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Abraão (Setembro de 2010)

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Revista mensal publicada originalmente em Setembro/2010 pela Bible Truth Publishers

ÍNDICE


          Tema da edição

          J. N. Darby (adaptado)

          J. N. Darby (adaptado)

          H. Smith (adaptado)

        C. H. Mackintosh

          J. G. Bellett (adaptado)

          W. J. Prost

Abraão

 

Antes que essas observações introdutórias sejam escritas, os artigos da edição são selecionados e lidos. Ao lê-los, fiquei preso pelo fato de que, quando Abraão vivia pela fé, sua vida era mais simples, mas quando sua fé falhou, sua vida se tornou mais complicada. Até a maior prova de fé de Abraão foi tratada de maneira simples. “Então se levantou Abraão pela manhã de madrugada, e albardou o seu jumento, e tomou consigo dois de seus moços e Isaque seu filho”. Ele simplesmente obedece imediatamente. Por outro lado, quando a incredulidade leva Abraão ao Egito, ele aconselha sua esposa sobre o que dizer para ocultar seu verdadeiro relacionamento com ela. Então, durante esse período, sua esposa recebe uma serva egípcia, e ela, por sua vez, complica muito a vida de Abraão e a vida de seus descendentes até hoje. É bom lembrar que a fé simplifica, enquanto a incredulidade complica. Confiar em Deus deixa com Ele os caminhos e meios; a confiança no homem depende dos esquemas complicados do homem. A sociedade atual se tornou muito complicada, mas não produz satisfação ou felicidade. Quando o Filho do Homem governar a Terra, a vida retornará a um estilo mais simples: “assentar-se-á cada um debaixo da sua videira, e da sua figueira” (Mq 4:4).

 

Tema da edição

O Chamado de Abraão – Gênesis 12:1-10

 

O povo de Deus sempre foi moral e deve estar necessariamente separado do mundo. Mas Abrão era a expressão de algo diferente, pois ele foi o primeiro a ser chamado publicamente para fora deste mundo. Além disso, Deus estava rompendo os laços naturais, pois ele não deveria apenas ser um homem piedoso em sua família, mas um homem piedoso chamado para fora de sua família. Isso distinguiu o chamado de Abrão – a afirmação pública das reivindicações de Deus sobre o Seu povo. O chamado de Israel para sair do Egito é um tanto análogo, embora não tenha sido dito a Israel: “Saia”, mas a Faraó: “Deixa ir o Meu povo”. Assim, não foi, no caso de Israel, o convite do poder da graça para aqueles que eram súditos para romper o vínculo, mas a afirmação do poder de Deus sobre o inimigo, quebrando todas as reivindicações do mundo. No caso de Abrão, era amor trabalhando, não uma reivindicação de poder. Foi a graça se tornando eficaz em sua obra no coração de Abrão.

 

O laço natural 

Por um tempo, no entanto, o laço natural não foi quebrado: Abrão saiu com Terá, seu pai. Ele não saiu da casa de seu pai; ele não havia se rendido totalmente à vontade do Senhor de uma só vez, e, portanto, o Senhor não pôde lhe mostrar a terra de Canaã. Abrão havia deixado muitas coisas, mas ele parou antes de chegar a Canaã. É verdade que ele havia deixado sua terra e sua parentela, mas não havia deixado o vínculo natural mais próximo – a casa de seu pai; portanto, Deus não pôde lhe mostrar Canaã. Ele estava apegado a Terá e indo apenas meio caminho com Deus; assim ele fica em Harã. O mesmo acontece conosco, pois se ainda queremos o que naturalmente nos pertence, não haverá a plena entrada naquelas coisas que Deus está pronto para nos mostrar. Todas as comunicações de Deus a Abrão, sobre o que era Canaã, ocorreram após, ou consequente, a sua chegada a Canaã. Deus coloca a posição em que ele deve estar em contraste direto com os laços naturais. Ele disse a Abrão: “Sai-te... para a terra que Eu te mostrarei”. Deus o havia chamado, e o chamado implicava uma reivindicação. Não era apenas a questão do governo público do mundo; Abrão é totalmente separado disso. Ele deve ser um estrangeiro na casa de seu pai e um estrangeiro ainda quando trazido para Canaã. Era o amor do Senhor repousando sobre um indivíduo e o associando a tudo o que Ele tinha em mente, enquanto o colocava no lugar de todas as promessas de bênção. Vemos do que ele foi chamado em Josué 24:2: “Assim diz o SENHOR Deus de Israel: Além do rio habitaram antigamente vossos pais, Terá, pai de Abraão e pai de Naor; e serviram a outros deuses”. Os homens não eram meramente perversos, mas Deus tendo manifestado no dilúvio o poder do governo no mundo, Satanás tomou posse desse poder na mente dos homens, que foram assim levados a adorar demônios, atribuindo a eles o poder, e não a Deus.

 

Foi isso que formou a ocasião desse testemunho público a favor de Deus ao separar Abrão de tudo ao seu redor; isso o separava totalmente de todos os laços reconhecidos no mundo. Ele não deveria ser apenas justo e adorador, mas deveria estar conectado com uma glória que o mundo havia perdido de vista, pois colocara o diabo no lugar de Deus. Assim, em Atos 7:2, diz: “O Deus da glória apareceu a nosso pai Abraão”. Deus chama Abrão para fora do mundo para uma glória posta diante dele. O mundo não é corrigido, mas deixado exatamente como estava, e agora encontramos um vínculo especial estabelecido entre Deus e Abrão. Deus Se revela a ele e diz: “Sai-te... para a terra que Eu te mostrarei”. A vida de Abrão dependia de uma ligação imediata e presente entre ele e Deus, que deveria ser mantida pelo Senhor, cumprindo tudo o que havia prometido. Assim também, o Senhor Se revela à nossa alma e dá a Sua Palavra como um terreno seguro para nossa conduta. Bendito seja Deus, podemos contar com Sua fidelidade infalível e viver pela fé em dependência diária, constante e incessante d’Ele, para sermos conduzidos à posse dos desejos de nosso coração. Mas também descobrimos que as promessas do Senhor envolveram a atuação de Abrão também, pois enquanto ele permanece com Terá, Deus não pode trazê-lo para Canaã. Ele não podia desfrutar de Terá e Canaã juntos. A bênção da fé é encontrada apenas no caminho da fé.

