Baixe esta parte do livro digital nos formatos:
Baixe o livro digital completo nos formatos:
ÍNDICE
Princípios da Guerra Espiritual
O Evangelho no Livro de Josué
Henry Forbes Witherby
Parte 4/4
O Refúgio do Pecador - Josué 20
“E em nenhum outro há salvação, porque também debaixo do céu nenhum outro Nome há, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos” (At 4:12).
Tendo a herança sido distribuída entre as tribos, era necessário, para preservar a santidade da terra, que um refúgio fosse providenciado contra as mãos do vingador.
A cidade de refúgio foi ordenada por Deus para a segurança daquele que, sem querer, matasse seu próximo e, uma vez dentro de suas portas, o homicida era preservado da vingança pelas mesmas leis que exigiam seu sangue enquanto ele estivesse fora da cidade. As portas da cidade estavam sempre abertas, pois o objetivo de prover a cidade era “para que todo homicida se acolha ali” (Dt 19:3). A terra ao redor era disposta de tal forma que as estradas principais corriam em direção às suas portas, e, como a cidade era construída em um local elevado, não poderia haver dificuldade em encontrar o caminho; era tão simples, que os viajantes, embora símplices, não podiam errar quanto a ele.
A necessidade levava o homicida às portas abertas da cidade, ele sabia que o vingador do sangue estava em seu encalço, então ele fugiu para salvar a vida, deixando família e lar. “Tudo quanto o homem tem dará pela sua vida”. E quando o pecador percebe o julgamento vindouro, ele não ousa ficar parado. Se algum homem acreditar que sua segurança eterna está em jogo, tudo o que é mais agradável na Terra falha em apaziguá-lo, tudo o que é mais caro não consegue detê-lo. A indiferença estaria fora de questão para o homicida que sabia que o vingador do sangue o procurava, mas o seu fim estaria próximo se ele se abrigasse sob uma falsa segurança, confiando que não seria descoberto. Como as portas da cidade estavam abertas dia e noite, e como a cidade foi expressamente provida por Deus para o homicida, o sangue daquele que brincou com a sua segurança e pereceu pelas mãos do vingador, estava sobre sua própria cabeça. É a falsa paz que arruína tantos que, se embalando em uma segurança equivocada, brincam com a justiça de Deus e adiam, para “quando tiver ocasião favorável”, aquela jornada que aquele homem que acredita em sua condenação e no decreto irrevogável de Deus, não ousa adiar por um momento. E assim eles perecem, apesar das portas da misericórdia estarem escancaradas para recebê-los; e esses perecem justamente, pois rejeitam voluntariamente a provisão que o próprio Deus fez para eles.
Longa e penosa pode ter sido a jornada do homicida até a cidade provida para sua necessidade; ele pode ter tido que arrastar um corpo fraco pela cansativa estrada do monte; sua força pode ter falhado, ele pode ter caído no caminho, o vingador pode ter sido mais forte e mais rápido do que ele, mas Jesus é mais para o pecador do que o Refúgio do julgamento; Ele é a Vida, e para aqueles que estão n’Ele não há morte. Esforçar-se para se preparar para a misericórdia é supor um estágio intermediário para a segurança eterna e ignorar o Senhor Jesus como a Salvação de Deus. Nesta hora presente, todo homem ou tem o Filho de Deus e a vida, ou tem a ira de Deus que permanece sobre ele. O homicida sabia que o caminho para a cidade de refúgio foi feito pela designação de Deus e, com a vingança em seu encalço, apressou-se para ela, usando toda a sua energia para escapar. Estamos “fracos”, mas aquele que confia em Cristo está seguro imediatamente. Bem, é para aqueles que sentem sua total impotência, bem como seu perigo eterno, que o Senhor Jesus é realmente precioso.
Fora de Cristo, Deus não tem misericórdia para o homem. Seria impossível para Ele, tendo dado Seu Filho, dar vida eterna a qualquer um, exceto por Ele. É uma reprovação ao amor e à justiça de Deus pensar em segurança, por qualquer outro meio que não seja por “Àquele que não conheceu pecado” e que foi feito “pecado por nós; para que, n’Ele, fôssemos feitos justiça de Deus”. E mais do que isso, a morte de Cristo selou a condição do homem; “se um morreu por todos, logo, todos morreram”. A cruz declarou o fim do homem na carne aos olhos de Deus, pois Cristo, o Santo, tomando o lugar do homem, foi abandonado por Deus. O Senhor Jesus tornou-Se responsável pelo homem e morreu para o pecado. E agora aqueles que se submetem à justiça de Deus, como visto na cruz de Cristo, confiam em Cristo que morreu e ressuscitou. A justiça não poderia ser colocada de lado no caso do homicida para fins de misericórdia, pois as leis de Deus seriam quebradas, Seu governo seria anulado. “Quebrantando [menosprezando – JND] alguém a lei de Moisés, morre sem misericórdia”. Em vão é o pensamento para o pecador de um perdão no dia do julgamento; será que a majestade eterna de Deus poderá ser levianamente menosprezada? Deus declarou que, exceto por Cristo, não há perdão, nenhuma salvação para o homem, e terrível será sua condenação, eterno será o castigo do qual serão considerados dignos, os que presumem alcançar libertação, exceto pelo sangue de Cristo.
Deus separou a cidade de refúgio para o homicida, portanto, sobre os princípios de Seu governo, aquele que entrasse nela estaria seguro. Cristo satisfez abundantemente as reivindicações da justiça de Deus sobre o pecador, de modo que agora a condenação do homem está em rejeitar a Cristo. Deus é ricamente glorificado no sangue de Seu próprio Filho amado, sobre a terrível questão da culpa humana, que, portanto, agora não é mais um obstáculo à misericórdia. Mas, infelizmente, o obstáculo está na dureza do coração humano, que não vem a Cristo para receber vida. Terrível contemplação! Cristo, o Filho de Deus, morreu pelos pecadores e ressuscitou, e Deus oferece a vida eterna, e os homens, embora concordando com esta graça indizível, vivem em seu estado de morte, sem Deus, sem Cristo – e a ira de Deus permanece sobre eles.
