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Os Evangelistas - Parte 15/22 (João 4-6)

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ÍNDICE


Os Evangelistas - Meditações Sobre os Quatro Evangelhos

J. G. Bellett

Parte 15

João 4


Assim, João se vai, e com ele tudo, exceto o ministério do Filho. Tudo agora está somente em Sua mão; e, consequentemente, Ele sai simplesmente como o Filho de Deus, o Salvador do mundo. Ele aparece diante de nós aqui (cap. 4:1) como Aquele que foi rejeitado por Israel, e agora está deixando a Judeia, o lugar da justiça, simplesmente como o Salvador dos pecadores. E, saindo neste caráter, Ele precisa passar por um lugar imundo, e descobrir que Sua jornada entre nós Lhe custará amarga dor e cansaço; a amostra da qual obtemos aqui.

 

Foi em justiça perfeitamente consistente que os Judeus recusaram todo relacionamento com os samaritanos. Era de acordo com seu chamado dizer: “É uma coisa ilícita para um homem que é Judeu manter companhia, ou vir a alguém de outra nação”; pois isso era um testemunho contra o mal; e tal testemunho era a própria confiança que Jeová havia confiado a Israel. Eles deveriam ser testemunhas de Deus contra o mundo; eles eram os limpos separados dos imundos, para um testemunho da justiça de Deus contra uma Terra corrompida. Mas Jesus estava afastado de Israel. Ele havia deixado a Judeia, o lugar da justiça, e estava na contaminada Samaria como Filho de Deus, o Salvador dos pecadores. Ele já tinha ido à Judeia em busca de justiça, o fruto próprio daquele país, mas não a havia encontrado. Ele não deve agora procurá-la em Samaria. Aqui Ele está de uma maneira completamente diferente, no caminho da graça somente; e na consciência de que Ele era assim, de que Ele estava aqui somente em graça, como o Salvador dos pecadores, Ele Se dirige a uma mulher que tinha vindo tirar água no poço de Sicar.

 

Havia desde o princípio um segredo com Deus, além e por detrás de todas as exigências reveladas e da ordem de justiça que havia sido estabelecida na Judeia. Havia “graça” e “o dom pela graça”. Ao Judeu poderia ter sido confiado um testemunho à justiça contra o mundo, mas o Filho era o Dom de Deus ao mundo, e a Ele foi confiada a vida para o mundo. “A lei foi dada por Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo” e na abençoada consciência de que Ele carregava Consigo este segredo de graça para os pecadores, Ele diz à mulher: “Dá-me de beber”. Ela se maravilha, como realmente deveria, de que Ele, como Judeu, não manteve distância dela. Mas ela ainda não sabia que o segredo de Deus estava com Ele. Isso, no entanto, logo seria revelado. A glória que excede estava prestes a encher esse lugar imundo. O Senhor Deus está agora tomando Sua posição, não em justiça no monte fumegante, mas na nascente do rio da vida, como seu Senhor, pronto para dispensar suas águas.

 

Que bênção está, portanto, sendo preparada para esta pobre rejeitada! Ninguém além de uma rejeitada poderia conhecê-la. Mas tais rejeitados também devem saber que a fonte desta bênção não está neles mesmos. E isto a samaritana aprende. Ela é levada a conhecer a si própria, a olhar bem para todas as coisas que ela sempre fez, e ver que isso a deixou apenas num deserto e numa terra de trevas. Sua consciência está assombrada. “Esse que agora tens não é teu marido”. Mas embora fosse deserto e terra de trevas, o Filho de Deus estava ali com ela. Esta era uma bênção, uma tal bênção que uma rejeitada em um deserto poderia conhecer. Foi para o rejeitado Jacó, que tinha apenas as pedras do lugar como seu travesseiro, que o céu foi aberto, e Deus em plena graça e glória foi revelado. E assim foi aqui, com esta filha de Jacó. O Senhor estava novamente abrindo a rocha no deserto. A arca de Deus estava agora novamente estabelecida com o arraial no meio do deserto. O Senhor fala da fonte de vida com a samaritana impura; e isto era gozo e o poder do amor para ela. Isso a separa do seu cântaro e preenche seu espírito e seus lábios com um testemunho ao Seu nome.

 

Amados, isto é divino! Uma pobre samaritana, a quem a justiça havia ordenado que ficasse em um lugar imundo, é feita o modelo da obra de Jesus, e introduzida nos segredos e intimidades do Filho de Deus! É seu próprio lugar e caráter de pecadora que a coloca em Seu caminho. É somente o pecador que se encontra no caminho do Salvador. E, irmãos, qualquer que seja a tristeza ou provação que a entrada do pecado possa ter nos causado, ou ainda possa estar causado, ainda assim, sem ela não poderíamos ter tido nosso Deus, como agora O temos, abrindo Seu próprio tesouro de amor, e daí nos dando o Filho.