 

Conflito e descanso 

Em tudo o que se fala de Canaã, não é o descanso que está diante de nós. Veja o livro de Josué; lá está o conflito. Abrão descansa? Ele não tinha sequer o espaço de um pé, morando em tendas com Isaque e Jacó – uma posição celestial, mas em conflito, pois os cananeus ainda estão lá. Não temos ainda o descanso a que Deus nos chama. Estamos assentados nos lugares celestiais, em Cristo, mas temos que lutar com as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais. O santo é chamado a um lugar de descanso, mas ainda não recebe nada.

 

Adoração 

“E apareceu o SENHOR a Abrão” (Gn 12:7). Ele agora aparece para ele na terra. Não é o chamado que nos coloca no lugar de adoração, mas assim que entramos na terra, então podemos adorar, porque nosso relacionamento com Deus é conhecido, estabelecido e apreciado. Antes é a caminhada da fé, mas isso não é adoração. Portanto, nós, como assentados nos lugares celestiais, podemos adorar, conhecendo nosso relacionamento como filhos. “Edificou ali um altar ao SENHOR, e invocou o nome do SENHOR” (Gn 12:8). Em Hebreus 11:8-10, temos três coisas em relação ao poder da fé em Abrão. Primeiro (v. 8): “Pela fé Abraão, sendo chamado, obedeceu, indo para um lugar que havia de receber por herança; e saiu, sem saber para onde ia”. Ele foi em dependência simples e presente, se apoiando na promessa de Deus. Havia a vida de fé. Segundo, quando estava na terra (v. 9): “Pela fé habitou na terra da promessa, como em terra alheia, morando em cabanas com Isaque e Jacó, herdeiros com ele da mesma promessa”. O aparecimento do Senhor para ele foi o fundamento de sua adoração, e lá ele construiu seu altar. O Senhor ainda explica Seus propósitos para com ele, e ele obtém conhecimento profético. Mas não foi isso que sustentou a alma de Abrão. Ele poderia dizer: “Agora eu sei como tudo será realizado. Está na minha descendência e não em mim mesmo. Eu sou um estrangeiro aqui”. Como então sua alma se sustentou enquanto ele era um estrangeiro? Terceiro (v. 10): “Porque esperava a cidade que tem fundamentos, da qual o artífice e construtor é Deus”. Assim, a alma de Abrão não foi meramente levada à adoração, mas ele foi sustentado por uma comunhão mais estreita com aquele Deus que o havia escolhido, na fé de que Ele mesmo construiria a cidade.

 

A glória de Deus 

Fiquei impressionado que, em Apocalipse 4, falando do trono do governo de Deus, existem povos, anjos, a assembleia e criaturas vivas – toda uma população apresentada ali – mas quando eu chego à cidade celestial (Ap 21), há um grande e alto muro, ruas, portas de pérolas, mas onde estão as pessoas? Ninguém está ali, porque as pessoas são perdidas de vista na ideia da glória de Deus e do Cordeiro, e não se pensa em mais nada (embora saibamos que é a Noiva do Cordeiro), pois Deus e o Cordeiro estão ali. Foi a procura por esta cidade que fez de Abrão um peregrino e um estrangeiro. O mundo não podia entendê-lo, e então poderia ser dito: “Agora que Abrão está na terra, o que ele conseguiu?” Nada, pois ele não podia lhes explicar como era, mas tinha visto pela fé a cidade em que Deus era o Construtor. Vemos, então, que Abrão é chamado e, tendo entrado pela fé nas condições do chamado, ele entra na terra prometida. Lá ele tem uma revelação presente do Senhor, que é o fundamento de sua adoração, mas ele não descansou, pois os cananeus estavam lá.

 

Se Deus me chamou, devo deixar o mundo como ele está e não pensar em consertá-lo. Você não pode manter um relacionamento com Cristo e com o mundo ao mesmo tempo. A adoração a Deus se baseia no conhecimento da posição celestial em que estamos, sendo chamados para fora do mundo para comunhão com Ele próprio. Não temos nada em comum com o mundo, mas podemos cantar sobre a redenção, como se estivéssemos já agora no céu. Meus relacionamentos com Deus não serão modificados quando eu chegar em casa; eles serão exatamente os mesmos como são agora. Ele nos colocou em Cristo, e podemos dizer, como em Deuteronômio 26:3: “Hoje declaro perante o SENHOR teu Deus que entrei na terra” – não diz: “entrarei”. Estamos lá e temos o entendimento de como Deus cumprirá Suas promessas – “em tua descendência”. Não o descanso terrenal no cumprimento da promessa ao homem, mas o descanso celestial onde Ele habita, onde a glória de Deus a ilumina, e o Cordeiro é a sua luz.

 

É bom que nossa alma tenha o relacionamento para o qual somos chamados distintamente diante de nossa mente, para que possamos saber como adorar e ser sustentados pela força que ela fornece. E se os fundamentos da Terra estão fora de curso, eu não pertenço a isso. Tendo a sentença de morte em mim, não terei medo da morte, mas teremos o conforto e o gozo do lugar ao qual pertencemos. A doçura de uma calma é mais conhecida quando a tempestade está acontecendo por fora. Que o Senhor nos dê a verdadeira revelação de Si mesmo.

 

Adaptado de J. N. Darby

As Experiências de Abraão 

 

As experiências do coração ocupam um grande lugar nos pensamentos dos Cristãos. É, no entanto, importante sempre julgá-las pela Palavra de Deus. Essas experiências são a expressão do estado interno do coração e de nossas relações com os outros, bem como dos sentimentos que nossa conduta, nessas mesmas relações, produz em nosso coração e em nossa consciência.