A segurança do homicida dentro dos muros da cidade de refúgio dá apenas uma ideia tênue e imperfeita da segurança do crente em Cristo. Ele poderia ter vagado fora dos muros da cidade e sido exposto à destruição imediata. Quando o Sumo Sacerdote morresse, ele deixaria a cidade levita e retornaria para sua própria casa, onde foi exposto ao perigo de cometer uma nova ofensa; mas não há retorno de estar em Cristo. O crente em Cristo é mais do que protegido da vingança, ele é justificado de todas as coisas. Cristo carregou nossos pecados em Seu próprio corpo na cruz, Ele suportou a ira de Deus contra o pecado quando Ele foi pendurado lá; e agora Deus O ressuscitou dos mortos e O exaltou à Sua própria mão direita nos céus. A justiça não pode fazer mais nenhuma reivindicação sobre aqueles que sofreram a penalidade de sua sentença e suportaram sua ira, e isso Cristo fez, e sendo ressuscitado dos mortos não morre mais, a morte não tem mais domínio sobre Ele. Sua perfeita aceitação nos céus é a aceitação do crente, que é aceito n’Ele. Por Ele, Deus pode ser Justo e Justificador de todos os que creem n’Ele. Cristo ressuscitado é a medida da libertação daqueles que confiam n’Ele. Que salvação é essa! O apóstolo ora para que fossem “iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais... qual a sobreexcelente grandeza do Seu poder sobre nós, os que cremos, segundo a operação da força do Seu poder, que manifestou em Cristo, ressuscitando-O dos mortos e pondo-O à Sua direita nos céus” (Ef 1:18-20).
O Cristão, além de ser justificado, também é trazido para um novo estado; ele passou para sempre de uma cidade para outra. Ele foi, pelo poder de Deus, transferido de sua condição anterior como homem em Adão, e é colocado “em Cristo”. A morte é a penalidade da primeira condição. “Em Adão todos morrem”, mas aquele que está “em Cristo, é nova criação; passou o que era velho, eis que se fez novo” (TB). O homicida que entrou na cidade de refúgio não foi transformado, ele estava meramente em um lugar de segurança; o homem em Cristo é uma nova criação. Ele vive diante de Deus em outra existência, distinta daquela vida que, como homem em Adão, ele recebeu das mãos de seu Criador. A vida do Cristão é a do Filho de Deus. Viver em uma nova vida, uma vida que é perfeitamente livre, de acordo com a própria mente e as exigências de Deus, é muito mais do que segurança. Aqueles que estão em Cristo morreram com Cristo, passaram com Ele pela morte e ressuscitaram com Ele. A vingança – toda a ira de Deus contra o pecado – se apoderou do Senhor Jesus quando Ele, na cruz, por Sua própria livre vontade, tomou nosso lugar e penalidade. Sua morte nos ensina a nos considerarmos mortos. Sua vida é a vida do crente. “E o testemunho é este: que Deus nos deu a vida eterna; e esta vida está em Seu Filho”, “e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus”. O crente no Senhor Jesus é, portanto, privilegiado e exaltado. Ele é trazido para perto de Deus além do que Adão no Paraíso conhecia – além do que era conhecido até mesmo pelos anjos eleitos. O homicida entrou na cidade dos levitas, e aqueles designados para ensinar a Israel a Palavra de Deus eram sua companhia contínua; o homem que confia em Cristo é um da família de Deus, um herdeiro de Deus e coerdeiro com Cristo.
Que privilégio e graça sem iguais têm aqueles que estão em Cristo! Que misericórdia e que amor são os de Deus para com o principal dos pecadores! Com que sabedoria Ele transformou as profundezas do pecado e da ruína do homem em uma ocasião para a exibição de Sua glória.
As reivindicações da justiça de Deus tendo sido plenamente atendidas, a justiça divina tendo sido perfeitamente satisfeita, as portas da misericórdia estão agora totalmente abertas e Deus declara Seu próprio caráter de amor; Ele mesmo roga, convida pecadores a serem participantes de Sua graça. Certamente havia uma voz apelando ao homicida, nas portas abertas da cidade de refúgio, e que voz fala agora do céu! O amor agora clama alto do trono da majestade nas alturas. O Senhor Jesus que está assentado ali Se proclama a Si mesmo a Vida para o homem culpado e merecedor do inferno.
As cidades de refúgio foram designadas para aqueles que involuntariamente e sem malícia mataram seus próximos; mas quão diferentes são os termos de nossa salvação! Em inimizade voluntária a Deus, cada pensamento e propósito estando em oposição a Ele, Deus prova o Seu amor por nós pelo dom de Seu próprio Filho.
Aquele que, como um homicida, entrou na cidade de refúgio foi justificado. Tal pessoa aceitou a salvação oferecida e foi salva pela fé. A fé o impeliu para a estrada; a fé o levou para dentro das portas. Mas de que serviria o conhecimento da sentença, o conhecimento do caminho, o conhecimento das portas abertas, se não houvesse, além disso, uma fé pessoal que aplicasse tudo à própria necessidade do homicida?
A Porção do Crente - Josué 21:1-42
“O SENHOR é a porção da minha herança e o meu cálice” (Sl 16:5).
A provisão para a necessidade do homicida sendo totalmente suprida, a herança dos levitas é estabelecida; “à tribo de Levi Moisés não deu herança; o SENHOR, Deus de Israel, é a sua herança”. “Os sacrifícios queimados do SENHOR, Deus de Israel, são a sua herança” (Js 13:33, 14). Assim, embora “espalhados em Israel”, de acordo com a profecia de Jacó, e possuindo apenas um pequeno território, sua herança coroa as bênçãos concedidas a Israel, e brilha mais intensamente do que todas elas.
À tribo de Levi foi confiado o serviço do santuário, a custódia da lei de Jeová e o ensino do coração dos de Seu povo. “Ensinarão os Teus preceitos a Jacó, e a Tua lei a Israel” (Dt 33:10 – AIBB). Eles eram o poder de influência em Israel, e sua influência fluía da proximidade de sua posição com Deus.