 

Os discípulos, ao retornarem, se maravilham, assim como a mulher havia se maravilhado, que Jesus não tenha mantido Sua distância Judaica. Mas ainda assim eles estão conscientes da presença de uma glória que estava acima deles; pois “nenhum Lhe disse: Que perguntas? ou: Por que falas com ela?” Eles ainda não conheciam o segredo que o Filho de Deus carregava; e Ele então lhes mostra, como já brancas para a ceifa, as terras que a fé deles nunca havia examinado. Eles não conheciam as terras, exceto aquelas que, antigamente, tinham sido divididas entre as Tribos. Na avaliação deles, a lavoura de Deus deveria ser confinada àquele santo recinto; e Samaria, eles julgaram, estava agora fora dele, e era apenas um lugar imundo. Mas havia, como já vimos, um segredo com Deus. Era o Filho de Deus, o Salvador dos pecadores, que agora havia saído com a semente, e Seu esforço havia preparado uma colheita para os ceifeiros, nas planícies contaminadas de Samaria.

 

(Eu observaria que, ao considerar a questão da “adoração”, para a qual a mulher O atraiu, Ele ainda fala em Seu caráter como Filho. A mulher se dirige a Ele como Judia, mas Ele não responde a ela como Judia. Ele antes mostra que toda a adoração Judaica estava agora terminando; e na consciência de que o Filho havia chegado, Ele a ensina que chegou a hora em que toda a adoração aceitável deve ser no espírito de adoção, que era o Pai que agora estava reivindicando adoração. Toda a Sua resposta expressa a consciência disto, que Ele estava Se dirigindo à mulher, não como o Filho de Davi que havia vindo para purificar o templo e trazer de volta os samaritanos revoltosos que estavam “neste monte”, mas como o Filho que veio para dar aos pecadores “acesso ao Pai em um mesmo Espírito”).

 

Ele mostra a Seus discípulos uma companhia que acabava de sair de Sicar, que logo diria: “Este é verdadeiramente o Cristo, o Salvador do mundo”. E assim eles estavam prontos para a foice. A colheita na Judeia era grande (Mt 9:37); mas em Samaria estava madura para os ceifeiros. O Senhor havia suportado o trabalho do semeador; havia falado, cansado e fraco, com a mulher; mas Ele agora compartilharia com Seus discípulos a alegria da colheita; e, em garantia disto, Ele permanece por dois dias com esta pequena colheita feita em Sicar, crido e reconhecido como o Salvador do mundo.

 

É muito bendito conhecer a proximidade com Ele mesmo à qual o Senhor convida a alma, e a intimidade com a qual Ele busca envolver o coração de um pecador crente. Ele não trata conosco no estilo de um patrono ou benfeitor. O mundo está cheio desse princípio. “Os que têm autoridade sobre eles são chamados benfeitores” (Lc 22:25). O homem estará pronto o suficiente para conferir benefícios no caráter de um patrono, ocupando o tempo todo o lugar distante de consciente e confessada superioridade. Mas Jesus não é assim. Ele pode dizer: “Não vo-lo dou como o mundo dá”. Ele traz o Seu dependente para muito perto d’Ele. Ele o deixa saber e sentir que Ele está tratando com ele como um Parente e não como um patrono. E isso faz toda a diferença. Sou ousado em dizer que o céu depende dessa diferença. O esperado céu da alma, e que em espírito ela prova agora, depende do Senhor Jesus não agir conosco no princípio de um patrono. O céu seria então apenas um mundo bem ordenado de princípios e benevolências humanas. E que coisa seria isso! São as condescendências de um grande ser que vemos em Cristo? “Eu, porém, entre vós sou como aquele que serve”, diz Ele. Cada caso, posso dizer, me diz isso. Seu estilo nunca foi o de um mero benfeitor; nunca à distância e elevação de um patrono. Ele suportou nossas fraquezas e carregou nossas tristezas.

 

Basta olhar para Ele nesse poço, com essa samaritana. Ela teve, naquele momento, os pensamentos mais exaltados sobre Ele. “Eu sei que o Messias (que se chama o Cristo) vem; quando Ele vier, nos anunciará tudo” Este era seu elevado e justo senso do Messias, não sabendo que Aquele com Quem ela estava então falando face a face poderia dizer imediatamente em resposta a ela, “Eu O Sou, Eu que falo contigo”.

 

Mas onde estava Ele, o Cristo exaltado, todo esse tempo? Conversando com ela, enquanto se encontravam, ao lado de um poço, onde (para dar-lhe conforto em Sua presença) Ele lhe dissera: “Dá-me de beber”.

 

Era esse patronato à maneira dos homens? Era essa a distância e a condescendência de um superior? Era esse o céu ou o mundo, o homem ou Deus? A condescendência ou o mundo conferirá o favor que você quiser, mas manterá e honrará a elevação de um superior e a reserva de um dependente. Mas o céu ou o amor não agem assim. Bendito, bendito seja Deus! Jesus, Deus manifestado em carne, era Parente daqueles a quem Ele favoreceu. E Ele agiu como um Parente, não como um patrono. Ele busca nos trazer para perto, para envolver nosso coração com tranquilidade e confiança. Ele nos visita. Não, Ele vem a nós mediante o nosso convite – como Ele foi e habitou dois dias com os samaritanos que saíram e buscaram Sua companhia por causa do testemunho da mulher. Ele pede um favor de nossa mão, para que possamos receber um favor d’Ele sem reservas. Ele beberá de nosso cântaro, para nos encorajar a beber de Suas fontes; e comer da nossa vitela à porta da tenda, enquanto nos revela segredos eternos (Gênesis 18; João 4).

