top of page

Breves Meditações - Parte 8/14

ree

Baixe esta parte do livro digital nos formatos:

ÍNDICE



Breve Meditações

Parte 8

J. G. Bellett

A Grande Ordenação de Deus

 

Podemos ter observado no Evangelho de João a maneira zelosa e determinada com que o Senhor Jesus rejeita todas as glórias que os homens poderiam Lhe atribuir, a fim de estabelecer a graça de Deus ou o amor do Pai n’Ele e por Ele, para com pobres pecadores. Ele resplandece ali na glória da graça e não resplandecerá em nenhuma outra glória. Os homens podem querer tê-Lo como Mestre de Segredos, Operador de Maravilhas, Rei, Juiz ou Alguém apto a ser grande no mundo; mas Ele rejeita tudo com notória e indignada seriedade, e será conhecido e recebido apenas como Ministro da graça divina, a graça de Seu Pai, para com pobres pecadores.

 

Da mesma forma, podemos ver quão zelosamente Deus põe de lado todos aqueles que querem estar na companhia de Cristo, para compartilhar Seu lugar com Ele, ou ousar deslocá-Lo; e abre espaço para Ele, e somente para Ele, como Sua única grande ordenação.

 

A Epístola aos Hebreus é a testemunha principal e final disso; mas houve promessas impressionantes e belas do mesmo princípio em dias anteriores.

 

E aqui deixe-me dizer que há uma doce correspondência entre essas duas coisas. Cristo é zeloso em ocultar-Se a Si mesmo, para que somente a graça do Pai se manifeste n’Ele, durante o Seu ministério; e Deus, em todo o tempo, tanto antes como depois desse ministério, monstra o quão zeloso é, seja por Sua mão ou por Seu Espírito, por Seus atos providenciais ou por Suas comunicações inspiradas, em fazer com que Cristo, e somente Cristo, seja honrado como Sua ordenação. Gostaria de mencionar algumas promessas e testemunhos disso.

 

Nadabe e Abiú, com infiel audácia, desprezaram o fogo que havia descido do céu, selando os serviços de Arão, que era uma figura de Cristo; e a mão de Deus julgou isso de forma definitiva e terrível, matando-os ali mesmo. O fogo penal vingou o fogo estranho que havia substituído o fogo que prestava testemunho a Cristo. Isso era repleto de significado.

 

Moisés e Arão se expuseram a um julgamento semelhante – semelhante, quero dizer, em caráter, embora não em medida. Não foi por infiel ousadia, mas sob a provocação e irritação do povo, que eles desonraram o Cristo de Deus, junto às águas de Meribá. Mas assim o fizeram. Não santificaram a Deus em Sua ordenação. Não reconheceram a Rocha que seguia Israel, e essa Rocha era Cristo; e são imediatamente julgados como indignos de entrar na terra.

 

Isso representava uma pronta indignação da parte de Deus em relação a tudo o que tocava nos direitos e honras de Cristo. Havia uma grande distância moral entre a infidelidade de Nadabe e Abiú e a precipitação e imprudência de Moisés e Arão; mas a mão de Deus vingou a causa de Seu Cristo contra todos eles.

 

Quando chegamos aos dias do Novo Testamento, encontramos o mesmo espírito no monte santo. Em ignorância, sem saber o que dizia, Pedro propôs dar o mesmo lugar a Moisés, Elias e Jesus. Mas a voz da magnífica glória não se calaria então. É apenas ignorância, se assim quisermos: mas o Deus bendito não permitirá que a honra de Cristo sofra nas mãos de alguém ou de algo. Pode ser apenas ignorância que toque Sua Pessoa ou Seu lugar, e nem seja desprezo nem temperamento – nem ousadia infiel como no caso de Nadabe, nem irritação mental como no caso de Moisés; mas ainda assim a mão ou a voz de Deus estarão presentes para vingá-la. A voz faz saber a Pedro que somente o “Filho amado” deve ser ouvido.