Com as bênçãos materiais de Israel diante de nossos olhos – com leite e mel fluindo de sua terra, e alimentada com fontes brotando de vales e colinas – não é difícil discernir a posição peculiar ocupada por Levi. E, espiritualmente entendida, na herança dos levitas vemos a porção mais perfeita do crente; pois enquanto somos abençoados com todas as bênçãos espirituais nos lugares celestiais em Cristo – enquanto temos n’Ele regozijos concedidos a nós para sempre, além de todas as bênçãos que nos são conferidas por meio de Cristo, temos o próprio Cristo. De fato, somos trazidos para as bênçãos do Cristianismo para que possamos nos deleitar em Cristo. Deus nos salvou e nos trouxe para Si mesmo, para nada menos que ser como o Senhor e conhecer como somos conhecidos (1 Co 13:12). Sua graça para conosco alcança até mesmo além da libertação da ira e da entrada na vida; assim, enquanto contemplamos Sua misericórdia – o perdão de nossos pecados, o fim da primeira criação, a morte e ressurreição com Cristo – o Espírito de Deus habitando em nós quer que prossigamos adiante, para que possamos perceber e permanecer em nossa porção agora. “Para conhecê-Lo”, é o objetivo da energia da nova vida. Paulo ansiava tanto por abraçar sua porção que ele teria passado direto desta terra para alcançá-la, pois Cristo em glória era para ele experimentalmente o que Ele é verdadeiramente para todos os crentes, “o prêmio da soberana vocação de Deus”.
Cada evento registrado no Livro de Josué tem uma voz em si mesmo, e também há instrução na ordem em que os eventos são registrados, como na herança de Levi após as cidades de refúgio. Uma ordem semelhante é geralmente encontrada na experiência do povo de Deus, que mais frequentemente aprende sua necessidade de Cristo antes de aprender o que Cristo é para eles. Nossos pecados, a descoberta do “eu”, o aprendizado da justiça divina por Seu Espírito, engrandecem Cristo para nós como nosso Salvador, Aceitação e Vida; mas busquemos prosseguir para conhecê-Lo em Sua própria excelência intrínseca. Não pode ser que alguns, tendo plena certeza de que estão na cidade onde os levitas habitam, usem pouca diligência para obter o gozo de sua herança levita?
O fugitivo da vingança, que entrasse na cidade de refúgio, estaria necessariamente ocupado, a princípio, com sua própria libertação e segurança, e bendiria a Deus fervorosamente por ter Ele mesmo providenciado e separado a cidade para os homens que estivesse em situação igual a sua, e assim – embora de forma correta – o “eu” estaria diante dele; mas o levita que habitava na cidade, e estava à vontade lá, estava lá para que pudesse ser livre para o serviço de Deus; ele era chamado para a associação com Deus, e era para ele considerar as profundezas da Palavra, e ponderar o serviço do santuário. Sabemos mais do que a salvação por Cristo? Estamos, enquanto nos regozijamos com o fugitivo salvo, também aprendendo de Deus como com o levita? E se enquanto bendizemos a Deus pela salvação também estamos nos regozijando em Cristo, em que grau atingimos a plenitude da porção do crente? Encontramos alguns entre os levitas cumprindo um serviço mais santo; alguns manuseando instrumentos mais santos do santuário do que outros; e há graus até mesmo entre aqueles que conhecem Cristo, como sua porção.
Não pode haver outra maneira de aprender Cristo senão pela comunhão com Ele por meio da Palavra. Descobrimos o coração – o caráter – de um amigo terrenal pela intimidade; e na proporção em que sua excelência moral está além de nós, precisamos crescer à estatura dele antes de podermos apreciá-lo. Podemos compreender seus dons, talvez, pois o dom pode ser apreciado em si mesmo ou por sua adaptabilidade às nossas necessidades, mas o motivo e a graça do doador não são tão facilmente descobertos.
Todo o Israel estava diante de Deus em virtude dos sacrifícios, mas somente a tribo de Levi tinha “os sacrifícios queimados do SENHOR, Deus de Israel” como “sua herança”. Podemos ver o amor de Deus em dar Seu Filho para morrer por nós, e ainda assim perder a comunhão espiritual com Ele.
O levita só conseguia ler vagamente os pensamentos de Deus sobre Cristo através das sombras da lei; em nós o Espírito de Deus habita, e nos ensina todas as coisas. O levita foi separado para o serviço do santuário e a contemplação da Palavra de Deus, e esta deve ser nossa obra, pois para isso somos separados por Deus para Ele mesmo. Toda aquela dispensação com a qual o levita estava ocupado expunha Cristo em Sua excelência intrínseca, e como Ele é estimado por Deus em Sua obra para Seu povo. Podemos muito bem desejar o serviço que se liga ao próprio Senhor, e aquela separação que encontra ocupação somente n’Ele.
Quando o Senhor é visto, pela fé, em Sua excelência, a glória de Sua luz ofusca todo o resto. Saulo de Tarso viu Seu rosto eclipsando o brilho do Sol do meio-dia, e dali em diante não vivia mais para a Terra. O Senhor nos céus o instruiu não apenas sobre a glória, mas abriu para ele a maravilha de Seu próprio coração ali. Saulo então considerou todas as coisas como perda por Cristo, e muitos anos depois, como Paulo, ele escreveu: “na verdade, tenho também por perda”; sua mente não havia mudado; ao contrário, deveríamos dizer, sua energia havia aumentado.
Alguém que agora está presente com o Senhor, “ausente do corpo”, observou: “Ao lado da simples, feliz e sincera garantia de Seu amor pessoal por nós mesmos (que o Senhor a aumente em nosso coração!), nada mais nos ajuda a desejar estar com Ele do que a descoberta d’Ele mesmo. Se alguém pudesse falar pelos outros, é isso que queremos, e é isso que cobiçamos. Conhecemos nossa necessidade, mas podemos dizer que o Senhor conhece nosso desejo”.
Quando a herança da tribo de Levi for demarcada, e eles encherem suas cidades e habitarem ali, nada mais restará a ser feito pelo Israel que Deus amou, pelo povo que Ele havia tirado da terra da escravidão para a terra da promessa; e então segue o “descanso”.
Descanso - Josué 21:43-45
“Se Josué lhes houvesse dado repouso, (Davi) não falaria, depois disso, de outro dia. Portanto, resta ainda um repouso para o povo de Deus” (Hb 4:8-9).
O resto aqui falado pode ser tomado em um sentido como a conclusão do livro de Josué. O que se segue, moralmente considerado, dificilmente é um desenvolvimento da história de Israel – certamente não está acontecendo na força do Senhor, mas transmite, em vez disso, um aviso para aqueles que, tendo uma promessa dada a eles de entrar no descanso, parecem ficar aquém dela (Js 22), e uma exortação para aqueles que em espírito entraram no descanso, para permanecerem no poder dele (Js 23-24).