 

A vida de Abraão é um exemplo interessante em apoio a isso. É verdade que nem a lei nem a plenitude da graça haviam sido reveladas ainda. No entanto, como vemos em Hebreus 11, os princípios da vida de fé nas promessas de Deus eram em geral os mesmos para ele e para nós.

 

A caminhada de fé 

O próprio Abraão falhou na fé em algumas ocasiões, mas em geral sua vida foi uma caminhada de fé com Deus. Esta é a razão pela qual suas experiências são muito mais íntimas com Deus e mais simples do que as de Jacó. Com uma única exceção, Abraão sempre permaneceu na terra da promessa. Ele era de fato um estrangeiro e peregrino, porque os cananeus habitavam ali, mas ele estava em relacionamento com Deus e andava diante d’Ele.

 

A princípio, quando Deus o chamou, ele não havia respondido totalmente a esse chamado. É verdade que ele realmente deixou sua terra e sua parentela, mas não a casa de seu pai, e por isso não chegou a Canaã. É verdade que ele havia abandonado muitas coisas; ele havia partido de Ur na Caldéia, mas não chegou mais longe que Harã e descansou ali. Assim é com o coração que não aprendeu que pertence inteiramente a Deus. É somente em conformidade com o chamado de Deus que podemos entrar na posição da promessa.

 

Após a morte de seu pai Terá, Abraão começou sob o comando de Deus, e eles partiram para a terra de Canaã, e entraram nela. Aqui temos a posição do povo celestial. Colocados pela graça e poder de Deus em uma posição celestial, da qual Canaã é uma figura, eles habitam lá; eles têm tudo em promessa, mas nada ainda em possessão. O Senhor Se revelou a Abraão ao chamá-lo; Ele Se revela de novo para ele no lugar que ele agora conhecia e que iria possuir: “À tua descendência darei esta terra” (Gn 12:7). Tal é, em geral, nossa confiança em Deus, que possuiremos realmente no futuro aquilo que conhecemos agora como estrangeiros.

 

Uma tenda e um altar 

“E edificou ali um altar ao SENHOR, que lhe aparecera”. Ele serve a Deus e desfruta de comunhão com Ele. Daí ele segue para outro lugar e lá arma sua tenda; constrói um altar novamente ao Senhor e invoca o nome de Jeová (v. 8). Ele é um peregrino na terra da promessa, e essa é toda a sua história. Habitamos nos lugares celestiais, desfrutamos deles pela fé e temos comunhão com Deus, que nos levou para lá. A tenda e o altar de Abraão neste lugar dão um caráter a toda a sua história, e todas as experiências de fé consistem nisso.

 

Sua incredulidade o leva ao Egito (vs. 10‑21). Lá ele não tinha altar. Uma serva egípcia se torna depois a ocasião de sua queda e uma fonte de problemas para ele. Ela é, como aprendemos em Gálatas 4:24‑25, uma figura da lei, pois a lei e a carne estão sempre em relação uma com a outra. A graça de Deus traz Abraão de volta, mas ele não recupera um altar até que ele retorne ao local em que ele primeiro armou sua tenda e ao altar que ele havia construído antes; lá ele tem comunhão novamente com Deus (Gn 13:3-4).

 

Nada do mundo 

As promessas de Deus são a porção de Abraão. Ele permite que Ló tome o que bem entender: “Não está toda a terra diante de ti? Eia, pois, aparta-te de mim; e se escolheres a esquerda, irei para a direita; e se a direita escolheres, eu irei para a esquerda. E levantou Ló os seus olhos, e viu toda a campina do Jordão, que era toda bem regada, antes do SENHOR ter destruído Sodoma e Gomorra, e era como o jardim do SENHOR, como a terra do Egito, quando se entra em Zoar. Então Ló escolheu para si toda a campina do Jordão, e partiu Ló para o oriente, e apartaram-se um do outro” (Gn 13:9-11). Ló é a figura de um crente mundano. Ele toma o que, no momento, parece ser a melhor parte, e escolhe o lugar sobre o qual o julgamento de Deus está pairando. Abraão desistiu de tudo segundo a carne, e Deus mostra a ele toda a extensão da promessa. Ele lhe dá uma prova visível daquilo que Ele lhe deu e a confirma para sempre (vs. 14-18). Ló, o crente mundano, é vencido pelos príncipes do mundo. Abraão o liberta. Com os servos de sua casa, ele vence o poder do inimigo (Gn 14:1‑21). Ele não receberá nada do mundo. Ele diz ao rei de Sodoma: “Levantei minha mão ao SENHOR, o Deus Altíssimo, o Possuidor dos céus e da Terra, jurando que desde um fio até à correia de um sapato, não tomarei coisa alguma de tudo o que é teu; para que não digas: Eu enriqueci a Abrão” (Gn 14:22-23).

 

Depois, Deus Se revela a Si mesmo a Abraão como seu escudo e grande recompensa. Ele promete a ele uma posteridade no momento em que seu corpo estava amortecido; justificado pela fé, ele recebe a confirmação das promessas de Deus, que Se liga por um sacrifício, figura do sacrifício de Cristo. Então a herança é mostrada a ele em seus detalhes (Gn 15).

 

A Lei e a Promessa 

Seguindo os conselhos da carne, Abraão deseja por um momento o cumprimento da promessa pela lei, ou seja, por Hagar. Mas, assim, ele apenas aprende que é impossível que o filho da lei herde com o filho da promessa. Então Deus Se revela de novo como Deus Todo-Poderoso. Ele diz que ele será o pai de muitas nações e que Deus será o seu Deus para sempre (Gn 17:1-14). A posteridade de acordo com a promessa é prometida novamente (Gn 17:15-19).