 

Em João Batista, o Espírito, de outra forma, realiza a mesma obra, defendendo a causa de Cristo. Os discípulos de João ficaram um pouco comovidos com a multidão que parecia passar por seu Mestre; e se ressentem disso, como Josué se ressentiu na causa de seu Mestre, quando Eldade e Medade começaram a profetizar. Mas João, com toda a gentileza, porém com toda a decisão, responde a isso. Como em nome de todos os seus irmãos, os profetas, ele se retira, para que somente Jesus seja visto e ouvido. Ele é Elias falando na linguagem da magnífica glória no monte santo. A voz ali chamou Moisés e os profetas para longe dos olhos e ouvidos de Pedro; a palavra de João aqui se afasta, e a todos os seus conservos, os amigos do Noivo, de seus discípulos e de todos os outros, para que somente o mesmo “Filho amado” seja conhecido. João e a magnífica glória têm pensamentos semelhantes sobre Jesus.

 

Tudo isso é consistente, bendito e precioso, ver a mão de Deus e o Espírito de Deus concordando em glorificar Jesus.

 

As epístolas se unem a esse serviço; ou melhor, como posso dizer, o Espírito Santo nelas. Não é preciso particularizar ou provar isso. Cada epístola tem seu próprio testemunho a isso. A de Colossenses se distingue por tal caráter. Mas em Hebreus vemos esse propósito prevalecendo na mente do Espírito do começo ao fim. É um deixar de lado uma coisa após a outra, a fim de ter o Senhor Jesus, o Cristo de Deus, a grande ordenação de Deus, somente diante de nós.

 

E são colocados de lado com mão forte, como nos primeiros dias.

 

Os anjos são primeiro retirados de nossa vista; e Aquele que obteve um nome mais excelente do que eles é introduzido; e isso, com base na autoridade de Escritura após Escritura (cap. 1-2).

 

Moisés é então posto de lado, como servo na casa de outro, para deixar o lugar para Aquele que é Senhor de Sua própria casa (cap. 3).

 

Josué não deu descanso a Israel e, portanto, é como nada e ninguém; enquanto Jesus, o verdadeiro Josué, dá o próprio descanso de Deus (cap. 4).

 

Arão deve ceder ao Melquisedeque; pois seu sacerdócio, constituído pela lei de um mandamento carnal, é fraco e inútil, e deve dar lugar ao sacerdócio do Filho, que é estabelecido no poder de uma vida sem fim (cap. 5-7).

 

A antiga aliança deve desaparecer, e aquilo que Cristo ministra continua novo para sempre (cap. 8).

 

O santuário sob a lei não testemunhava a perfeição do adorador, mas sempre o mantinha afastado da presença divina. Ele deve ser destruído em favor daquele santuário o qual, por um véu rasgado, testemunha a perfeição do adorador (cap. 9).

 

A vítima sob a lei nunca alcançou a expiação; mas o único sacrifício de Cristo purificou a consciência para sempre (cap. 10).

 

Assim, a grande ordenação de Deus é estabelecida em Seu lugar, e ali se encontra sozinha – anjos, Moisés, Josué, Arão, a antiga aliança, o primeiro tabernáculo, o sacrifício legal, todos forçados a ceder e deixar todo o cenário, e tudo o que lhe pertence ou o preenche, somente com Ele. E Ele, trazido desta maneira, pelo Espírito de Deus, permanecerá diante de nossa alma para sempre. “Jesus Cristo é o mesmo, ontem, e hoje, e eternamente - Não vos deixeis levar em redor....

 

E o que o Espírito está fazendo em Seus vasos – o que o Espírito está fazendo em Seus mestres de acurado entendimento – a fé dos eleitos, forjada pelo mesmo Espírito, está fazendo o mesmo. Paulo dirá: “longe esteja de mim gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo”. E não é essa glória em Jesus, esse gloriar-se na cruz, a propriedade instintiva comum de toda mente renovada – a fé intrínseca e, portanto, o senso e o julgamento naturais de toda alma salva?