Quando obtemos o Objeto dos nossos desejos, há descanso; o caráter do descanso depende da natureza do desejo.
Em um sentido, Israel entrou em Canaã em repouso – em repouso do julgamento do Egito – da perseguição do destruidor – do deserto. Todas as suas esperanças a respeito da libertação da terra da escravidão, da mão do Faraó, e de alcançar a terra prometida, foram plenamente realizadas. Assim, eles começaram sua luta em Canaã como homens de guerra de Deus e no poder de Sua liberdade; e, tendo travado as guerras de Jeová por muitos anos – como é geralmente entendido, sete anos, o que implica um período perfeito de uma figura terrenal, “a terra repousou” (Js 11). A conquista produziu descanso da guerra; mas como o descanso produzido pela conquista só poderia ser sustentado por vigilância ininterrupta, e eles o perderiam se falhassem em exterminar o inimigo, o repouso não foi completo.
É a porção do Cristão desfrutar do descanso presente por meio da vitória de Cristo sobre o pecado, a morte e Satanás, que é ilustrada no descanso de Israel ao entrar na terra prometida. É a porção do Cristão pela fé constatar uma libertação completa do julgamento do mundo pelo precioso sangue de Cristo, e saber que Cristo, tendo ressuscitado, destruiu o poder da morte e de Satanás, nenhum dos quais agora tem poder sobre Seu povo redimido. O Cristão sabe que já está em Cristo nos lugares celestiais e, no poder desta liberdade e descanso, ele é chamado para lutar contra as hostes espirituais da maldade (o poder da impiedade – JND) nos lugares celestiais sob a bandeira do Senhor ressuscitado. O Cristão também é capaz de desfrutar da paz de seu Siló, de ter momentos de comunhão com o povo de Deus, de adorar com eles, apesar de haver inimigos em sua Canaã espiritual. Mas, embora todas essas bênçãos sejam suas para desfrutar e habitar, ainda assim, enquanto ele ainda está nesta Terra, há um descanso que ele está antecipando, um descanso no qual ele ainda não entrou; o descanso em Deus é sua esperança.
Cada caráter de descanso que Israel desfrutou resultou da fidelidade divina. O descanso que é descrito aqui era de um caráter diferente do que eles tinham desfrutado anteriormente; era o cumprimento de tudo o que Jeová prometeu aos seus pais. Ele antecipa um dia em que, cada inimigo do povo de Deus sendo subjugado, todas as bênçãos que lhes são prometidas em Cristo serão realizadas.
O descanso é incompleto enquanto as bênçãos não são desfrutadas; e antes de ser dito: “E o SENHOR lhes deu repouso”, é dito: “deu o SENHOR a Israel toda a terra que jurara dar a seus pais; e a possuíram e habitaram nela. E o SENHOR lhes deu repouso em redor, conforme tudo quanto jurara a seus pais; e nenhum de todos os seus inimigos ficou em pé diante deles; todos os seus inimigos o SENHOR deu na sua mão. Palavra alguma falhou de todas as boas palavras que o SENHOR falara à casa de Israel; tudo se cumpriu”.
Jeová tinha sido incansável em trazer Israel ao desfrute de sua porção na terra da promessa: Ele desceu para a terra do cativeiro deles; Ele foi afligido lá pelas aflições deles; Ele os resgatou do cativeiro. Tendo-lhes dado o espírito de peregrinos, Ele os guiou como um rebanho através do deserto, onde Ele os alimentou diariamente, foi adiante deles e foi sua retaguarda. Ele curou suas apostasias no deserto e perdoou seus questionamentos de Sua graça. Ele os trouxe através do rio para a terra prometida, lutou por eles, deu-lhes vitória sobre todos os seus inimigos e fez da terra sua possessão. Tudo o que Jeová deu a Israel para antecipar estava agora realmente cumprido para eles.
O Cristão já é abençoado com todas as bênçãos espirituais nos lugares celestiais em Cristo, mas ele é um homem de antecipação: “em esperança, somos salvos”. Se ele não desfrutasse de paz completa e descanso com Deus na obra consumada do Senhor Jesus, ele não poderia esperar por aquilo que o aguarda. No que diz respeito à sua salvação, tudo está completo; o precioso sangue de sua redenção foi derramado há muitos, muitos anos. Ele já entrou em descanso sobre o pecado pela fé naquele precioso sangue, mas, no que diz respeito aos anseios da nova natureza, é, para com ele, ainda antecipação. “a esperança que se vê não é esperança; porque o que alguém vê, como o esperará? Mas, se esperamos o que não vemos, com paciência o esperamos” (Rm 8:24-25).
O Cristão ainda não foi transformado à imagem de Cristo: “agora somos filhos de Deus, e ainda não é manifesto o que havemos de ser. Mas sabemos que, quando Ele Se manifestar, seremos semelhantes a Ele; porque assim como é O veremos” (1 Jo 3:2). Ele ainda não é moralmente semelhante ao Senhor, embora ao contemplar sua glória ele seja dia a dia transformado na mesma imagem de glória em glória, assim como pelo Espírito do Senhor (2 Co 3:18). Ele tem o Espírito de Deus dentro de si, mas está cercado de fraqueza e, com toda a criação gemendo e sofrendo, geme dentro de si, esperando a adoção, a saber, a redenção do corpo (Romanos 8:21-23). Mas a promessa é certa: “assim como trouxemos a imagem do terreno, assim traremos também a imagem do celestial” (1 Co 15:49); e ele está esperando pelo “Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará o nosso corpo abatido, para ser conforme o Seu corpo glorioso” (Fp 3:21). Se for fiel às empatias de Cristo, ele está antecipando o dia de Sua glória. Desejando contemplar Sua glória como quando o Senhor orou ao Pai (João 17:24); esperando com Cristo quando os inimigos de Cristo serão feitos escabelo de Seus pés; esperando pelo dia em que o nome de Jesus será confessado por toda língua, e quando todo joelho se dobrará a Ele e O reconhecerá como Senhor, para a glória de Deus Pai. Ele está antecipando o tempo em que as doze tribos de Israel reconhecerão seu Messias outrora rejeitado, quando o norte e o sul entregarão o povo que agora está nacionalmente morto, quando de sua terra mais uma vez fluirá leite e mel, e brilhará com o favor de Deus, quando os gemidos da criação serão silenciados, e Israel cantará ao seu Senhor: “Então, a Terra dará o seu fruto; e Deus, o nosso Deus, nos abençoará. Deus nos abençoará, e todas as extremidades da Terra o temerão”.