 

Certamente nosso coração pode se regozijar com isso. O coração do Senhor se regozija com essa Sua própria maneira de amar. Pois esses dois dias em Sicar foram para Ele um pouco da alegria da colheita. Eles foram alguns dos mais revigorantes que o cansado Filho de Deus já provou nesta nossa Terra. Pois Ele encontrou aqui um pouco da fé mais brilhante que já encontrou; e foi somente a fé dos pecadores que poderia tê-Lo revigorado aqui. Nada no homem poderia ter feito isso – nada além daquela fé que tira o homem de si mesmo.

 

Mas essa alegria durou apenas dois dias. Ele é rapidamente chamado para uma região mais baixa; pois depois desses dois dias Ele segue para a Galileia, entrando assim em conexão Judaica novamente; mas Ele vai com este triste pressentimento: “um profeta não tem honra na sua própria pátria”. E com maior provação de coração Ele deve sentir isso agora, por causa da liberdade que Ele tinha acabado de conhecer entre os pecadores em Samaria. E Seu pressentimento foi considerado verdadeiro. Ele encontra fé na Galileia, é verdade, mas fé de uma ordem inferior. Os galileus O recebem, mas é porque foram “vistas todas as coisas que fizera em Jerusalém”. O nobre e sua casa creram, mas não antes de terem cuidadosamente se assegurado Quem era Ele, por suas próprias testemunhas. A colheita em Sicar havia crido n’Ele próprio, os galileus agora creem n’Ele por causa de Suas obras (veja João 14:11); os samaritanos O conheceram como Ele mesmo, os Judeus estavam agora, por assim dizer, pedindo um sinal novamente. Uns, portanto, entraram em comunhão com o Filho de Deus, o outro recebeu saúde do Médico de Israel. A profanada Samaria está, em bênção, antes do que o justo Judá.

 

Aqui a primeira seção do nosso Evangelho se encerra. Ela nos conduziu pelos caminhos do Filho de Deus, o Filho do Pai, em meio a esse nosso mundo mal. No início dela, vimos Sua glória e descobrimos que, no momento em que ela brilhou sobre o mundo, ela comprovou as trevas do mundo. Ela não encontrou resposta do homem. O mundo que foi feito por Ele não O conhecia. Mas Ele carregava Consigo um segredo, o segredo da graça de Deus para os pecadores, mais profundo do que todos os pensamentos dos homens. Ele era um Estrangeiro na Terra; mas a revelação de Seu segredo aos pecadores tinha a virtude de torná-los estrangeiros com Ele.

 João 5 – 12 


Tendo seguido nosso Senhor pelos capítulos 1-4 deste Evangelho, desejo agora, na graça de Deus, trilhar Seu caminho adiante; e que Ele, por meio do Espírito, possa fazer desta obra uma ocasião de santo e agradecido deleite!

 

Nos capítulos 5-12 vemos nosso Senhor em contato com os Judeus. Mas não é o propósito do Espírito neste Evangelho exibir Sua vida pública e ministério. Ele não é visto aqui, como nos outros Evangelhos, andando pelas cidades e aldeias de Israel pregando o reino, a ver se porventura eles se arrependessem; mas o abandono de Deus por parte daquele mundo pelo qual Ele estava passando parece estar sempre em Sua mente; e somente às vezes Ele é visto agindo em poder ou em graça sobre todos ao Seu redor, como o Filho de Deus, o Estrangeiro do céu, o Salvador dos pecadores.

 

E assim é quanto aos Seus discípulos. Eles não são os companheiros do Seu ministério neste Evangelho, como são nos outros. Ele não nomeia os doze, e depois os setenta – mas o ministério é deixado em Sua própria mão. Os apóstolos são vistos pouco com Ele até João 13, quando Seu ministério público se encerra. E quando estão com Ele, é com alguma reserva (veja João 4:32; 6:5; 11:9).

 

Mas, por outro lado, em nenhum Evangelho Ele é visto tão perto do pecador. Ele está a sós com a samaritana, a sós com a adúltera, a sós com o mendigo rejeitado. E isso dá seu maior interesse a esta preciosa porção da Palavra de Deus. O gozo e a segurança de estar a sós com o Filho de Deus, como é aqui manifestado, está além de tudo para a alma. O pecador aprende assim seu título para com o Salvador, e descobre a verdade bendita, que eles são adequados Um ao outro. No momento em que aprendemos que somos pecadores, podemos olhar para o rosto do Filho de Deus, e reivindicá-Lo como nosso. E que momento nos próprios dias do céu é esse! Ele veio para buscar e salvar pecadores; e Ele andou como um Homem solitário na Terra, exceto quando Ele encontrava um pobre pecador. Somente esse tal tinha título, ou mesmo poder, para interromper a solitude deste Estrangeiro celestial. O mundo não O conhecia. Seus caminhos eram solitários entre nós, exceto quando Ele e o pecador encontraram seu caminho Um para o outro. O leproso fora do arraial O encontrou, mas ninguém mais.

 

E deixe-me dizer, esse estar a sós com Jesus é a primeira posição do pecador. É o começo de seu gozo; e ninguém tem o direito de se intrometer nisso. Aquilo que tem se chamado a si mesmo de igreja tem tentado, em todas as eras da Cristandade, invadir a privacidade entre o Salvador e o pecador, e se tornado parte na solução da questão que há entre eles, mas nisso ele tem sido um intruso. O pecado nos lança unicamente sobre Deus.