 

E que harmonias são estas! Harmonias, também, do céu e da Terra, de todos os tempos e dispensações, da glória excelente e dos pobres vasos de barro! A mão de Deus, a voz do Pai, o Espírito Santo em Seus ministros autorizados e de acurado entendimento, o Espírito em cada pecador vivificado e iluminado, todos se unindo para vingar os erros contra Cristo e honrar a grande ordenação de Deus.

 

Toda a Palavra de Deus proclama, do princípio ao fim, NADA além do sangue de Cristo para um pecador,. Toda a expiação que ele pode desfrutar, toda a reconciliação que ele pode pleitear, toda a resposta que ele pode ter às exigências do trono onde o julgamento se assenta para manter os direitos de Deus, depende disso.

 

É o sangue do Cordeiro de Deus que é apresentado por Deus à fé de um pecador, e é aquilo que a fé de um pecador apreende e confia.

 

Assim que o pecado entrou, o sacrifício que havia sido preparado no conselho eterno foi revelado. Já a primeira promessa anunciou a morte de Cristo, o ferimento no calcanhar da Semente da mulher. Esta foi a mensagem comunicada ao homem como pecador – a única coisa – o pecador confiou-se a ela: Adão saiu do seu esconderijo e confiou na virtude reconciliadora do sacrifício do Cordeiro de Deus.

 

Assim que chegou o tempo devido para a demonstração pública da redenção, novamente foi o sangue de Cristo que foi revelado, e somente ele. Israel, na terra da morte e do julgamento, precisava ser libertado. Eles haviam encontrado graça aos olhos do Deus de seus pais e precisavam se tornar um povo abrigado no lugar do julgamento e redimido para fora do lugar da morte. É esse sangue precioso, e somente ele, que é usado naquela grande ocasião. Ele deveria ser colocado do lado de fora, na verga das casas hebraicas na terra do Egito, e a família hebraica ali dentro deveria se alimentar daquela vítima cujo sangue os redimiria. Nada mais. De maneira adequada, eles deveriam se alimentar do cordeiro assado – não cru nem cozido em água, mas assado no fogo, em todas as suas partes. Este deveria ser o seu alimento. Num estilo do Velho Testamento, Cristo era como se lhes dissesse: “Tomai, comei: isto é o meu corpo”.

 

E de acordo com isso, é o que encontramos no Novo Testamento. Eu leio isso em Mateus 26, em Marcos 14, ou em Lucas 22. O Senhor está lá como na noite da Páscoa, ou em Êxodo 12. Ele era então um Cristo vivo, mas Se apresenta como um Cristo crucificado, um Cordeiro imolado, um sacrifício sobre o altar. Ele Se ignora como um Ser vivo e Se apreende como uma Vítima. Ele toma o pão em Sua mão e diz: “Tomai, comei; isto é o meu corpo”. Ele toma o cálice em Sua mão e diz: “Este cálice é o Novo Testamento no Meu sangue”. É o Cristo crucificado que o Cristo vivo apresenta ao pensamento e à aceitação dos pecadores, como o fundamento e o título de toda a nossa bênção.

 

Isso significava dar à família eleita o Cordeiro pascal, cujo sangue estava nas ombreiras das portas como seu abrigo e libertação. Eles deveriam tomá-Lo e comê-Lo – como na noite do Egito.

 

No Evangelho de João, não vemos a cena da ceia. Não temos um “Tomai, comei: isto é o meu corpo”, mas temos uma palavra entre o Senhor e os Judeus, na qual o grande segredo da ceia lhes é revelado por Ele. No sexto capítulo, Ele diz à multidão que Ele era o Pão que desceu do céu, o verdadeiro Maná, do qual, se um homem comer, viverá para sempre. Mas, continuando a conversa, Ele declara que este pão do céu era a Sua carne, que Ele daria pela vida do mundo, que a Sua carne era verdadeiramente comida e o Seu sangue verdadeiramente bebida. Ou seja, é ao recebê-Lo como o Cordeiro de Deus, ao ir a Ele como na morte e no altar, que o pecador obtém redenção e vida. Não por conhecê-Lo como um Cristo vivo, mas como um Cristo crucificado, é que obtemos a salvação de Deus.