Em uma palavra, o Cristão está esperando tudo o que se resultará para a glória de Cristo, que Sua preciosa morte comprou, e pela qual Ele mesmo espera. “O trabalho da sua alma Ele verá e ficará satisfeito”. Vastas como são as bênçãos presentes do povo de Deus, há anseios de coração a serem satisfeitos; grandes e preciosos como são seu presente desfrute das bênçãos divinas, ainda assim “Porque, agora, vemos por espelho em enigma” – obscuramente – “porque, em parte conhecemos” – “Mas, quando vier o que é perfeito, então, o que o é em parte será aniquilado”.
Nosso descanso atual se assemelha àquele anteriormente falado, que tinha que ser retido por incessante vigilância, em vez do repouso que é retratado aqui. “Portanto, resta ainda um repouso para o povo de Deus”. As lutas externas e internas cessarão em breve; os ídolos e seus nomes não mais serão lembrados. As lutas do pecado e as bofetadas de Satanás têm um fim para o povo de Deus; será dito de todos – dos mais fracos – “todos os seus inimigos o SENHOR deu na sua mão”.
Há um dia para amanhecer (e pode estar às portas!) quando, depois que este mundo e sua concupiscência tiverem passado, será provado que a Palavra do Senhor permanece para sempre; e, descansando no descanso de Deus, o coração responderá ao coração com gozoso louvor – “Palavra alguma falhou de todas as boas palavras que o SENHOR falara... tudo se cumpriu”.
Conveniência - Josué 22
“Os teus olhos olhem direitos, e as tuas pálpebras olhem diretamente diante de ti”.
“A vereda dos justos é como a luz da aurora, que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito” (Pv 4:25, 18).
A história das duas tribos e meia é um aviso aos Cristãos que de bom grado seriam guiados pela conveniência em vez da fé nas palavras da promessa. Ao considerar sua história, a primeira exortação do Senhor, “levanta-te, pois, agora, passa este Jordão, tu e todo este povo, à terra que Eu dou aos filhos de Israel” deve ser mantida em mente; e também que o tabernáculo foi erguido, a lei lida, e o acampamento armado “desta banda do Jordão”.
A história deles ocupa um lugar distinto ao longo do livro de Josué, pois quando Israel cruzou o Jordão, eles já haviam escolhido suas possessões.
Em Números 32 aprendemos por que essas tribos herdaram “do outro lado do Jordão”, e é bom refletir sobre “os começos”. “E os filhos de Rúben e os filhos de Gade tinham muito gado em grande multidão; e viram a terra de Jazer e a terra de Gileade, e eis que o lugar era lugar de gado... Disseram mais: Se achamos graça aos teus olhos, dê-se esta terra aos teus servos em possessão, e não nos faças passar o Jordão”. Deus os enriqueceu grandemente em seu caminho para a terra prometida, e eles preferiram assentar-se e desfrutar de suas riquezas ao invés de avançar para a herança. A conveniência em vez da fé os guiou. As cidades que viram tinham maiores atrações para eles do que as tendas dos soldados do outro lado do rio. Estabelecer-se, qualquer que seja a forma que assuma, é uma coisa triste, mas em quem a vontade da carne não clamou: “não nos faças passar o Jordão”? No entanto, a fé herda “além” e “mais adiante”, em proximidade de Deus.
A alma de Moisés foi agitada dentro dele com a proposta deles, que ele considerava como algo aquém da herança de Deus; ele comparou o desejo deles ao pecado dos falsos espias em Escol, e viu nisso um sinal de que Israel colheria novamente aqueles frutos amargos que lhes foram designados sobre aqueles que desprezassem a terra prometida. Aflito com o espírito deles, ele disse: “ficareis vós aqui? Por que, pois, desencorajais o coração dos filhos de Israel, para que não passem à terra que o SENHOR lhes tem dado?... E eles se aproximaram dele”, e disseram que deixariam suas esposas, filhos e gado para trás, e iriam eles mesmos para a guerra! A conveniência argumenta suavemente e encontra muitas maneiras prontas de atingir seu objetivo; mas é algo pobre lutar as batalhas de Deus a menos que seja somente por Ele; pois onde está o tesouro, aí estará também o coração. Que aqueles que não estão em espírito herdando “além... nem mais adiante”, e que não estão lutando a batalha da fé com todo o coração, considerem o que significa “ficareis vós sentados aqui?” (TB), pois eles não apenas “desencorajam o coração” de seus irmãos por sua busca por conforto, mas eles próprios não estão muito longe de se afastar de Deus.
A mente desses homens estava decidida. “Não herdaremos com eles dalém do Jordão, nem mais adiante; porquanto nós já teremos a nossa herança daquém do Jordão ao oriente”. O coração aos poucos se estabelece em seus desejos e, por fim, expressa abertamente seus desejos; ele resiste a advertências e então se torna resoluto em sua própria obstinação. “Guarda com toda a diligência o teu coração, pois dele procedem as fontes da vida” (TB). Um passo em falso geralmente gera outro – o mal leva ao mal; essas tribos, começando com o espírito de conveniência, acrescentaram à conveniência a obstinação e à obstinação, divisão. Nós “não herdaremos com eles”. Para executar seu propósito, eles estavam preparados para fazer uma brecha em Israel. “Nós” e “eles”, disseram eles, da única família indivisa de Jeová. Jeová havia dado uma herança ao Seu povo, mas eles teriam sua herança, e Israel deveria ter a deles! “Não voltaremos para nossas casas até que os filhos de Israel estejam de posse, cada um, da sua herança”.
Por mais que possamos admirar o zelo dos quarenta mil que, por amor a seus irmãos, lutaram no lado do Jordão que pertencia ao Senhor – e certamente tiveram sua recompensa – não se pode negar que as duas tribos e meia os enviaram para lutar as batalhas do Senhor a fim de conciliar as coisas. “Passaremos armados perante o Senhor para a terra de Canaã, e a possessão da nossa herança deste lado do Jordão será nossa” (Nm 32:32 – JND). Quando um crente barganha para servir a Deus a fim de manter uma posição escolhida por ele mesmo, é certo que ele não fará nem metade do que promete, pois a conveniência é o afastamento de Deus. Em vez de enviar “cada um armado para pelejar para a guerra”, essas tribos enviaram apenas quarenta mil, sendo que muito mais da metade de seus homens de guerra permaneceram para trás para proteger seu tesouro (Veja censo Números 26).