 

Depois disso, Deus mais uma vez visita Abraão e faz promessas positivas a respeito do nascimento do seu filho (Gn 18:9-15). Ele o considera como Seu amigo, dizendo: “Ocultarei Eu a Abraão o que faço?” (Gn 18:17). Ele comunica a ele Seus pensamentos sobre o mundo, e Abraão conversa com Ele livremente e em perfeita paz. Ele intercede por aqueles que se esqueceram do Senhor (Gn 18:23‑33). Era necessário que Abraão experimentasse novamente, no caso de Ismael, que a lei produz tristeza e angústia, e na corte de Abimeleque ele aprendeu que quando a incredulidade está em ação, ela produz apenas problemas e tristeza. Mas Deus, em Sua fidelidade, cuida dele assim como da mãe da posteridade.

 

Depois, Abraão foi provado no mais alto grau, até que ele teve que renunciar tudo segundo a carne e até mesmo as promessas. Mas as promessas em um Cristo ressuscitado em figura são confirmadas ao próprio Cristo e, n’Ele, a toda a posteridade espiritual de Abraão (cap. 22:15-19); compare Gálatas 3:16-18.

 

Peregrinação e adoração 

Abraão então aprendeu por uma queda que nem a lei nem a promessa são de alguma utilidade para a carne; no entanto, em geral, suas experiências peculiares consistiam em peregrinação e adoração, o tempo todo em que ele continuou na terra prometida. Observamos agora que sua vida é caracterizada por uma tenda e um altar. Toda a experiência, toda a vida do fiel Abraão, consiste quase inteiramente de adoração, intercessão e revelações de Deus, de modo que ele aprendeu a compreendê-las com crescente clareza e precisão. Ele passou seu tempo no lugar para o qual Deus o havia chamado. As revelações de Deus eram para ele ricas, doces e admiráveis. Seu conhecimento de Deus era íntimo e profundo, suas experiências pessoais felizes e simples, pois ele caminhava com Deus que Se revelou a ele em graça.

 

Selecionado de J. N. Darby

Recusando e Escolhendo 

 

Ninguém percorre o caminho da fé sem ser provado. A prova é permitida para revelar, por um lado, a nossa fraqueza e, por outro, a graça e fidelidade de Deus. Na história de Abraão, a prova veio sob a forma de fome. Sob a pressão de sua necessidade, ele seguiu os ditames do mero senso comum e, por um tempo, “desceu ao Egito”. Em vez de contar com Deus para sustentá-lo, ele desce ao mundo em busca de ajuda. Tendo dado esse passo em falso, ele descobre que, embora suas necessidades imediatas sejam atendidas, ele teme que ele seja morto para satisfazer os desejos do Egito. Entregue aos seus próprios recursos, ele afunda abaixo do nível do mundo e age com mentira. Abraão até adquire riquezas, mas a que custo! No Egito, ele não pode armar uma tenda e nem levantar um altar, nem invocar o nome do Senhor. No entanto, apesar de todo fracasso, Deus é fiel aos Seus e agiu em favor de Seu servo fracassado. Como resultado, quando o engano é descoberto, Abraão é dispensado pelo mundo, pois Faraó diz: “agora, pois, eis aqui tua mulher; toma-a e vai-te”.

 

Recuperação de falha 

Abraão foi expulso do Egito. Para o mundo, não importa para onde ele vá. Abraão, no entanto, era um verdadeiro homem de fé, embora, como nós, ele às vezes fracassasse no caminho da fé. Tendo provado a bem-aventurança do lugar externo, nada satisfará sua alma a não ser voltar ao lugar de bênção do qual seus pés se afastaram. Assim, lemos: “Subiu, pois, Abrão do Egito para o lado do sul e fez as suas jornadas do sul até Betel, até ao lugar onde a princípio estivera sua tenda até ao lugar do altar” (Gn 13:2‑4). Como toda alma verdadeiramente restaurada, ele refaz seu caminho passo a passo até que, mais uma vez, ele é encontrado em seu caráter estrangeiro e peregrino com sua tenda, como um adorador em seu altar e como um homem dependente que invoca o nome do Senhor.

 

Resultado da falha 

A restauração de Abraão está completa, mas o efeito de seu fracasso sobre Ló imediatamente vem à luz. Em Ló, vemos o homem natural que pode fazer uma bela profissão, mas não pode seguir o caminho da fé que o leva para fora do mundo. Em Abraão, vimos o homem de fé que, agindo de acordo com a Palavra do Senhor, toma o lugar externo, embora às vezes ele possa falhar nesse caminho. Em Ló, vemos um verdadeiro crente que toma o lugar externo, não na fé em Deus, mas sob a influência do homem. Já lemos que, quando Abraão partiu de Harã, “foi Ló com ele” (Gn 12:4). Novamente, quando Abraão subiu do Egito, lemos: “e com ele Ló” (Gn 13:1). Agora, pela terceira vez (Gn 13:5), Ló é descrito como o homem “que ia com Abrão”.

 

Ló representa uma grande classe de pessoas que assume uma posição correta fora do mundo, mas o fazem sob a influência de um amigo ou parente, e não do exercício pessoal e fé em Deus. Desde o início de seu caminho, Ló foi caracterizado por andar na luz de outro. Quando a provação vem, os crentes que andam na luz de outra pessoa fracassam e abandonam um caminho sobre o qual nunca tiveram nenhum exercício pessoal e para o qual não têm fé pessoal.

 

O laço das riquezas 

Com que frequência, também, o teste de hoje assume a forma que teve na história de Abraão e Ló. Enquanto lemos, “houve contenda”. Aprendemos ainda que a causa imediata da contenda eram suas possessões. Fazemos bem em notar a afirmação repetida duas vezes de que eles não foram capazes de conviver juntos e a causa profundamente significativa da divisão “porque os seus bens eram muitos”. Com que frequência, desde então, os crentes são divididos pelo ciúme dos dons espirituais ou riquezas temporais uns dos outros. O abuso de dons espirituais era uma fonte de divisão na assembleia em Corinto. A pobreza poderia tê-los levado a se apegar uns aos outros; suas riquezas se tornaram causa de divisão.