 

E de fato, amados, na variedade de julgamentos hoje em dia, é necessário para nossa paz saber disso. Outros podem exigir que nos juntemos a eles em linhas particulares de serviço, ou em formas e ordens particulares de adoração; e podem nos considerar desobedientes se não o fizermos. Mas, por mais que possamos ouvi-los nessas coisas, não ousamos, com medo deles, renunciar a prerrogativa de Deus, e de somente Ele, tratar conosco como pecadores. Não devemos ceder a ninguém o direito de Deus de apenas Ele falar conosco sobre nossos pecados. Nem deve nossa ansiedade sobre mil questões que podem surgir, por mais justa que essa ansiedade possa ser, ser permitida a nos levar por um momento a esquecer que, como pecadores, já estivemos a sós com Jesus; e que Ele, de uma vez por todas, nas riquezas de Sua graça, nos perdoou e nos aceitou.

 

Nosso Evangelho nos apresenta essa solitude de Cristo e do pecador do modo mais reconfortante. Mas quanto a todos os outros, Jesus está aqui apenas à distância, e com reserva. E tanto quanto a lugares quanto a pessoas. O Filho de Deus não tinha nada a ver especialmente com nenhum lugar; o vasto deserto do mundo, onde os pecadores eram encontrados, era a única cena para Ele.

 

Mas continuarei agora a seguir os capítulos em ordem.

 João 5

 

Já mostrei, a partir de várias instâncias, que houve, por todos os estágios da história de Israel, a ocasional manifestação de uma energia especial do Espírito, pela qual, e não pelos recursos de seu próprio sistema, o Senhor estava sustentando Israel, e ensinando-os a saber onde estava sua esperança final. Do chamado de Abraão ao trono de Davi, vimos isso.

 

Agora julgo que Betesda foi testemunha da mesma coisa. Betesda não era aquilo que o próprio sistema fornecia. Ela estava aberta em Jerusalém, como uma fonte de cura, pela graça soberana de Jeová (como, de fato, o nome dela significa). Nem era um alívio permanente, mas apenas ocasional, como os juízes e profetas tinham sido. Como eles, era um testemunho da graça e do poder que estavam no próprio Deus para Israel, e tinha, talvez, produzido este seu testemunho em certos momentos durante toda a era das trevas que se passou desde os dias do último de seus profetas. Mas agora deve ser colocada de lado. Suas águas não devem mais ser agitadas. Aquele a Quem todas essas testemunhas da graça apontavam tinha aparecido. Como a verdadeira Fonte de saúde, o Filho de Deus tinha agora vindo à filha de Sião, e estava Se mostrando a ela.

 

Somos informados de que era um tempo de festa (v. 1). Tudo prosseguia em Jerusalém como se tudo estivesse correto diante de Deus. As festas eram devidamente observadas; o tempo era de serviços religiosos precisos. Mas Betesda, por si só, poderia ter dito à filha de Sião que ela precisava de um médico, e não estava naquele descanso que a fidelidade a Jeová teria preservado para ela. E o Senhor agora lhe diria a mesma verdade. Ele cura o homem impotente, tomando assim o lugar de Betesda; mas Ele o faz de uma forma que conta a Israel sobre sua perda do sábado – a perda de sua própria glória. “E aquele dia era sábado”.

 

A nação imediatamente se sensibiliza a isso. Tocou no lugar do orgulho deles; pois o sábado era o sinal de toda a sua distinção nacional; e eles se ressentem disso – eles “procuravam matá-Lo, porque fazia estas coisas no sábado”.

 

Mas devo me demorar um pouco mais aqui.

 

Jesus ao lado do tanque de Betesda, como O vemos neste capítulo, é uma visão para a qual, no espírito de Moisés diante da sarça, bem podemos nos virar para ver. Se, outrora, Ele havia Se refletido naquela água, agora Ele está ali para secá-la. Ele está ali como uma coisa nova, em forte contraste com o tanque. “Queres ficar são?” foi a palavra que Ele dirigiu ao pobre aleijado que estava deitado ali. Será que ele estava pronto para se colocar, assim como estava, em Suas mãos? Ele estava disposto a ser Seu devedor? Ele poderia confiar-se, em toda a sua necessidade e impotência, somente a Jesus? Isso era tudo. E certamente isso estava em contraste com o pesado e incômodo maquinário de Betesda. Nenhuma rivalidade precisava ser temida, nenhuma ajuda precisava ser procurada, nenhuma demora precisava ser suportada, nem incerteza sentida. Aqueles que poderiam ter lutado com este aleijado para descer ao tanque antes dele, ou aqueles que poderiam, por pena, ter sido atraídos para ajudá-lo a descer antes dos outros, a todos agora ele podia igualmente ignorar; e a demora e a esperança podem agora ser trocadas por uma libertação presente e completa. Anjos e o tanque, ajudantes e rivais, demora e incerteza, agora estavam todos abençoada e gloriosamente despedidos por Jesus em seu favor. Quando Jesus apareceu, quando o Filho de Deus estava ao lado deste tanque, a única questão era: O pobre aleijado estaria disposto a ser Seu devedor – a permanecer ali e ver Sua salvação?