 

Tudo isso é assim, com grande certeza e simplicidade. Desde o princípio, o sangue de Cristo, o sacrifício do Cordeiro de Deus, tem sido apresentado aos pecadores como o único objeto no qual devem fixar o olhar de fé e ao qual devem depositar sua plena e inteira confiança. O Cordeiro vivo não encontra lugar neste grande mistério da redenção – exceto no sentido de que Sua vida testemunhava a aptidão do Cordeiro para o altar – é o Cordeiro imolado, o Jesus crucificado, que é tudo no grande relato da redenção dos pecadores. O sangue do Deus-Homem, e aquele único, e somente ele, foi o resgate.

 

Não apenas as Escrituras patriarcais, mosaicas e evangélicas nos ensinam isso, como vimos agora – como Gênesis 3, Êxodo 12, a instituição da ceia e João 6 – mas também nas epístolas aprendemos o mesmo. Hebreus 10 é impressionantemente direcionado a esse propósito. Ali, ouve-se o Cristo de Deus dizer: “Eis aqui venho”. Mas com que fim Ele viria? Seria para viver? Não, mas para morrer. Por que um corpo Lhe foi preparado? Seria para atuar nele e passar trinta e três anos nele no serviço ativo de uma Testemunha e Ministro de Deus e do Pai? Não; mas para oferecê-lo na cruz (Hb 10:5-10). Certamente Ele viveu, e isso sob a lei, o verdadeiro Israelita. Certamente Ele viveu, e isso em um ministério tão santo e gracioso como Aquele que dava testemunho de Deus e do Pai. Mas essa Escritura (Hb 10:5-10) ignora a vida e imediatamente leva Aquele que veio ao mundo para a cruz – assim como Sua própria linguagem à mesa da ceia, como vimos, O ignorou como o Vivente, para apresentá-Lo como o Crucificado. E então, nessa mesma Escritura, aprendemos que é pela oferta do corpo, pelo sangue do Filho no corpo que foi preparado para Ele, que os pecadores são santificados e aperfeiçoados. Lemos isso novamente no capítulo 13 da mesma Epístola: “Jesus, para santificar o povo pelo Seu próprio sangue, padeceu fora da porta” – a santificação de um pecador dependendo inteiramente do sangue de Cristo[1].

[1] Admito plenamente a santificação em outro sentido, por assim dizer, a santificação de um santo – a purificação gradual de um eleito sob a verdade pelo Espírito (João 17:17). Mas falo aqui da santificação de um pecador.

 

Não digo mais do que isso, embora toda a Escritura e as epístolas distintamente forneçam muito mais. As ordenações figurativas da lei e o ensino doutrinário e direto dos apóstolos se unem todos para nos dizer que a morte ou o sangue do Cristo de Deus é tudo para um pecador.

 

E se Deus comunica assim a Sua mente, a fé a apreende e recebe. O capítulo 53 de Isaías é um testemunho disso. Ali, a fé do despertado Israel de Deus pode, de passagem, vislumbrar a Pessoa, a vida e o ministério de Cristo, mas é apenas de passagem – eles avançam para a cruz, e lá encontram tudo para o aperfeiçoamento de sua consciência como pecadores, e a fonte e o fundamento de todas as glórias do próprio Cristo. Na cruz, eles descobrem que o castigo da nossa paz estava ali, a ferida por nossas transgressões estava ali, e nossa cura por Suas pisaduras; e que, tendo feito de Sua alma esta oferta pelo pecado, Ele podia ver diante de Si a Sua família e a plena realização do bom prazer de Deus na vindicação e manifestação de Suas próprias glórias para sempre. “Verá a Sua posteridade, prolongará os Seus dias; e o bom prazer do SENHOR prosperará na Sua mão”.