 

No caso de Abraão e Ló, suas riquezas temporais se tornaram ocasião de divisão. Quando Abraão iniciou o caminho da fé, Ló foi com ele, e eles tomaram “todos os bens”, mas isso não causou conflitos (Gn 12:5). No Egito, porém, Abraão adquire grande riqueza, de modo que, após sua restauração, lemos que ele era “muito rico em gado, em prata e em ouro”. A riqueza que ele adquire ao se afastar do caminho da fé se torna causa de conflito e divisão entre irmãos. Contendendo um com o outro, esses irmãos deixam de ser testemunha de Deus diante dos cananeus e ferezeus que habitavam na terra.

 

A posição de fé 

No entanto, Abraão é um homem restaurado em uma posição verdadeira, com um motivo correto, enquanto Ló, embora em uma posição correta, é apenas um seguidor de outros. Portanto, enquanto a contenda se torna a triste ocasião de revelar a mentalidade mundana de Ló, também traz à luz a mentalidade celestial de Abraão, que pode renunciar às coisas vistas. Abraão diz: “Ora, não haja contenda entre mim e ti, e entre os meus pastores e os teus pastores, porque somos irmãos”. O homem que está em uma posição para a qual não tem fé, no final, se tornará uma fonte de conflito entre irmãos e é melhor que ele se separe do homem cuja fé ele não pode seguir.

 

Abraão, com a pátria celestial diante dele, pode se dar ao luxo de renunciar ao mundo presente com sua perspectiva de tranquilidade e abundância. Ló pode escolher, e se ele tomar o melhor de acordo com a natureza e a vista, Abraão se contentará em seguir o caminho que Deus escolher para ele, sabendo que ele terminará na terra da promessa com toda a sua bênção.

 

A escolha da carne 

Sem buscar a direção de Deus, Ló escolhe seu caminho de acordo com a vista. Era uma visão sedutora e tinha promessa de tranquilidade e abundância presentes. Em todos os lugares havia água para seus rebanhos, sem o trabalho de cavar poços. A planície era tão frutífera que era “como o jardim do Senhor”. Mais importante de tudo, era “como a terra do Egito”. Tendo seguido Abraão ao Egito, Ló adquiriu um gosto pelos prazeres do Egito e fortaleceu seu desejo de tranquilidade e abundância.

 

Então Ló escolhe toda a planície do Jordão e desiste do caminho separado. Não havia nada grosseiro ou errado na escolha de uma planície bem regada, mas isso prova que o coração não está colocado na terra invisível da promessa de Deus. Além disso, o verdadeiro perigo das planícies bem regadas é que Satanás havia erguido Sodoma no meio delas.

 

Abraão permanece na terra de Canaã, e Ló habita nas cidades da planície. Tendo abandonado o caminho da fé, seu caminho é sempre baixo, pois lemos a seguir que ele “armou as suas tendas até Sodoma”. Aprendemos que para Ló não há recuperação. Mais e mais baixo ele afunda, até que finalmente passa da cena sob uma nuvem de vergonha e desonra.

 

A confissão de fé 

Abraão, libertado do peso de seu sobrinho de espírito mundano, recebe novas comunicações do Senhor. Ló se deixou guiar pela vista de seus olhos, afastado da direção do Senhor. Agora Abraão usa seus olhos, mas sob a direção do Senhor, pois, quando Ló foi separado dele, o Senhor disse: “Levanta agora os teus olhos, e olha desde o lugar onde estás” (Gn 13:14). Ele deve olhar em todas as direções a terra que o Senhor lhe deu. É bom para nós também nos concentrarmos nas coisas de cima e procurarmos aproveitar todas as partes da revelação que Deus nos deu do mundo vindouro – a pátria celestial com sua cidade que tem fundamentos.

 

Nesse sentido, ainda podemos responder à orientação do Senhor a Abraão quando Ele disse: “Levanta-te, percorre essa terra, no seu comprimento e na sua largura; porque a ti a darei” (Gn 13:17). Libertado de meros seguidores, se elevando acima de todos os conflitos insignificantes e permitindo que o Senhor escolha seu caminho, Abraão desfruta de uma rica revelação do mundo vindouro, pelo qual, com paciência, ele espera.

 

H. Smith (adaptado)

A Provação da Fé de Abraão – Gênesis 22

 

As circunstâncias pelas quais Abraão passou nos capítulos 20‑21 foram realmente mais importantes. Um mal que há muito estava abrigado em seu coração havia sido colocado de lado; a escrava e seu filho, que há tanto tempo mantinham posse tranquila de sua casa, foram expulsos, e ele agora se apresenta como “vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra”.

 

“E aconteceu depois destas coisas, que provou Deus a Abraão” (Gn 22:1). Aqui Abraão é, imediatamente, introduzido em um lugar de verdadeira dignidade e honra. Quando Deus prova um indivíduo, é uma certa evidência de Sua confiança nele. Nunca lemos que “Deus provou Ló” – não, os bens de Sodoma forneceram uma provação suficientemente forte para Ló, mas não com Abraão. Ele viveu mais na presença de Deus e, portanto, era menos suscetível à influência daquilo que havia enlaçado seu sobrinho.

 

O teste 

Agora, o teste ao qual Deus submete Abraão – a fornalha na qual Ele o prova – marca imediatamente um metal puro e genuíno. Se a fé de Abraão não tivesse sido do mais alto caráter, ele certamente teria estremecido sob a ardente prova pela qual o contemplamos passando neste belo capítulo. Quando Deus prometeu a Abraão um filho, ele creu na promessa e “isso lhe foi imputado (contado) como justiça”. “E não duvidou da promessa de Deus por incredulidade, mas foi fortificado na fé, dando glória a Deus”. Mas então, tendo recebido esse filho, tendo percebido a verdade da promessa, não havia o perigo de ele descansar na dádiva em vez de descansar no Doador? Não havia o perigo de ele confiar em Isaque, pensando na futura descendência e herança futura, em vez de no próprio Deus que lhe havia prometido a descendência? Certamente havia, e Deus sabia disso. Ele, portanto, prova Seu servo de uma maneira, mais do que qualquer outra, calculada para prová-lo quanto ao objeto no qual sua alma estava descansando.