 

A pobreza do tanque é exposta. Ele é visto como nada mais que um “rudimento...  pobre”. Não tem glória em razão da excelente glória. E desta mesma maneira o Espírito, pelo apóstolo, expõe o “santuário terrestre”, e todas as suas provisões e serviços, na Epístola aos Hebreus. Como posso dizer, Jesus está ali de pé novamente ao lado de Betesda. Ele é apresentado pelo Espírito Santo em contraste com todo aquele sistema de ordenanças e observâncias que havia antes, e Ele expõem todos eles em sua impotência e pobreza. Havia, de fato, um reflexo de Cristo naquelas cerimônias do antigo tabernáculo, assim como havia nesta água perto da porta das ovelhas; mas esse reflexo desaparece agora, quando a própria Luz preenche o lugar.

 

Mas, enquanto nos demoramos um pouco mais neste tanque, o que diremos, quando vemos, não apenas este aleijado, mas uma “grande multidão de enfermos” que morria aos poucos ao redor daquela água incerta e decepcionante, embora o Filho de Deus estivesse por toda a terra, carregando n’Ele e com Ele cura e libertação sem dúvida ou demora, e desafiando toda rivalidade, e independente de toda ajuda! Certamente isso nos ensina uma lição. O tanque densamente frequentado, Jesus passando despercebido! O tanque procurado, enquanto Jesus tem que buscar, e Se propor! Que testemunho da religião do homem! Ordenanças, com todo o seu maquinário incômodo, ainda aguardavam; a graça de Deus que traz salvação desprezada!

 

Poderíamos nos maravilhar se não soubéssemos, a partir de nós mesmos, algumas das operações dessa nossa natureza arruinada.

 

Mas ainda mais. Nos outros Evangelhos, quando o Senhor é desafiado por fazer Suas obras no dia de sábado, Ele responde como se fosse do caso de Davi comendo os pães da proposição, dos sacerdotes trabalhando no templo, ou do fato de que eles mesmos, Seus acusadores, levariam seus jumentos para beber água no dia de sábado. Mas aqui, no Evangelho de João, não é o que Davi, ou os sacerdotes, ou Seus próprios acusadores fariam, ou fizeram, que Ele alega, mas o que o Pai celestial sempre fez neste mundo necessitado e arruinado. “Meu Pai trabalha até agora, e Eu trabalho também”, o Senhor aqui diz àqueles que estavam desafiando este Seu ato em Betesda, porque era o sábado.

 

Frase maravilhosa! E quão completamente em caráter com Sua maneira por todo João. Ele não Se coloca aqui, como nos outros Evangelhos em ocasião semelhante, em companhia de Davi, dos sacerdotes ou de Seus próximos, mas com Deus! “Meu Pai trabalha até agora, e Eu trabalho também”.

 

Isto é cheio de caráter consistente com tudo o que obtemos neste Evangelho. E certamente é cheio, também, daquilo que pode suscitar o jubiloso louvor daqueles que O conhecem. Com os Judeus, no entanto, era diferente. Estas palavras novamente lhes contaram sobre sua perda do sábado em que se orgulhavam; sim, que eles o haviam perdido há muito tempo, perdido desde o princípio; pois, em cada estágio de sua história, Deus tinha estado operando em graça entre eles, operando como Seu Pai, do qual Betesda era o sinal; e que Ele mesmo havia vindo agora, exatamente da mesma forma, para operar em graça entre eles, do qual este pobre aleijado restaurado era o sinal. Esta foi a voz destas palavras: “Meu Pai trabalha até agora, e Eu trabalho também”; referindo-Se ao ato de graça por toda a história de Israel, que eu observei, mas sobre isso os Judeus O ressentem ainda mais; e, não estando no segredo de Sua glória, eles O acusam de blasfêmia por chamar Deus de Seu Pai.

 

A isto Ele novamente responde (ainda, como antes, falando de Si mesmo como Filho, mas também tomando um lugar de sujeição), “Na verdade, na verdade vos digo que o Filho por Si mesmo não pode fazer coisa alguma”. (Sem o conhecimento da dignidade Divina de Sua Pessoa, não podemos descobrir o lugar que o Senhor aqui toma para ser o lugar de sujeição voluntária, como era. Pois não teria sido assim em nenhuma mera criatura, por mais exaltada que fosse, ter dito: “Eu não posso de Mim mesmo fazer coisa alguma”. Mas isto, no Filho, era sujeição.)

 

Mas tudo isso é muito abençoado. Aquele que veio a este mundo em favor de Deus e Sua honra, não poderia tomar outro lugar. Era o único lugar de justiça aqui. Aquele “que busca a glória d’Aquele que O enviou, Esse é verdadeiro, e não há n’Ele injustiça”. O homem, por orgulho, desonrou a Deus. O homem fez uma afronta à majestade de Deus quando deu ouvidos às palavras: “Sereis como Deus”. E o Filho, que veio para honrar a Deus, deve humilhar-Se. Embora na forma de Deus, Ele deve esvaziar-Se aqui. O louvor de Deus, em um mundo que se afastou d’Ele em orgulho, deve ter este sacrifício. E este sacrifício o Filho ofereceu. Mas isso não convinha ao homem; isso não era de acordo com o homem; e o homem não poderia receber ou sancionar tal Pessoa. “Eu vim em nome de Meu Pai, e não Me aceitais; se outro vier em seu próprio nome, a esse aceitareis”.