O Senhor tendo agora dado descanso aos irmãos das duas tribos e meia como Ele prometeu, Josué disse a eles: “voltai-vos… à terra da vossa possessão… dalém do Jordão”. E depois de ordenar que guardassem a lei de Deus e fossem fiéis a Ele, ele os mandou embora com bênção. “Voltais às vossas tendas com grandes riquezas, e com muitíssimo gado, com prata, e com ouro, e com metal, e com ferro, e com muitíssimas vestes”. Há uma bênção para qualquer filho de Deus que segue o Senhor com um coração verdadeiro, mesmo que ele o faça apenas por um dia, e deve haver graça suficiente entre seus companheiros para reconhecê-la, mesmo que ele depois se desvie. Mas o afastamento da proximidade de Deus, qualquer que seja o grau, é doloroso, como descobriram os quarenta mil que retornaram dos filhos de Israel de Siló – o lugar de adoração. Em certo sentido, pode ser que o Senhor os tenha aceitado na posição que eles haviam escolhido (Js 22:9). O Senhor não os rejeitou. Ele age em relação ao Seu povo de acordo com Seu próprio padrão de fidelidade. “Ele permanece Fiel”.
Quando esses homens de guerra, que lutaram e suportaram dificuldades com seus irmãos, começaram a retornar à posição que eles mesmos escolheram, não tinham ido muito longe antes de pararem e questionarem entre si. A consciência falou. No entanto, eles não condenaram seu curso e desistiram de voltar; na verdade, o resultado de sua pausa apenas desenvolveu seu espírito original. Eles não adotaram o curso que as nove tribos e meia sugeriram depois. “Passai-vos para a terra da possessão do SENHOR, onde habita o tabernáculo do SENHOR”; mas, ao invés disso, eles “edificaram um altar de grande aparência [para ser visto – KJV]”. “Chegando eles aos limites do Jordão, ainda na terra de Canaã, ali os filhos de Rúben, e os filhos de Gade, e a meia tribo de Manassés edificaram um altar junto ao Jordão”. A visão, não a fé, governou. Seu grande altar não era o altar do Senhor, era apenas uma réplica dele, e seu principal valor estaria em evidenciar que uma vez eles estiveram com seus irmãos em Siló. Se as duas tribos e meia tivessem apenas percebido que demonstravam a insustentabilidade de sua posição “daquém do Jordão”, construindo um altar para testemunhar onde tinham estado, poderiam ter sido poupadas de ir para o cativeiro quando foram. Mas se não pudessem ter “o tabernáculo do SENHOR” exceto indo para “a terra da possessão do Senhor”, estavam determinados a ter sua “herança”. Suas afeições – suas esposas e filhos pequenos, e suas riquezas estavam do outro lado do Jordão, para onde retornaram, e assim eles descobriram, como Moisés os havia avisado.
Talvez no futuro, eles raciocinaram, os filhos das nove tribos e meia possam dizer: “Que tendes vós com o SENHOR, Deus de Israel? Pois o SENHOR pôs o Jordão por termo [fronteira – JND] entre nós e vós, ó filhos de Rúben e filhos de Gade; não tendes parte no SENHOR. E assim bem poderiam vossos filhos fazer desistir a nossos filhos de temer ao SENHOR”. Eles sentiram de forma inconfundível que o Jordão era uma fronteira. Era claro para eles que cruzá-lo parecia ser como deixar o Senhor, com Seu santo tabernáculo e suas bênçãos, e que seu retorno era repleto de perigos, mas ao considerarem o perigo, eles manifestaram o estado da alma deles colocando nos lábios de seus irmãos palavras amargas. Seus irmãos nunca sugeriram divisões entre o Israel de Jeová, nem que o Jordão era uma separação, nem que seus filhos iriam deixar de temer ao Senhor.
O crente que deixa seus companheiros mais devotados por alguma associação mundana, invariavelmente coloca a culpa das consequências sobre aqueles que permanecem com Deus: culpar pessoas piedosas é o remédio usual para uma consciência incomodada. “Amados, se o nosso coração nos não condena, temos confiança para com Deus” (1 Jo 3:21). Altares de “testemunho” – grandes altares para se ver – estão, infelizmente, em muitos corações e associações onde antes havia verdadeira devoção a Cristo. As pessoas falam sobre o que costumavam ser, como serviam a Deus, como desfrutavam de oportunidades de sincera adoração e, pelo sinal do passado, tentam provar sua porção presente. Quem dera tivessem a honestidade de confessar sua falta e retornar à única Fonte de força! O engano do pecado é o que endurece a alma. O espírito de conveniência é totalmente contrário a Deus; no entanto, quem não ouviu seu coração, ordenando-lhe que escolhesse algum lugar fácil e desculpas por permanecer onde não deveria? Temos que aprender que devemos assumir a posição de fé – seja ela qual for – que Deus coloca diante de nós, e recusar os convites de nossas próprias concupiscências, que nos ordenam a nos esforçar para trazer Deus à terra da vista que escolhemos.
Podemos admirar a seriedade das duas tribos e meia quando disseram, se construímos o altar “em rebeldia ou por transgressão contra o SENHOR, hoje não nos preserveis”; e o desejo dos quarenta mil por seus filhos; ainda assim, por que deveria haver o “receio disto” – seu abandono de Deus? Simplesmente porque eles estavam do outro lado do Jordão. Quando começamos a agradar a nós mesmos, não somos bons juízes de nossas ações.
Que coisa pobre era o altar deles! Não era para adoração; eles não queriam “sobre ele oferecer holocausto e oferta de manjares, ou sobre ele fazer oferta pacífica”. Nenhum cheiro suave deveria subir dele, nem corações alegres deveriam cercá-lo. Para que servia então? “Para ser visto”! (KJV)
Quando as notícias do altar de Ede chegaram a Israel, eles se reuniram em Siló – no único altar de Jeová – contemplando na construção de um segundo, nada menos que rebelião contra o Senhor das doze tribos. O zelo de Israel foi despertado, e como quando o coração é zeloso por Deus na contemplação das falhas dos outros, ele se lembra com um espírito castigado de seus próprios pecados, assim “a iniquidade de Peor”, a “transgressão” de “Acã”, com todos os seus frutos amargos, estavam presentes diante deles. Israel, além disso, julgou a si mesmo antes de tentar julgar os malfeitores; eles sentiram que as sementes dos próprios males pelos quais lamentavam, nas duas tribos e meia, e que eles estavam reunidos para erradicar, estavam até mesmo entre eles. Esse é o espírito em que o crente, quando em comunhão com Deus, lamenta a deserção de seu companheiro soldado e trata com o mal. O julgamento deve começar em casa, e quem é inocente? E onde o pecado é uma controvérsia (como era isso na mente de Israel) entre Jeová e seus irmãos, grande será a contrição e quebrantamento de espírito naqueles que têm a graça dada a eles, para serem zelosos pela glória de Deus.
