfazendo o pensamento de Deus quanto a ela.

 

Como o Batizado – satisfazendo o pensamento de Deus em ordem e justiça dispensacionais.

 

Como o Ungido – satisfazendo o pensamento de Deus como Sua imagem ou representante.

 

Como o Obediente – fazendo sempre aquelas coisas que agradam ao Pai,

 

Como o Devotado – satisfazendo o pensamento de Deus em todas as coisas; e entregando Sua vida (João 10:17-18).

 

Como o Ressuscitado – selado com a aprovação de Deus na vitória pelos pecadores.

 

Assim, Ele satisfaz toda a vontade de Deus enquanto provê para nós. Tudo foi magnificado n’Ele e por Ele, tudo foi tornado honroso. O deleite que Deus pretendia ter no homem, ou a glória por meio dele, foi ricamente correspondido no bendito Jesus. Pois, enquanto em Sua Pessoa Ele era “Deus manifestado em carne”, na sucessão de Seus estágios pela Terra, Ele estava realizando todo o propósito divino, deleite e glória no homem. Nada indigno de Deus havia no Homem Cristo Jesus, em Sua Pessoa, em Suas experiências ou em Seus caminhos.

A Ceia do Senhor

 

Devemos, com base na autoridade divina e na inteligência espiritual e bíblica, sustentar que a ceia do Senhor é a expressão característica do dia do Senhor – aquilo que deve então se tornar o principal.

 

Se lermos Lucas 22:7-20, aprenderemos que a páscoa dos Judeus e a ceia do Senhor, sendo então celebradas sucessivamente – uma após a outra —, esta última, a partir de então, substituiria a primeira, e para sempre. A primeira, com outros significados a ela associados, era o prenúncio do grande Sacrifício que viria no devido tempo, para tirar o pecado. A segunda é agora a celebração do grande fato de que aquele Sacrifício foi oferecido e que, pela fé, o pecado é tirado.

 

Após a instituição da ceia do Senhor, portanto, é impossível retornar à páscoa. Seria apostasia – uma renúncia ao Cordeiro de Deus e à expiação.

 

Mas, se a ceia substituiu assim a Páscoa, podemos então perguntar: “Há algo que a substitua?” Podemos ler nossa resposta em 1 Coríntios 11:26, e aprender ali que a ceia do Senhor é estabelecida como uma instituição permanente na casa de Deus até o retorno do Senhor. O Espírito Santo, por meio do apóstolo, lhe dá um lugar permanente durante toda esta era de ausência do Senhor.

 

Concluo, portanto, que não devemos permitir que nada tome o lugar que a ceia tem. É parte da nossa fidelidade na administração dos mistérios de Deus afirmar o direito dessa ceia de ser o elemento principal na assembleia dos santos. Ela substituiu a páscoa pela autoridade do próprio Senhor; mas nós, pela autoridade do Espírito Santo, não devemos permitir que nada a substitua. É o serviço próprio da casa de Deus. A ceia do Senhor é a principal coisa para o dia do Senhor.

 

Isso surge naturalmente no curso da história do Cristianismo no Novo Testamento. Lemos em Atos 20:7: “no primeiro dia da semana, ajuntando-se os discípulos para partir o pão”. E novamente, em 1 Coríntios 11:33: “Portanto, meus irmãos, quando vos ajuntais para comer, esperai uns pelos outros”.

 

Se abandonarmos a ceia por um sermão, ou por uma grande congregação, ou por qualquer outra cena ou serviço religioso, teremos abandonado a casa de Deus em seu devido caráter e em sua ocupação e adoração divinamente designadas. Em tal caso, somos culpados de apostasia. É verdade que não retornamos à páscoa deslocada ou substituída; mas permitiríamos que algo, seja o que for, tomasse o lugar ou substituísse o que o Espírito Santo estabeleceu como principal na casa de Deus. E, se tivéssemos o coração correto, diríamos: “Qual sermão seria mais proveitoso para nós? Que canto de uma congregação numerosa seria mais doce aos nossos ouvidos do que a voz daquela ordenança que nos fala tão claramente e com tão rica harmonia de toda a espécie de música sobre o perdão dos nossos pecados, sobre a aceitação de nossa pessoa e sobre a nossa espera pelo Senhor vindo do céu, e tudo isso em bendita e maravilhosa comunhão com a mais resplandecente manifestação do nome e da glória de Deus?”

 

Sim, a mesa à qual nos assentamos é uma mesa familiar. Em espírito, estamos na casa do Pai. Pela mesa, nos é dado a conhecer que estamos num relacionamento; e que isso está logo ali no reino de glória; pois “se filhos, também herdeiros” (TB). Se estamos no reino do Filho amado de Deus, estamos ao lado da herança (Cl 1). E ali a mesa é mantida até que Cristo volte.

O Novo Cântico

 

Tudo é confusão e perturbação; mas tudo está amadurecendo aquele material rebelado e apóstata, por cujo julgamento o Senhor tomará o reino. “Os gentios se embraveceram; os reinos se moveram; Ele levantou a Sua voz e a Terra se derreteu”.