 

Este é um assunto profundo e santo, amados. Por Sua humilhação e sujeição, o Filho estava ao mesmo tempo honrando a Deus e testando o homem; dando ao “único Poderoso” Seus direitos neste mundo, mas assim Se tornando Ele mesmo um sinal para tornar manifestos os pensamentos do coração. E o Judeu, o Judeu favorecido, foi encontrado no ateísmo comum do homem; pois revelar esta fonte oculta de incredulidade em Israel era a tendência do discurso de nosso Senhor neste capítulo. Não foi por falta de luz e testemunho. Eles tinham as obras de Cristo, a voz do Pai, suas próprias Escrituras e o testemunho de João. Mas, além disso, eles tinham o amor do mundo neles, e não o amor de Deus; e estavam, portanto, despreparados para o Filho de Deus (v. 42).

 

“Como podeis vós crer, recebendo honra uns dos outros, e não buscando a honra que vem só de Deus?” (v. 44). Certamente isso tem uma voz para nossos ouvidos, amados! Isso não nos diz que o coração e seus movimentos ocultos precisam ser vigiados? “Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as saídas da vida”. Pode haver correntes fortes e perigosas correndo abaixo da superfície. Jó era um homem piedoso. Não havia ninguém como ele em sua geração. Mas em sua alma fluía uma corrente rápida. Ele valorizava seu caráter e suas circunstâncias. Não que ele fosse, da maneira comum, hipócrita ou mundano. Ele era verdadeiramente um crente, um amigo e benfeitor generoso. Mas ele valorizava suas circunstâncias na vida e sua estima entre os homens. Nos exercícios ocultos de seu coração, ele costumava examinar sua boa condição com complacência (Jó 29). Essa era uma forte corrente subterrânea. Seus próximos não haviam traçado o curso dessa corrente; mas seu Pai celestial havia; e porque Ele o amava e queria que ele participasse de Sua santidade, com a qual tudo isso era inconsistente, Ele o colocou em Sua própria escola para exercitá-lo.

 

Que gracioso aviso isso nos dá, para manter os fluxos e refluxos do coração sob vigilância. “Em que estamos pensando?”, podemos nos perguntar repetidamente ao longo do dia. Em que estamos gastando nossa diligência? Quais são os cálculos secretos de nossa mente em momentos de relaxamento? É o espírito ou a carne que está nos fornecendo alimento? Nossas afeições que se agitam dentro têm sabor de céu ou de inferno?

 

Estas são perguntas saudáveis para nós, e são sugeridas pelo forte pensamento moral do Senhor aqui: “Como podeis vós crer, recebendo honra uns dos outros?”

 

Como poderia o homem, apóstata em seu orgulho, suportar o humilde Filho do Homem, o esvaziado Filho de Deus? Esta foi a fonte onde sua incredulidade teve sua origem. Não havia associação entre eles e Aquele que permanecia em favor da honra de Deus diante dos homens. Sua forma de humilhação agora era rejeitada, assim como Sua obra e graça em Betesda haviam sido recusadas antes. Seus irmãos deveriam ter entendido como Deus por Sua mão os livraria; mas eles não entenderam; eles não creram em Moisés, e estavam assim, em princípio, ainda no Egito, ainda na carne, ainda não redimidos. Se tivessem crido em Moisés, teriam crido em Cristo, e sido conduzidos por Ele, como neste momento, para fora da mão do Faraó, do poder da carne e do mundo. Mas sob tudo isso, por meio da incredulidade, este capítulo os encontra e os deixa.

 João 6

 

Uma nova cena se abre aqui. Era a páscoa: mas a misericórdia de Deus, que aquele momento celebrava, Israel havia menosprezado. Eles ainda tinham que aprender a lição do Egito e do deserto; e em amor paciente, depois de tantas provocações, o Senhor queria, mesmo agora, ensiná-los.

 