 

A grande questão dirigida ao coração de Abraão, nessa transação maravilhosa, foi: “Você ainda está andando diante do Deus Todo-Poderoso, o vivificador dos mortos?” Deus queria saber se ele poderia reconhecê-Lo como Aquele que era tão capaz de suscitar filhos das cinzas de seu filho sacrificado, quanto do ventre amortecido de Sara. Em outras palavras, Deus queria provar que a fé de Abraão se estendia, como alguém observou, até a ressurreição, porque se ela parasse aquém disso, ele nunca teria respondido ao surpreendente comando: “Toma agora o teu filho, o teu único filho, Isaque, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá, e oferece-o ali em holocausto sobre uma das montanhas, que Eu te direi” (Gn 22:2). Mas Abraão “não duvidou”. Ele imediatamente responde ao chamado. Deus pediu Isaque, e Isaque deve ser dado, e isso também sem um suspiro de murmuração. Ele poderia desistir de qualquer coisa ou de tudo, contanto que seus olhos permanecessem fixos no “Deus Todo-Poderoso”.

 

Adoração 

Observe o ponto de vista em que Abraão coloca essa jornada até o Monte Moriá: “Eu e o moço iremos até ali; e, havendo adorado, tornaremos a vós”. Sim, era um ato de adoração, pois ele estava prestes a deitar sobre o altar do Vivificador dos mortos, aquele em quem todas as promessas de Deus estavam centradas. Foi um ato de adoração – a adoração mais elevada, pois ele estava prestes a provar que nenhum outro objeto encheu sua alma, a não ser o Deus Todo-Poderoso. Portanto, que calma! Que domínio próprio! Que pura devoção! Que elevação de mente! Que renúncia própria! Ele nunca vacila por toda a cena. Ele sela o jumento, prepara a lenha e vai para o Monte Moriá, sem dar expressão a um pensamento ansioso, embora, até onde os olhos humanos pudessem ver, estivesse prestes a perder o objeto da mais terna afeição de seu coração – aquele de quem, por toda a aparência exterior, dependiam os interesses futuros de sua casa.

 

O Bem-Amado 

Abraão, no entanto, mostrou plenamente que seu coração havia encontrado um objeto mais próximo e mais precioso do que Isaque, por mais querido que ele fosse. Ele mostrou também que sua fé estava repousando sobre um Outro objeto completamente distinto, com respeito aos interesses futuros de sua descendência e que, após o nascimento de Isaque, ele estava tão simplesmente repousando na promessa do Deus Todo-Poderoso como antes. Contemple, pois, este homem de fé subindo o monte, levando consigo o seu “bem-amado”! Que cena de fascinante interesse!

 

Parece-me que temos, na jornada de Abraão ao monte Moriá, uma figura notável da cena que depois seria manifestada no Calvário, quando Deus realmente estava provendo para Si mesmo um Cordeiro. Podemos ver o Pai e o Filho que, em companhia, sobem ao monte e realizam a graciosa obra da redenção na solitude ininterrupta daquele lugar.

 

Ressurreição 

Quão intensamente devem as hostes angélicas ter assistido esse ilustre pai, etapa por etapa de sua maravilhosa jornada, até que finalmente viram sua mão estendida tomando o cutelo para matar seu filho – aquele filho pelo qual ele havia por tanto tempo e ardentemente desejado, e no qual havia confiado tão firmemente em Deus. E então, novamente, que oportunidade para Satanás usar seus dardos inflamados! Que espaço abundante para sugestões como: “O que será das promessas de Deus quanto à descendência e à herança, se você sacrificar seu único filho? Cuidado para que você não seja desviado por alguma falsa revelação”. Ou: “Se é verdade que Deus disse isso e aquilo, acaso Deus não sabe que, no dia em que você sacrificar seu filho, todas as suas esperanças serão destruídas? Além disso, pense em Sara; o que ela fará se ela perder Isaque, depois de ter induzido você a expulsar Ismael de sua casa?” Todas essas sugestões, e muitas outras, o inimigo poderia lançar ao coração de Abraão. Tampouco o próprio Abraão estaria isento desses pensamentos e raciocínios que, num momento como esse, provavelmente surgiriam dentro dele. Qual foi então sua resposta a todas essas sugestões sombrias? Ressurreição! “Pela fé ofereceu Abraão a Isaque, quando foi provado; sim, aquele que recebera as promessas ofereceu o seu unigênito. Sendo-lhe dito: Em Isaque será chamada a tua descendência, considerou que Deus era poderoso para até dentre os mortos o ressuscitar; E daí também em figura ele o recobrou” (Hb 11:17-19).

 

A ressurreição é o poderoso remédio de Deus para todos os danos e ruínas introduzidas por Satanás. Quando chegamos a esse ponto, terminamos com o poder de Satanás, cujo último exercício é visto na morte. Satanás não pode tocar na vida que foi recebida em ressurreição, pois o último exercício de seu poder é visto na sepultura de Cristo; além disso, ele não pode fazer nada. Daí a segurança do lugar da Igreja: Sua “vida está escondida com Cristo em Deus” (Cl 3:3). Bendito esconderijo! Que nos regozijemos mais e mais a cada dia.

 

C. H. Mackintosh

Vitórias de Abraão

 

A batalha dos reis está registrada em Gênesis 14. Enquanto essa era uma mera disputa entre eles, Abraão não tem nada a dizer sobre isso. Deixe os cacos de barro lutarem com os cacos de barro. Mas assim que Abraão ouve que seu parente Ló está envolvido nessa luta, ele se levanta.