É bom notar o fim, bem como o início do caminho da conveniência. Após o lapso de alguns anos, a prosperidade de Israel, seu Gilgal, foi trocado por Boquim (choro). O triste tempo de declínio nacional havia chegado. Deus, cheio de piedade, levantou juízes para libertar seu povo errante; e naquela época lemos sobre um dia de teste (Juízes 5). Onde estavam as duas tribos e meia então? O grande altar da visão os inspirou à devoção? “Gileade se ficou dalém do Jordão”; permaneceu em casa – na tranquilidade. Quanto às divisões de Rúben, houve grandes pensamentos de coração. Resoluções foram feitas pelos homens de guerra, mas nada foi feito. “Por que ficaste tu entre os currais para ouvires os balidos dos rebanhos?” A flauta dos pastores era preferida à trombeta de guerra. Firme, de fato, deve ser a necessidade que desperta um crente, que busca facilidade, para a ação. Os pés daqueles que preferem o proveito à piedade geralmente trilham o caminho da conveniência até seu triste fim.
Nada além de olhar firmemente para Cristo pode preservar a alma da decadência espiritual. Zelo de outrora, riquezas, despojos, bênçãos, tendo uma vez cercado o altar de adoração – tendo uma vez pisado a terra da herança do Senhor, não valerão. Em um tempo em que tantos se desviam, três vezes felizes são aqueles que herdam “além” e “mais adiante” e que suportam as dificuldades como bons soldados de Cristo.
Mais tarde na história de Israel, encontramos as duas tribos e meia levadas ao cativeiro, e a terra de Gileade perdida de forma irrecuperável (1 Reis 22). “Temamos, pois, que, porventura, deixada a promessa de entrar no Seu repouso, pareça que algum de vós fique para trás” (Hb 4:1).
As Últimas Palavras de Josué - Josué 23-24
As últimas palavras deste servo de Deus possuem uma ênfase peculiar e exigem atenção especial. Quando Israel deu ouvidos às últimas exortações de seu capitão, os privilégios deles tiveram que ser retidos, suas posições mantidas.
Quão diferente era essa exortação daquela dada antes que o Jordão fosse cruzado! O frescor do zelo inicial do povo havia passado, e eles estavam se estabelecendo entre os inimigos de Jeová, apáticos à Sua honra e à integridade de sua própria posição. O fermento das nações ímpias ao redor já estava entre eles, e havia rebaixado seu padrão de separação para Deus, quando Josué os exortou: “não entreis a estas nações que ainda ficaram convosco”. Os deuses destas nações perversas tinham sido permitidos em seu meio, e agora lhes era ordenado: “Não façais menção dos nomes de seus deuses” (ARA); a própria herança era em grande parte povoada pelos inimigos de Jeová. “Vedes aqui que vos fiz cair em sorte às vossas tribos estas nações que ficam desde o Jordão, com todas as nações que tenho destruído”.
O que deveria ser sentido pelo crente como uma palavra terrível, chegou a Israel neste momento. “Se de alguma maneira vos voltardes” (Js 23:12 – TB). Esta palavra agora ocorre pela primeira vez no livro de Josué, mas, o acomodar-se precede o retrocesso, e eles não chegaram ao ponto de precisar de tal aviso de uma hora para outra. Em Jericó, o mal havia entrado em seu arraial; então, com um espírito reto, foi sumariamente julgado, e o arraial purificado. Em Gibeão, uma coisa pior aconteceu, os príncipes desatentos foram enganados numa aliança com os ímpios, da qual não puderam se livrar. Depois, os enfraquecidos homens de guerra de Judá e Efraim toleraram os pagãos entre eles, e finalmente, quando as sete tribos receberam sua herança, foi a terra com seus habitantes também, as “nações que ainda ficaram convosco”.
O que era “voltar?” Era deixar o lugar de separação para Deus. Era entrar em aliança com o mal. Fazer casamentos com as nações e se unir na adoração de seus deuses. Se eles voltassem para o que Deus odiava, Sua força seria tirada deles, e os próprios poderes que eles uma vez venceram se tornariam seus opressores. “Sabei, certamente, que o SENHOR, vosso Deus, não continuará mais a expelir estas nações de diante de vós, mas vos serão por laço, e rede, e açoite às vossas costas, e espinhos aos vossos olhos; até que pereçais desta boa terra que vos deu o SENHOR, vosso Deus”.
Nosso próprio dia é um dia de retorno; retorno ao mundanismo, à superstição, à infidelidade, e às abominações. E. em tempos anteriores. soldados de Cristo derramaram livremente seu sangue para dessas coisas se livrarem a si mesmos, bem como a seus semelhantes e, acima de tudo, o nome do Senhor. A massa de Cristãos está enfraquecida. Há pouco poder para resistir ao mal, embora aqui e ali um espírito nobre se levante. Nossa herança agora está povoada de inimigos, e a principal coisa exigida do soldado de Cristo é que ele se desvencilhe dos inimigos que o cercam; que ele, em espírito e na prática, seja separado para o Senhor. “Temos que lutar... contra principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século [mundo – ARA], contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais”. Mas se houver um desejo de apegar-se “ao SENHOR, vosso Deus”, a promessa ainda está diante de nós, e o crente mais fraco pode provar a fidelidade d’Aquele que a proferiu, “pois o SENHOR, vosso Deus, é Quem peleja por vós, como já vos prometeu” (ARA). Um perseguirá mil; o poder do inimigo não tem importância, pois o Senhor não pode falhar. Um coração para o Senhor foi o remédio colocado diante de Israel – “Portanto, guardai muito a vossa alma, para amardes ao SENHOR, vosso Deus”. A verdadeira devoção a Cristo liberta a alma dos tiranos e a torna vitoriosa sobre a opressão, e à medida que se aprofunda no amor a Ele, obterá maiores vitórias. O Senhor nunca exorta, nunca nos ordena que nos libertemos, sem nos mostrar o caminho da força. Ele não coloca o mal diante de nós, exceto para que, no espírito de julgamento próprio e no poder de Sua força, possamos nos libertar para Ele. Quem dera o povo de Deus, que lamenta o estado dos Cristãos neste dia presente, pudesse “guardar muito a sua alma, para amar ao SENHOR, seu Deus”; cada um então se tornaria um centro de força e uma lâmpada que sustenta as palavras da vida, exibindo o caráter glorioso do Senhor. Permanecer no mal só contamina o espírito; devemos nos dedicar à contemplação do bem. Jericó, Gibeão, as alianças passadas, a condição presente da massa de Israel não poderiam ser mudadas, por mais melancólicas que todas essas coisas pudessem ser. Mas a luz é brilhante, e segura é a promessa ao coração fiel.