Assim, Ele alimenta a multidão em um lugar deserto; mostrando assim a graça e o poder d’Aquele que, por quarenta anos, havia alimentado seus pais em outro deserto. Os discípulos, como Moisés, se admiram em incredulidade, e falam, por assim dizer: “Degolar-se-ão para eles ovelhas e vacas que lhes bastem?” Mas Sua mão não está encurtada. Ele os alimenta; e isso desperta zelo na multidão, e eles viriam de bom grado, e pela força O fariam um rei. Mas o Senhor não tomaria o reino por meio de um zelo assim. Esta não poderia ser a fonte do reino do Filho do Homem. Os animais podem tomar seus reinos dos ventos combatendo no mar grande, mas Jesus não fará assim (Dn 7). Esta não era Sua mãe coroando-O no dia de Seu desposório (Cantares de Salomão 3). Este não era, em Seus ouvidos, o alarido do povo trazendo a pedra da esquina; nem o indício de Seu povo voluntariamente exercitado no dia de Seu poder. Esta teria sido uma nomeação para o trono de Israel com base em princípios dificilmente melhores do que aqueles pelos quais Saul havia sido nomeado antigamente. Seu reino teria sido o fruto de um desejo acalorado do povo, assim como o de Saul havia sido o fruto de seu coração revoltado. Mas isso não poderia ser. E além disso, antes que o Senhor pudesse tomar Seu assento no Monte Sião, Ele deveria subir o monte solitário; e antes que o povo pudesse entrar no reino, eles deveriam descer para o mar tempestuoso. E essas coisas vemos refletidas aqui, como em um espelho. O Senhor é visto no alto por um tempo, e eles estão suportando os golpes dos ventos e das ondas; mas no devido tempo Ele desce de Sua elevação, faz a tempestade se acalmar e os leva ao seu porto desejado. E assim será em breve. Ele descerá no poder do céu ao qual Ele agora ascendeu, para a libertação de Seus aflitos; então eles verão as Suas maravilhas, como no profundo, e louvá-Lo-ão pela Sua bondade, pelas obras que faz pelos filhos dos homens (Sl 107:23-32). [Nos lugares correspondentes em Mateus e Marcos, lemos que o Senhor vai ao monte para orar. Mas isso não é notado aqui. De fato, o Senhor não é mostrado por João em oração (exceto em João 17; e isso é, na verdade, intercessão); e tudo isso ainda está no caráter completo do nosso Evangelho.]

 

O Senhor, portanto, apenas Se retira de todo esse despertar popular em Seu favor. Como a mente do Estrangeiro celestial deve ter sentido total dissociação de tudo isso! Ele Se retira disso; e, no dia seguinte, entra em outra obra completamente diferente. Ele revela o mistério da verdadeira páscoa, e o maná do deserto, que eles ainda tinham que aprender. Eles ainda tinham que aprender a virtude da cruz, a verdadeira páscoa que liberta do Egito, da escravidão da carne, do julgamento da lei; capacitando o pecador a dizer: “estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu”. O salário do pecado é a morte; e o pecado, na cruz, recebeu seu salário. A morte exerceu seu domínio; e a lei pode retornar ao trono de Deus com sua própria vindicação; pois ela executou sua comissão: Cristo morreu, e morreu por nós. Esta é a verdadeira páscoa – o poder da redenção; na graça da qual deixamos o Egito, ou o lugar da escravidão, e saímos com o Filho de Deus para o deserto, para ali nos alimentarmos do maná, para ali vivermos de toda Palavra que procede da boca de Deus.

 

E embora, nesse sentido, sejam distintos, o Senhor neste discurso parece combinar os mistérios da páscoa e do maná. Foi no tempo da páscoa que Ele pregou a eles sobre o maná. Pois ambos pertenciam ao mesmo Israel, à mesma vida. O sangue do cordeiro pascal estava sobre a verga da porta para redenção, enquanto se alimentavam do cordeiro dentro da casa. O israelita estava em comunhão viva com aquilo que lhe dava segurança. E este foi o começo da vida para ele; na força da qual ele saiu para se alimentar do maná no deserto.

 

Mas Israel, como aqui encontramos, ainda não havia saído da escravidão do Egito para as pastagens de Deus no deserto. Eles provam que ainda não conheciam esta vida; que ainda não tinham realmente guardado a páscoa, nem se alimentado do maná. Eles murmuravam contra Ele. Seus pensamentos estavam muito cheios de Moisés. “Deu-lhes a comer o pão do céu”, disseram eles. Mas, antes que pudessem de fato comer do maná, eles deveriam cair nos caminhos do amor, nos pensamentos do Pai, e não nos de Moisés. Pois é o amor que nos leva à cruz. Moisés nunca deu aquele pão. A lei nunca preparou a festa. É o amor que faz isso; e o amor deve ser apreendido, enquanto nos assentamos nela. E esta é a razão pela qual tão poucos convidados estão lá; pois o homem tem pensamentos duros sobre Deus e pensamentos orgulhosos sobre si mesmo. Mas, para guardar a festa, devemos ter pensamentos felizes sobre Deus e pensamentos humildes e abnegados sobre nós mesmos. A comunhão com o Pai e com o Filho, no terreno da salvação, a comunhão com Deus no amor, é vida.

 

Mas Israel não estava nessa comunhão. Eles recuam, eles O afastam deles, e eles, em seu coração, voltam novamente para o Egito: seus cadáveres caem no deserto, e somente um remanescente se alimenta das “palavras da vida eterna” e vive – um remanescente que olha para todo o redor como sendo um deserto estéril que não produz pão sem Ele, como “uma terra seca e sedenta” (KJV) de uma ponta à outra, exceto pela Rocha que os segue; e eles dizem: “Para Quem iremos nós?”