 

Tudo, como lemos, é maravilhoso a seu tempo. Há um tempo para construir e um tempo para derrubar. Houve um tempo para Abraão ficar quieto e um tempo para Abraão estar ativo; um tempo para ficar em silêncio e um tempo para quebrar o silêncio. E ele entendeu o tempo. Como os homens de Issacar posteriormente, ele conheceu o tempo e o que Israel deveria fazer. Os princípios de Deus eram as regras de Abraão. Ló foi feito prisioneiro, e a parte do parente passou a ser dever de Abraão. O campo de batalha no vale de Sidim será dele agora, assim como a tenda tinha sido sua até agora nas planícies de Manre. A mente de Deus tinha para ele outra lição além daquela que aprendeu enquanto os cacos de barro estavam sozinhos no conflito; e um tempo para quebrar o silêncio o chama à frente de seus servos treinados.

 

O tempo certo 

Excelente e bela, de fato, em um santo é essa inteligência da mente de Cristo, e belo é tudo em seu devido tempo. Fora de tempo, a mesma ação é contaminada e desfigurada. O material de uma ação não é suficiente para determinar o caráter de uma ação. É preciso que ela também seja oportuna. Elias, de sua elevação, pode invocar fogo do céu sobre os capitães e seus cinquenta; e assim, as duas testemunhas, no dia de Apocalipse 11. Mas não seria adequado para os companheiros do humilde e rejeitado Jesus agirem desta forma com os aldeões samaritanos (Lc 9). É apenas em seu tempo que tudo é realmente correto. Como foi o jardim do Getsêmani (tornado santo pelas aflições do Senhor Jesus) desfigurado pelo sangue que a espada de Pedro derramou ali! Que mancha naquele solo, embora o poder de Cristo estivesse presente para removê-la! Mas outra espada estava prestando um serviço correto quando ela despedaçou Agague. Pois quando a vingança for exigida, quando a trombeta do santuário soar um alarme de guerra, a vingança ou a guerra serão tão perfeitas quanto a graça e o sofrimento.

 

Mas há mais do que isso no nosso patriarca neste momento. Duas vitórias o distinguem – uma sobre os exércitos dos reis e outra sobre as ofertas do rei de Sodoma.

 

Abraão obteve a primeira delas, porque desferiu o golpe exatamente no tempo de Deus. Ele saiu para a batalha nem mais cedo nem mais tarde do que Deus o teria desejado. Ele esperou, por assim dizer, até ouvir “um estrondo de marcha pelas copas das amoreiras” (2 Sm 5:24). A vitória era, portanto, certa; pois a batalha era do Senhor, não dele. Seu braço foi apoiado pelo Senhor; e esta vitória de Abraão foi a de uma precedente funda com uma pedra, ou da queixada de um jumento, ou de Jônatas e seu escudeiro contra um exército filisteu; pois Abraão tinha apenas um bando de servos treinados contra os exércitos de quatro reis confederados.

 

A segunda, ainda mais brilhante que a primeira, foi alcançada em virtude da comunhão com as próprias fontes da força divina. O espírito do patriarca estava em vitória aqui, como o seu braço estivera antes. Ele havia se embriagado tanto com a comunicação do rei de Salém – havia se alimentado tanto do pão e do vinho daquele estrangeiro real e sacerdotal – que o rei de Sodoma organizou seu banquete em vão. A alma de Abraão estava no céu e ele não poderia retornar ao mundo.

 

J. G. Bellett (adaptado)

Os Filhos de Abraão

 

Ao considerar os filhos de Abraão, gostaríamos de olhar para Isaque e Ismael à luz de sua história e à luz do que eles representam. Sabemos, é claro, que Abraão teve outros filhos de Quetura, mas, como Isaque e Ismael são os mais proeminentes, refletiremos um pouco sobre eles.

 

Depois que Deus chamou Abrão de Ur dos Caldeus e fez promessas a ele, Abrão lembrou ao Senhor (Gênesis 15:3) que Ele não havia lhe dado nenhum herdeiro. Ele quase reclama que “um nascido na minha casa será o meu herdeiro” [isto é, um de seus servos] (Gn 15:3). A resposta de Deus foi que “aquele que de tuas entranhas sair, este será o teu herdeiro” (Gn 15:4). Embora demorasse algum tempo até que essa promessa fosse cumprida, ainda aqui estava a Palavra de Deus de que haveria um filho nascido por promessa. É triste dizer que o lapso de anos fez com que a fé de Abrão e Sarai fracassasse, e Abrão seguiu a sugestão de Sarai de que ele tomasse a serva egípcia Agar como esposa e tivesse um filho com ela. Como aconteceu com Abrão, assim pode ser em nossa própria vida; frequentemente descobrimos que falhamos exatamente naquilo que normalmente é nosso ponto forte. Moisés falhou em sua mansidão, Jó falhou em sua paciência, e descobrimos que Abrão, notado por toda a Palavra de Deus por sua fé, falhou exatamente nisso. É em nossos pontos fortes que devemos estar mais atentos, pois a confiança própria pode nos fazer deixar o caminho da dependência do Senhor.

 

Ismael 

O resultado dessa união foi o nascimento de Ismael, catorze anos antes do nascimento de Isaque. Seu caráter foi predito antes de ele nascer, pois o Senhor disse a Agar que ele seria um “homem feroz, e a sua mão será contra todos, e a mão de todos contra ele” (Gn 16:12). Mas chegou o momento em que o verdadeiro filho da promessa nasceu, e no banquete em que Isaque foi desmamado, Ismael é encontrado zombando. Sara pediu que ele e sua mãe fossem mandados embora, e quando o Senhor garantiu a Abraão que era a coisa certa a fazer, ele os mandou embora. Lemos que Ismael se tornou um arqueiro, morando no deserto. Ele acabou se casando com uma esposa do Egito e teve doze filhos. Também é registrado que Esaú se casou com uma filha de Ismael, bem como com suas outras esposas que eram hititas.