 

Como Conquistador, o Senhor tomará Seu reino em breve, ou entrará em Seu segundo sábado. Outrora, o sábado foi o descanso d’Aquele que havia trabalhado; mas o sábado vindouro será o descanso d’Aquele que lutou uma batalha e venceu. Este “repouso” que “resta ainda”, portanto, será adentrado por um caminho mais árduo e difícil do que o anterior; pois será adentrado por meio das aflições e conflitos que o pecado ocasionou, e por meio do julgamento da iniquidade.

 

O Senhor Deus da antiguidade entrou em Seu descanso ou sábado como Criador. Ele havia completado a obra de seis dias e, no sétimo, descansou e foi revigorado[2].

[2] O Criador descansou: Suas obras estiveram acabadas desde a fundação do mundo (Hb 4); mas posso dizer que isso é tudo. Em outras manifestações de ação graciosa, Deus ainda não descansou. Como Pai, como Cristo, na Pessoa do Espírito Santo, e como Senhor de Israel e de toda a Terra, Deus ainda precisa alcançar o Seu descanso. O descanso é aquele que “resta ainda”, podemos dizer, tanto para Ele quanto para o Seu povo; pois Ele ainda opera com amor e poder, e eles ainda labutam contra o pecado, o mundo e o inimigo. Veja João 5:17; Ef 4.

 

Sabemos que o sábado foi perturbado e perdido pelo pecado do homem; mas também sabemos de um sábado vindouro, “repouso” que “resta ainda”, como lemos.

 

Poderíamos perguntar, então: “Em que caráter será adentrado, ou por quem?” E toda a Escritura responde: “Por conquistadores”. Davi abrindo caminho para Salomão é uma figura disso. Salomão era o pacífico – um nome que não implica um simples vindicaçãoou abstrato descanso, mas sim um descanso após um conflito ou guerra. Ele indica um descanso que vem de triunfo; algo mais do que a cessação do trabalho.

 

Assim, o Senhor entra no reino como “O SENHOR forte e poderoso, o SENHOR poderoso na guerra”; como alguém que acaba de obter a vitória, “com vestiduras tintas de escarlate” (veja Sl 24:8; Is 63:1 – AIBB; Ap 19).

 

Cristo como Conquistador é, no entanto, conhecido em diferentes cenas e épocas, e em diferentes formas e maneiras, antes de entrar no reino.

 

Assim que Ele entregou o espírito, a vitória de Sua morte foi reconhecida no céu, na Terra e no inferno; pois o véu do templo se rasgou em dois, as pedras se fenderam e os sepulcros foram abertos.

 

Ao entrar nos céus, Ele foi recebido e assentou-Se como Conquistador. Ele foi imediatamente reconhecido lá como recém-saído de Seu conflito e conquista aqui. Como Aquele que havia vencido, Ele assentou-Se com o Pai em Seu trono. Portanto, agora, em espírito, podemos cantar um novo cântico, ou um cântico de conquista.

 

Quando Seus santos se levantarem para encontrá-Lo, eles irão, cada um em sua própria pessoa, manifestar a Sua vitória – a vitória que Ele conquistou para eles. O brado deles ascendente e em resposta a proclamará: “Graças a Deus, que nos dá a vitória por nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Co 15).

 

Nessas diferentes épocas e formas, o triunfo de Cristo é celebrado antes de Sua entrada no reino. E que verdade animadora e bendita é esta: Jesus subiu ao alto como um Conquistador. Mas nunca, até que Jesus ascendeu, o céu conheceu um Conquistador. Posso dizer que um eco distante de Sua vitória havia chegado ali, quando o véu do templo se rasgou; mas o céu nunca havia sido o lugar de um conquistador até que o Senhor retornasse para lá. O Senhor Deus em Suas glórias esteve lá, o Senhor Deus como Criador e Governante também, e os anjos que se sobressaem em poder lá serviam. Alguns que não guardaram seu primeiro estado lá podem ter sido expulsos, e outros cantaram quando os fundamentos da Terra foram lançados; mas nunca a presença de um conquistador havia adornado e alegrado o céu até que Jesus ascendesse. Mas então foi assim. Ele havia destruído aquele que tinha o poder da morte; Ele havia levado cativo o cativeiro; Ele havia exposto publicamente os principados; Ele havia vencido o mundo; Ele, como o verdadeiro Sansão, havia carregado as portas inimigas até o cume do monte. As vestes mortuárias haviam sido deixadas no sepulcro vazio, como despojos de guerra e troféus de conquista.

 

E assim, como Conquistador, Jesus ascendeu. O céu já havia conhecido o Deus vivo, mas nunca antes o Deus vivo em vitória; e nossa ascensão após Ele, apenas proclamará, em outras palavras, o triunfo e será mais uma demonstração de uma hoste de conquistadores. Então, no fim, quando o reino for adentrado, ele será adentrado (como já dissemos) por um Conquistador após Seu dia de batalha e guerra de libertação das mãos dos inimigos. O reino assim erguido sobre a ruína do inimigo será inabalável.