 

Assim, o gozo da vida de fé em Paulo, o apóstolo dos gentios, encontra sua fonte na mesma morte do Senhor por ele (veja Gálatas 2:20-21). Assim, ele apresenta esse Objeto à fé dos pecadores como o único Objeto da fé que justifica (Romanos 4:23, 25). E, novamente, ele nos ensina que Cristo crucificado é oferecido individualmente à vista de um pecador para que ele seja abençoado como o crente Abraão (Gálatas 3:1, 14). “Levando Ele mesmo em Seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro”, diz outro apóstolo (1 Pedro 2:24). “O sangue de Jesus Cristo, Seu Filho, nos purifica de todo o pecado”, diz outro (1 João 1:7). Mas isso pode ser suficiente; embora todas as Escrituras, novamente dizemos, patriarcais, mosaicas, proféticas, evangélicas e apostólicas, todas se unam para colocar “o Cordeiro de Deus” e “o pecador” juntos para redenção e justificação – o Cordeiro provido nas riquezas da graça de Deus e aceito pela fé do pecador, por meio da obra, atração e ensino iluminador de Deus, o Espírito Santo.

 

E então, aquilo que é assim dado em graça, recebido pela fé e testificado por toda a Escritura, deve ser celebrado para sempre nos reinos de glória. Isso nos é dado no que posso chamar de única porção ou divisão restante da Escritura, o Apocalipse. Enquanto ainda estavam na Terra, os santos ali nos fizeram saber que encontraram seu Objeto de louvor e sua Fonte de gozo no Cordeiro que foi morto. Nós os ouvimos irromper, enquanto João se dirigia a eles ainda aqui, naquele tom fervoroso: “Àquele que nos ama, e em Seu sangue nos lavou dos nossos pecados, e nos fez reis e sacerdotes para Deus e Seu Pai, a Ele, glória e poder para todo o sempre. Amém” (Apocalipse 1:5-6). E depois de terem sido transladados, depois de terem deixado a Terra rumo ao céu e alcançado o lar de glória, nós os ouvimos novamente com igual regozijo. “E cantavam um novo cântico, dizendo: Digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o Teu sangue compraste para Deus homens de toda a tribo, e língua, e povo, e nação; E para o nosso Deus os fizeste reis e sacerdotes; e eles reinarão sobre a Terra” (Apocalipse 5:9-10). E os reinos de glória, bem como o lar de glória, as nações sob o escabelo milenar, bem como os glorificados nos céus, ecoam esse cântico – pois é o único pensamento amado e dominante que ocupará a eternidade e encherá a criação; pois ouvimos novamente esta voz semelhante: “Estes são os que vieram da grande tribulação, e lavaram as suas vestes e as branquearam no sangue do Cordeiro” (Apocalipse 7:14). Talvez eles não possam ser capazes de acrescentar uma palavra sobre o seu reinado, como puderam fazer os glorificados, eles podem ter apenas que saber que estarão diante do trono, e servirão a Deus dia e noite em Seu templo, que todas as suas lágrimas sejam enxugadas e eles sejam conduzidos pelo Senhor às fontes de águas vivas (vs. 15-17); mas “o sangue do Cordeiro” é o objeto comum de louvor, a fonte comum de alegria, o único título para toda a bem-aventurança, seja dos santos glorificados e transladados, seja das nações redimidas que ocupam a Terra em dias milenares de restauração e refrigério. Pecadores que agora seguem e lutam em corpos não redimidos, e em condições de peregrinação e militância, e pecadores que em breve, seja no lar de glória no céu ou nos reinos de glória na Terra, não conhecem nada além do Salvador, no sangue que Ele derramou por eles, na vida que Ele deu por eles, como o Cordeiro de Deus, na cruz do Calvário. Toda a glória está nisso, e somente nisso.