 

E de onde vem esse remanescente? “Segundo a eleição da graça”, como o Senhor aqui ensina ainda mais, mostrando-nos os atos do Pai no mistério de nossa vida, que é Ele Quem dá ao Filho, e atrai ao Filho todos os que vêm a Ele; que Seus ensinamentos e atrações são os canais ocultos pelos quais esta vida está nos alcançando. “Senhor, para Quem iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna; e nós temos crido e conhecido que Tu és o Cristo, o Filho de Deus”. Esta é a fé e a declaração daquele remanescente eleito, que, saindo do Egito, vive pela fé no Filho de Deus; mas somente no Filho de Deus como crucificado. Pois nossa vida está em Sua morte, e pela fé que se alimenta dessa morte. Nenhuma aceitação de Cristo, a não ser como crucificado, é eficaz para a vida. Não são Suas virtudes, Seus ensinamentos, Seu exemplo, ou coisas semelhantes, mas a Sua morte (Sua carne e sangue), da qual devemos nos alimentar. Sua morte realizou, de forma única e exclusiva, o que todos os outros juntos nunca fizeram e nunca poderiam. O bendito Senhor morreu; entregou o espírito, ou rendeu a vida que Ele tinha, e que ninguém tinha título para tirá-la d’Ele. Mas, no momento em que isso foi feito, irromperam resultados que toda a Sua vida anterior nunca havia produzido. Foi então, mas não antes disso, que o véu do templo foi rasgado, as rochas se fenderam, os sepulcros se abriram. Céu, Terra e inferno sentiram um poder que nunca haviam conhecido antes. A vida de Jesus, Suas caridades ao homem, Sua sujeição a Deus, o cheiro de Sua natureza Humana imaculada, a santidade d’Aquele que havia nascido da virgem, nada disso, nem todos eles juntos, nem tudo n’Ele e sobre Ele, por Ele ou através d’Ele, a não ser a entrega da vida, jamais teria rasgado o véu ou aberto os sepulcros. Deus ainda estaria à distância, o inferno ainda não teria sido conquistado, e aquele que tem o poder da morte ainda não teria sido destruído. O sangue de Cristo fez o que todos os outros nunca fizeram, e nunca poderiam fazer. E sobre Ele que assim foi pregado e estabelecido ainda deve ser dito: “Quem tem o Filho tem a vida”.

 

Isso me leva a fazer uma pequena pausa sobre um assunto conectado com a nossa vida da qual este capítulo fala. Sob a lei, todos os animais mortos deveriam ser trazidos à porta do tabernáculo, e seu sangue oferecido sobre o altar, e de forma alguma deveria ser comido (Lv 17). Esta era uma confissão de que a vida havia retornado a Deus, e não estava em poder do homem. Comer sangue sob a lei teria sido uma tentativa de recuperar a vida por nossa própria força – uma tentativa do homem de alcançar aquilo que ele havia perdido. Mas agora, sob o Evangelho, a ordenança é alterada. O sangue deve ser bebido – “se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o Seu sangue, não tereis vida em vós mesmos”. Pois a vida que havia retornado a Deus, Deus a deu para fazer expiação. O sangue do Novo Testamento foi derramado para a remissão dos pecados, e a vida, por meio desse sangue, agora é dada aos pecadores na Pessoa do Filho de Deus. “N’Ele estava a vida”. Ele veio de Deus com a vida para nós. “Quem tem o Filho tem a vida”. E somos ordenados, assim como suplicados, a tomar vida d’Ele. E, verdadeiramente podemos dizer, nosso Deus assim aperfeiçoou nosso conforto e nossa segurança diante d’Ele, fazendo com que seja como simples desobediência em nós não tomar vida d’Ele como Seu dom, como seria simples orgulho e arrogância de coração assumir tomá-la por nossas próprias obras. Que súplica de amor é essa para com nossa alma! Somos desobedientes se não formos salvos! A morte é inimiga de Deus assim como é nossa, e se não tomamos vida do Filho, nos juntamos ao inimigo de Deus. “Não quereis vir a Mim para terdes vida”, diz o Filho de Deus ofendido. E quando perguntado por certas pessoas neste mesmo capítulo: “Que faremos para executarmos as obras de Deus?” Ele apenas responde: “A obra de Deus é esta: Que creiais n’Aquele que Ele enviou”. Crer e tomar a vida como um dom de Deus por meio de Seu Filho é o único ato de obediência que o Deus bendito exige de um pecador – a única coisa que um pecador, até que seja reconciliado, pode fazer para agradá-Lo.

 

Esta é a graça revelada de maneira maravilhosa e bendita. Esta ordenança, que proibia comer sangue, era como a espada flamejante do Querubim (JND) no jardim. Tanto aquela espada quanto esta ordenança diziam ao pecador que não haveria recuperação da vida perdida por nenhum esforço seu. E a fé de Adão se mostra mais docemente aqui. Ele não procurou retirar aquela espada, como se pudesse recuperar a árvore da vida por si mesmo. Mas o que ele fez? Ele tomou a vida de Deus, pela graça, e o dom pela graça. Ele creu na promessa sobre a Semente da mulher; e naquela fé, chamou a mulher de “a mãe de todos os viventes”. Ele tomou a vida como o dom de Deus por meio de Cristo, e não a buscou por obras da lei, ou diante da espada flamejante.

 

Todo esse mistério na vida do pecador foi assim ilustrado desde o início, até mesmo na fé de Adão; e é abençoadamente revelado no discurso de nosso Senhor ao povo neste capítulo. Essa vida começa no poder da redenção pelo cordeiro pascal morto no Egito, e pelo maná do deserto. Mas nosso capítulo nos mostra que Israel ainda era um estranho a ela; que eles não tinham aprendido a lição do Egito e do deserto, no conhecimento da redenção e da vida que estão em Cristo Jesus.


J. G. Bellett








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