 

Agora, de acordo com tudo isso, creio eu, é o “novo cântico” sobre o qual lemos na Escritura; pois os cânticos ali são cânticos de conquistadores, e são, por assim dizer, prenúncios do cântico do reino. Tal foi o de Moisés e da congregação às margens do Mar Vermelho; tal foi o de Débora; tais foram as declarações, se assim podemos chamar de cânticos, de Ana e de Maria; e tal será o cântico de Apocalipse 15 em seu devido tempo – os harpistas no céu, ali em vitória sobre a besta, e sobre sua imagem, e sobre sua marca, e sobre o número de seu nome.

 

Isso nos dá um “novo” tema para cantar ou alegrar-nos e, portanto, “o novo cântico”. O antigo cântico, cantado pelas estrelas da manhã sobre os fundamentos da Terra, não era um cântico de conquistador, um cântico que celebrava uma vitória divina, seja pela redenção ou pela vingança dos escolhidos de Deus. Não havia tema de vitória então, pois nenhuma batalha havia sido travada e vencida. Mas o pecado entrou desde então. Uma grande força contrária entrou em ação, e o Senhor teve que sair como “um Homem de guerra”, o Deus das batalhas; e, portanto, no final, um novo cântico, um cântico com um novo tema ou peso, deve ser despertado para celebrá-Lo nessa nova ação ou caráter de glória. O cântico de Moisés era um cântico de conquistador, e assim, era o cântico do Cordeiro. “Cantai ao SENHOR um cântico novo, porque Ele tem feito maravilhas; a Sua destra e o Seu braço santo Lhe alcançaram a vitória” (ARA). O cântico sobre a criação deve dar lugar, em amplitude e melodia, ao cântico sobre os triunfos de Jesus. A primeira “pedra de esquina” foi colocada pelo Criador, e os anjos cantaram (Jó 38:6); a segunda é trazida em vitória, e Israel exclama em brados de júbilo (Sl 118; Zc 4).

 

Que novas honras, podemos dizer com adoração e gratidão, estão sendo preparadas para Ele através de nossa história, e que novas alegrias para o céu! Pois Suas vitórias têm sido por nós, realizando, como observei, nossa libertação e justificação diante de nossos inimigos. A glória dessas vitórias é d’Ele, o fruto delas é nosso. Cristo não aparece como um Conquistador naquilo que Ele faz diante de Deus por nós, como nosso resgate, ou Resgatador pelo preço de Seu sangue. Em toda essa ação Ele sofre, em vez de conquistar; mas Ele é Conquistador contra o inimigo, redimindo-nos dele ou vingando-nos dele.

 

E é um pensamento jubiloso que o Senhor entrará em Seu reino vindouro como um Conquistador, tomando o trono de Salomão, o pacífico, após as guerras e vitórias de Davi. Mas esse gozo implica cenas de caráter tremendo. O triunfo, por si só, é uma ideia brilhante, mas está repleto de lembranças de campos de batalha e cenas de derramamento de sangue. E o mesmo acontece com o Senhor Jesus. O gozo de vê-Lo em triunfo e o poder de Seu reino é radiante e reconfortante, mas “o lagar” precisa primeiro ser “pisado”.

 

E ainda mais – embora isso seja solene – o pisar do lagar, ou a execução do julgamento divino, fala da corrupção anterior ou do amadurecimento da “videira da terra”. Se o Senhor, em juízo, tem que pisar o lagar, o lagar primeiro tem que estar cheio.

 

E onde estamos realmente situados neste momento? Não na possessão do reino inabalável; não à vista do triunfo que o anunciará, nem na audiência do novo cântico que há de acompanhar esse triunfo; não na visão do campo de Bozra e das vestes salpicadas de sangue, o dia do juízo divino que conduz ao triunfo; mas em certo estágio do amadurecimento da videira de Sodoma, que em breve será lançada no lagar, ou seja, enfrentará o juízo do Senhor.

 

Ali estamos, e o momento é solene. Cada dia, como o calor do verão, somente amadurece e prepara as uvas de fel ou os cachos de Gomorra. Nossas perspectivas são, portanto, estranhas, terríveis e gloriosas além da imaginação. Esperamos pelo aumento crescente do mal, pelo lagar da ira de Deus para recebê-lo e julgá-lo, e então pelo triunfo e pelo reino de Jesus. Por tais coisas, esperamos, até onde nossos olhos se voltam para a Terra; mas estamos “na encruzilhada, na entrada dos dois caminhos” (ARA). Enoque estava lá antes. Ele olhou para o caminho da Terra, e lá viu o amadurecimento da impiedade, e o Senhor com milhares de Seus santos vindo para executar o juízo; mas ele mesmo foi levado para cima, para o caminho dos céus (Judas 14; Hebreus 11:5). O novo cântico foi cantado por Jesus após Sua ressurreição (Salmo 40:3); ele será cantado pelos santos após sua ressurreição ou ascensão ao céu (Ap 5:9); e então será cantado por Israel no reino que é a sua ressurreição (Sl 98:1).



J. G. Bellett

 

 

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