Intimidade Divina

 

A intimidade entre o Senhor e Seus eleitos está além, podemos dizer, do que se conhece em outros lugares. Os anjos fazem a Sua vontade, esperam em Sua presença, guardaram seu primeiro estado e se destacam naquela força que O serve. Mas eles não estão onde estão os pecadores eleitos. Eles aprendem, por meio da Igreja, a multiforme sabedoria de Deus – a nós, tudo o que o Filho recebeu do Pai, Ele nos tornou conhecido.

 

O Salvador se familiariza com os segredos do seio do pecador; enquanto comunica a tal pessoa os segredos do seio divino. Isso é intimidade de fato. Veja-a nas histórias de Abraão, Moisés, Davi e outros. É maravilhoso dizer isso – mas assim é. Não somos chamados a prová-lo – a Escritura o faz tanto por meio da doutrina quanto da ilustração. Somos chamados a crer e a desfrutar disso.

 

Vemos o Espírito de Deus, por meio do apóstolo, na Epístola aos Romanos, guiando os santos por dois caminhos diferentes: o caminho da graça, nos capítulos 1 a 8; e o caminho do conhecimento, nos capítulos 9 a 11.

 

Ele nos encontra, no princípio, em nossas ruínas. Somos tomados como pecadores, carentes de Sua glória, e estamos em revolta e distantes d’Ele. É desse ponto que iniciamos o caminho. Mas Ele nos conduz das nossas profundezas às Suas alturas, das nossas ruínas às Suas maravilhas e riquezas de misericórdia. E, finalmente, Ele nos planta em uma elevação onde podemos desafiar todos os nossos inimigos e nos encontrar acima de tudo o que possa estar contra nós. Quem pode estar contra nós? É a linguagem do coração ali; quem pode acusar, quem pode condenar, quem pode separar?

 

Tendo-nos assim conduzido por todo o caminho, ao longo do caminho da misericórdia, e resolvido nossas próprias questões para sempre, Ele novamente nos toma pela mão, para nos guiar por outro caminho, o caminho da sabedoria ou conhecimento, onde aprendemos, não nossos próprios interesses como pecadores, mas as diversas riquezas e segredos de Seus próprios conselhos, do princípio ao fim. Ele também não solta a mão do pecador salvo que está aqui conduzindo, até que o coloque em outra elevação e produza outro arrebatamento em seu espírito – não uma exultação em Sua própria bem-aventurança sob os dons da graça, como vemos no final do caminho anterior, mas um triunfo nos caminhos e propósitos de Deus por meio da luz destas comunicações divinas agora feitas a ele.

 

E não é tudo isso intimidade? Primeiro, trazer para casa um banido, preparar um pecador para Sua presença, e colocá-lo lá em liberdade, força e alegria, e então contar-lhe todos os Seus conselhos?

 

A mulher de Sicar recebeu o primeiro desses, mas não o segundo; pelo menos naquele momento. Muito apropriado. O Salvador lhe contou tudo sobre si mesma e então Se mostrou a ela de tal forma que seu espírito se encheu da exultação que encontramos no final do primeiro daqueles caminhos que temos traçado na Epístola aos Romanos; isto é o que lemos no final do capítulo 8. Mas ainda não havia chegado o momento de conduzi-la pelo segundo caminho. Muito apropriado, repito, tudo isso para ela.

 

Mas, se olharmos bem para trás, em Gên. 18; 19, ali veremos o caso de um pecador salvo, um santo de Deus, conduzido por cada um desses caminhos; ou, antes, alguém já se achando no fim de um deles, conduzido, como que a partir desse ponto, por todo o percurso do outro.

 

O Senhor vem a Abraão enquanto ele estava assentado à porta de sua tenda, perto de Hebrom. Como alguém que O conhecia bem, Abraão se levanta e O adora, e propõe preparar-Lhe algum alimento. Assim, a refeição é preparada e partilhada. Abraão desfruta, assim, da graça em que se encontrava. A presença de Deus é sua morada. Ele ilustra uma alma em Romanos 8:31-39. Mas, estando ali, ele está pronto para dar mais uma caminhada em companhia de seu divino Mestre. E assim o faz. Eles se levantam juntos de debaixo da árvore, onde o banquete foi compartilhado; e enquanto caminham juntos, o Senhor comunica Seus segredos a Abraão.