Cada crente prontamente colocará seu selo nas seguintes palavras: “vós bem sabeis, com todo o vosso coração e com toda a vossa alma que nem uma só palavra caiu de todas as boas palavras que falou de vós o SENHOR, vosso Deus; todas vos sobrevieram, nem delas caiu uma só palavra”; e também levemos a sério o aviso que se segue, um aviso especialmente adequado “nestes últimos dias” em que há “homens ímpios, que convertem em dissolução [libertinagem – ARA] a graça de Deus” (Jd 4). Pois Deus, Fiel em graça, também é Fiel em repreensão.
Tendo assim advertido o povo, Josué finalmente convocou Israel para Siquém, e “eles se apresentaram diante de Deus”, e ouviram d’Ele como Ele tinha sido sua força, seu apoio, seu escudo, desde o princípio. O Senhor trouxe à lembrança deles Seu propósito para com eles antes que pensassem n’Ele, quando “antigamente” Ele os tirou dos ídolos dalém do rio. Ele os lembrou de sua terra de escravidão, da qual por Sua própria mão eles foram “tirados”, e como Ele os havia guiado através das águas do Mar Vermelho quando seus perseguidores foram derrotados. Ele lembrou Seus caminhos graciosos para eles no deserto – Sua libertação tanto do Rebelde (o Amorreu), quanto do Acusador, “Eu não quis ouvir a Balaão, pelo que, abençoando-vos ele, vos abençoou”. Ele falou a eles sobre Canaã – de suas vitórias, Eu “os dei na vossa mão” – e de suas dádivas, “E Eu vos dei a terra em que não trabalhastes e cidades que não edificastes, e habitais nelas; e comeis das vinhas e dos olivais que não plantastes”. Do começo ao fim, tudo foi obra do próprio Deus por eles, Seu próprio amor por eles, e com Suas misericórdias espalhadas diante deles, foi-lhes dito: “Agora, pois, temei ao SENHOR, e servi-O com sinceridade e com verdade”.
Se Israel tivesse sentido a força das palavras de Jeová, eles teriam se curvado a Ele, lembrando que Ele os havia escolhido, e que sua capacidade de servi-Lo foi dada por Ele; mas, em confiança própria, eles responderam: “também nós serviremos ao SENHOR, porquanto é nosso Deus”, demonstrando, contudo, sua real condição, por não se purificarem de seus ídolos. “Então, Josué disse ao povo: Não podereis servir ao SENHOR, porquanto é Deus santo, é Deus zeloso”, quando eles novamente, corajosamente responderam: “Não; antes, ao SENHOR serviremos”. Diante do novo apelo de Josué para afastar os deuses estranhos que estavam entre eles, e inclinar o coração deles ao Senhor Deus de Israel, a resposta do povo foi: “Serviremos ao SENHOR, nosso Deus, e obedeceremos à sua voz”; mas os ídolos permaneceram entre eles, e as nações ímpias não foram destruídas. Ídolos podem ser trazidos por um crente até mesmo para os lugares santos, e se os ídolos estão no coração, todo o nosso zelo proposto não nos salvará de servi-los. Josué pôde de fato dizer: “porém eu e a minha casa serviremos ao SENHOR”, pois seu coração e vida concordavam com suas palavras, e a graça de Deus estava presente diante de sua alma. Foi pelo velho carvalho ou monumento de Siquém que Josué falou assim; para lá Jacó havia se estabelecido em anos anteriores e enterrado seus deuses domésticos; ali Israel havia estabelecido a lei (Siquém fica entre Ebal e Gerizim); e ali, no fim da vida de seu capitão, eles se levantam, novamente, e prometem obediência ao Senhor. Nós, sem dúvida, temos nossos memoráveis carvalhos de Siquém, onde, em momentos de profunda comoção, honestamente ansiamos por ser tudo para Deus e Seu Cristo. “E Josué escreveu estas palavras no livro da lei de Deus”, e “tomou uma grande pedra e a erigiu ali debaixo do carvalho que estava junto ao santuário do SENHOR. E disse Josué a todo o povo: Eis que esta pedra nos será por testemunho; pois ela ouviu todas as palavras que o SENHOR nos tem dito; e também será testemunho contra vós, para que não mintais [negueis – TB] a vosso Deus”.
“Então, Josué despediu o povo, cada um para a sua herdade”.
“E, depois destas coisas, sucedeu que Josué... o servo do SENHOR, faleceu”. Os anciãos de seu dia cheio de acontecimentos se foram; os ossos de Eleazar foram colocados com os de seu pai Arão, e eles se misturam na sepultura com o pó de José e seu pai Jacó. Os filhos de Hete que venderam, e Abraão que comprou, não são mais ricos por suas trocas. Os primeiros habitantes de Canaã, onde estão eles? A curta história do homem neste mundo perecível é rastreada até a sepultura.
Nosso Capitão entrou nos céus. Ele em breve chamará Seu povo para o alto. A primeira ressurreição pode irromper sobre nós antes que nosso corpo seja semeado na terra. A primavera eterna de Deus pode começar para nós sem que nosso corpo passe pelo inverno frio da morte. “Nem todos dormiremos” (1 Co 15). De sorte que, ou vivamos ou morramos, somos do Senhor. Não vivamos, então, para este mundo, mas para Cristo, a Ressurreição e a Vida.
H. F. Witherby
Comments