 

Ismael e seus descendentes (provavelmente os árabes beduínos) têm sido um espinho no lado de Israel ao longo dos tempos, e seu caráter responde às profecias a respeito dele. Eles eram evidentemente aliados dos midianitas na opressão a Israel durante o tempo de Gideão, e com o passar do tempo, as várias tribos que descenderam de seus doze filhos foram provavelmente assimiladas gradualmente em outros grupos étnicos. Mas Deus sabe onde eles estão, e eles são mencionados no Salmo 83 como aliados de outras nações que se aconselham contra Israel, dizendo: “Vinde, e desarraiguemo-los para que não sejam nação” (Sl 83:4). É sabido que esse sentimento é predominante entre muitos árabes hoje em dia e não se restringe aos descendentes de Ismael.

 

Os descendentes de Ismael 

Há várias coisas a serem notadas em tudo isso. Antes de tudo, devemos deixar claro que nem todos os árabes são descendentes de Ismael. Os sírios e os do Iraque, por exemplo, não são descendentes de Ismael. Além disso, a falta de bons registros há muito tempo, combinada com a mistura de várias tribos e povos ao longo dos séculos, obscureceu algumas das distinções entre vários grupos árabes. No entanto, muitos dos chamados árabes no Oriente Médio afirmam ser descendentes de Ismael. Mais importante, afirma-se que Maomé era um ismaelita, embora isso seja altamente questionável. Não apenas é reivindicado que ele descendeu de Abraão por meio de Ismael, mas também é reivindicada preeminência para a família de Ismael, na medida em que ele era o primogênito de Abraão. Alega-se que Ismael era o filho da promessa, não Isaque, e que os Judeus corromperam as Escrituras para fazer parecer que fosse Isaque. Alega-se que ele, e não Isaque, foi oferecido no altar no monte Moriá. Foi feito um apelo a Deuteronômio 21:15‑17, onde a lei afirma que um filho primogênito deve sempre receber a dupla porção da herança, mesmo que ele fosse filho da esposa odiada. Assim, uma escritura é usada para desacreditar outra.

 

Por um lado, vemos o caos e os problemas que a falta de fé causou e que as decisões tomadas há milhares de anos afetam o mundo ainda hoje. É uma lição solene para nós, pois, embora nossas decisões possam não afetar o mundo por séculos, elas geralmente têm efeitos de longo alcance. Vamos ordenar nossa vida na fé e no temor de Deus. No entanto, Deus decretou firmemente que “em Isaque será chamada a tua descendência” (Gn 21:12), pois ele era o filho da promessa. Quem se opuser a isso estará lutando contra Deus. Deus pode permitir que o rei do norte domine a terra de Israel em um dia vindouro, mas resta que qualquer confederação que pretenda que não “haja mais memória do nome de Israel” (Sl 83:4) está condenada a julgamento. “Confundam-se e assombrem-se perpetuamente; envergonhem-se, e pereçam. Para que saibam que tu, a quem só pertence o nome de SENHOR, és o Altíssimo sobre toda a Terra” (Sl 83:17-18). O Islã afirma acreditar e respeitar os primeiros livros do Velho Testamento, mas, em nome da promoção da predominância para Ismael e, finalmente, para o Islã, o Alcorão contradiz grande parte da Palavra de Deus. Mais seriamente, o Senhor Jesus Cristo é relegado apenas para ser um grande profeta e não é reconhecido como o eterno Filho de Deus. Todos os que se opõem aos propósitos de Deus a respeito de Seu Filho irão à ruína.

 

O filho da promessa 

Qualquer dúvida sobre o fato de Isaque ser filho da promessa é posta de lado no Novo Testamento, onde Paulo usa Isaque e Ismael como uma figura da nova e da velha aliança, respectivamente. Ismael, nascido de uma “serva” e “nascido segundo a carne”, tipifica a velha aliança sob a lei. Essa aliança, concedida no Monte Sinai, colocou Israel sob uma lei que eles não podiam cumprir e, portanto, gera filhos da servidão. Isaque nasceu de Sara, uma “mulher livre” e foi “por promessa”. Ele tipifica a nova aliança sob Cristo, onde as bênçãos são pela graça e não dependem do homem. Como crentes hoje, estamos sob a bênção da nova aliança, embora a Igreja não esteja em um relacionamento de aliança com Deus. Assim, a instrução para nós é: “Lança fora a escrava e seu filho”, pois “somos filhos, não da escrava, mas da livre” (Gl 4:30-31). O crente não está sob a lei, mas sob a graça.

 

No entanto, há algo mais a ser observado nessa alegoria. Assim como os descendentes incrédulos de Ismael virão sob o julgamento de Deus por seu ódio implacável contra Israel, Deus certamente também julgará o Israel incrédulo. Os Judeus que continuam na incredulidade hoje se orgulham de sua descendência de Abraão, como filhos da promessa, assim como fizeram os fariseus durante o tempo em que nosso Senhor estava na Terra. No entanto, ao ocupar seu lugar sob a velha aliança, eles são espiritualmente semelhantes a Ismael, embora sem dúvida ficassem horrorizados com a comparação. “Jerusalém que agora existe, pois é escrava com seus filhos” (Gl 4:25). Tendo rejeitado o seu Messias, os Judeus incrédulos permanecem sob a maldição de uma lei violada e não escaparão do justo juízo de Deus simplesmente porque são filhos da promessa. Antes, eles experimentarão o mais terrível julgamento do Senhor na grande tribulação, pois são mais responsáveis do que outros.

 

Mas então, depois de terem passado por essa terrível provação, durante a qual Deus preservará alguns deles, Ele os trará de volta à bênção em sua terra. Desta vez, porém, será no terreno da graça e da obra de Cristo, pois eles não serão capazes de reivindicar nenhuma bênção com base em seu próprio mérito. Naquele dia, todos serão obrigados a reconhecê-los como povo de Deus, pois “todos quantos os virem os conhecerão, como descendência bendita do SENHOR” (Is 61:9).

 

W. J. Prost


 “Levanta, agora, os teus olhos e olha desde o lugar onde estás”

Gênesis 13:14


 


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