 

Pode a intimidade exceder isso? “Já vos não chamarei servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de Meu Pai vos tenho feito conhecer”[2]. Anjos, repito, não nos são apresentados dessa forma – nem Adão na inocência do jardim do Éden. Mas pecadores salvos ocupam esses lugares, sem usurpação. Eles tomam a pedra branca e leem ali um novo nome, que ninguém conhece, exceto aquele que o recebe.

[2] Graça maravilhosa! Deus Pai não nos quer servos, mas filhos; o Senhor Jesus não nos quer servos, mas amigos.

 

Veja o Evangelho de João e o Apocalipse de João como outras ilustrações dessas mesmas coisas. Aqui está um pecador após o outro, naquele Evangelho, conduzido ao longo do caminho de graça, como de suas próprias profundezas de ruínas, às próprias alturas de salvação e paz de Deus, para exultar ali no espírito que encerra Romanos 8. E no Apocalipse, como o próprio João (pecador salvo como era, estando no fim do caminho de graça) é conduzido por todo o caminho dos conselhos divinos e instruído nos segredos dos selos, das trombetas e das taças, até que seja deixado à vista da santa Jerusalém, como no arrebatamento que encerra Romanos 11!

 

Estes caminhos são realmente resplandecentes: o pecador, no final de um, exulta em sua própria condição, salvo com uma salvação segura e eterna; o santo, no final do outro, exulta nos conselhos de Deus, todos revelados a ele, para que possa andar na luz, como Deus está na luz. O que será feito aos eleitos, podemos dizer, a quem o Senhor Se deleita em honrar?

 

Agora, eu diria ainda que os Salmos 23 e 24 são declarações de uma alma, enquanto percorre estes dois caminhos que tenho observado. No Salmo 23, o santo está trilhando o caminho onde a graça o colocou. Ele conta, portanto, com tudo. Todas as coisas são suas; e ele certamente pode precisar de tudo. Ele sabe que está sob a condução e o cuidado de um Pastor que pode ministrar tudo a ele: edificação, refrigério, restauração, uma vara e um cajado para o vale da sombra da morte, uma mesa e um cálice transbordante, e óleo da unção para a própria presença dos inimigos; e um suprimento de bondade e misericórdia até que o caminho termine na casa do Senhor, até que o cuidado, a atenção e as provisões da graça terminem no lar da glória.

 

Assim, o pecador salvo contempla sua própria bem-aventurança, celebra-a no segredo de seu próprio espírito, como lhe é ensinado a conhecê-la em Romanos 1-8. Ele é visto neste Salmo no caminho que a Escritura lhe apresenta diante de si.

 

No Salmo 24, o santo está caminhando ao longo de uma linha de luz maravilhosa, na qual o Espírito de sabedoria e revelação o colocou.

 

Ele contempla, não suas próprias bênçãos e bem-aventuranças, como fizera no Salmo 23, mas os propósitos de Deus, os segredos dos conselhos divinos, as glórias de Cristo, Seus feitos, Seus julgamentos, Suas virtudes, Seus direitos, Seu destino. Ele ouve, em espírito, as boas-vindas que O aguardam depois de haver cumprido os julgamentos que teve que executar e mantido o caráter que teve que exibir, às próprias portas dos reinos da glória – os desafios que ali Lhe foram dirigidos por aqueles que se deleitavam em ouvir repetidamente a história de Seus feitos e Suas honras.

 

Assim, o pecador salvo contempla a sabedoria e o caminho de Deus; não a graça que o visitou, mas os conselhos que deram a Cristo o Seu lugar e as Suas glórias. Ele é visto aqui no mesmo caminho que Romanos 9-11 lhe apresentou diante de si.

 

J. G. Bellett



Comentários


bottom of page