Simão Pedro (Maio de 2010)
- Revista O Cristão
- 25 de abr.
- 31 min de leitura
Atualizado: 28 de abr.

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Revista mensal publicada originalmente em Maio/2010 pela Bible Truth Publishers
ÍNDICE
Tema da edição
H. L. Rossier (adaptado)
C. H. Mackintosh, adaptado
W. T. P. Wolston (adaptado)
P. Wilson
J. N. Darby, selecionado
H. L. Rossier
W. W. Fereday
Autor Desconhecido
Simão Pedro

Quando o trabalho sobre um tema começa, às vezes o tema é claramente definido; outras vezes, um assunto geral é considerado, mas no processo de coleta de material, o aspecto do assunto a ser enfatizado se torna mais claro. Quando esta edição começou, o tema em mente era o apóstolo Pedro. Quando terminou, era Simão Pedro. Muitos de nós nos identificamos com Pedro, por causa das lições que ele teve que aprender devido ao seu caráter natural como autoconfiante e impetuoso. Isso parece estar refletido no nome “Simão”. O que o Senhor o chamou para ele ser era “Pedro” e, por meio das lições registradas para nós, vemos que ele gradualmente se torna mais parecido com o caráter de Pedro. A Escritura se refere a ele como Simão Pedro dezesseis vezes, e nem uma vez ele é chamado apóstolo Pedro. Portanto, os autores dos artigos enfatizam mais as lições pelas quais ele passou do que como ele foi usado depois de aprendê-las. Paulo já teve o caráter de um “homem dominador insolente”, mas na escola de Deus ele aprendeu a ser “brando... como a ama que cria seus filhos”. Nós também estamos na escola de Deus aprendendo nossas lições, pois, como Pedro e Paulo, precisamos que nosso caráter seja mudado.
Tema da edição
A História de Simão Pedro
A história de Simão Pedro é profundamente instrutiva e retrata uma visão de todo Cristão, desde o primeiro passo no conhecimento de Cristo até o estado em que o Espírito Santo pode, sem impedimentos, mostrar Seu poder. Durante esse intervalo, toda a energia da graça se revela, conduzindo a alma ao conhecimento de Cristo e dos privilégios Cristãos. Vemos também o quebrantamento da alma, necessário para permitir que o crente, depois de ter perdido a confiança em si mesmo, perceba seus privilégios e siga o Senhor no caminho traçado por Ele.
A história de Pedro na Palavra de Deus se divide naturalmente em duas partes, uma das quais encontramos nos Evangelhos e a outra nos Atos dos Apóstolos. A primeira parte corresponde às verdades mencionadas acima; a segunda é preenchida (embora não sem falhas por parte do instrumento) com a atividade do Espírito Santo no ministério de Pedro, e com esse poder divino que o sustenta como testemunha de Cristo em meio a obstáculos e conflitos.
O primeiro contato
É digno de nota o modo como Pedro entra em contato com o Senhor no evangelho de Lucas. A sogra de Simão (Lc 4:38‑39) estava tomada por uma grande febre que a deixou desamparada. Jesus a cura e a capacita a servi-Lo. É frequentemente assim que a alma encontra Cristo pela primeira vez. Ela entra em contato com Ele por meio das bênçãos que Ele concede aos outros. Quando chega o momento de Ele Se revelar a nosso próprio coração, descobrimos que Ele não é totalmente um estranho. O Senhor usa esse conhecimento preparatório para encurtar o trabalho pelo qual nossa consciência é despertada para um senso de pecado e nosso coração para um senso de graça. Nesse evangelho, Simão Pedro conhecia Jesus por tê-Lo visto em ação em sua casa.
O pescador
O filho de Jonas era pescador em sua profissão; ele possuía o que era necessário para pescar – um barco e redes. Ele os tinha usado para obter o que queria e trabalhou por toda a noite com esse objetivo, mas sem resultado. Assim, o homem natural emprega suas faculdades e os meios colocados à sua disposição para obter algo que encha e satisfaça seu coração. Mas é em vão; a rede permanece vazia. Seu árduo trabalho não produz nada que possa responder à profunda necessidade de sua alma. Simão e seus companheiros, não tendo pescado nada, largaram os barcos e lavaram suas redes. Começaram a lavá-las, pois não haviam pegado nada além da lama do fundo do mar, e quando tivessem terminado, eles recomeçariam a pescar. Não é assim com um homem do mundo? Ele renova seu trabalho para atingir uma meta desejada todos os dias sem sucesso.
Mas quando a impotência do homem se tornou evidente, Jesus aparece, aparentemente não ocupado com Pedro. Ele ensina as multidões, mas no meio de Seu ministério, Seu coração está com Simão, e Ele não o perde de vista. Entrando em um dos barcos, que era o de Simão, Ele pediu-lhe que se afastasse um pouco da terra. Ele separa Pedro da multidão para Si mesmo e, assim, Pedro ouve tudo o que o Senhor diz. Jesus não era estranho a Pedro mesmo antes disso; agora ele ouve Sua palavra, e sua posição de isolamento com Ele contribui para torná-lo ainda mais atento. Mesmo assim, do versículo 5, podemos entender que a convicção da autoridade da Palavra era tudo o que ele havia retido.
Depois disso, encontramos o Senhor mais especialmente ocupado com Pedro. Ele disse a ele: “Faze-te ao mar alto, e lançai as vossas redes para pescar”. Pedro fez isso a noite toda, mas até então isso foi feito pela vontade do homem; agora era pela Palavra do Senhor. Pedro acredita nessa palavra e se submete a ela. O primeiro resultado da Palavra de Deus é produzir fé, e a fé aceita a autoridade da Palavra e obedece. O Senhor falou; isso é suficiente para a fé. Mas Jesus Se dirige a Pedro de uma maneira ainda mais poderosa e lhe mostra na presença de Quem ele está, alcançando assim sua consciência. Ele, o Criador que dispõe de tudo, coleta os peixes em plena luz do dia, quando não havia nenhum durante a noite, e enche a rede de Pedro com eles. Ele enche os vasos humanos de bênçãos tais que eles são incapazes de conter sem que se quebrem e que superam as necessidades do discípulo. Seus companheiros chegam com um segundo barco, que começa a afundar da mesma forma, tão abundantes são as riquezas dadas pelo Senhor da glória.
O pecador
Pedro vê (v. 8) toda essa bênção; isso o coloca pela primeira vez na presença d’Aquele que é a Fonte e o Administrador da bênção. Assim, não é apenas a palavra de Jesus que o atinge, mas o próprio Jesus, e a glória de Sua Pessoa. Uma revolução ocorre em sua alma. A bênção, em vez de produzir gozo, causa convicção de pecado e temor, porque o leva à presença do Senhor da glória. Por outro lado, a percepção de sua condição, ao mesmo tempo em que lhe dá a terrível certeza de que Jeová deveria rejeitá-lo, ainda assim o lança aos pés de Jesus como seu único recurso. Mas o Deus, contra quem ele pecou, perdoa. Deus é conhecido em Seu amor.
É algo bendito que o pecador conheça sua real condição, o julgamento que lhe é devido e a santidade do Senhor. “Senhor, ausenta-Te de mim, que sou um homem pecador”. Pedro se julga pecador e impróprio para a presença de Deus. Ele treme diante de Sua santidade e justiça. Até agora, ele sabe apenas instintivamente o que é a graça, e ele ignora como Deus pode ser justo ao justificar o que crê em Jesus, mas ele está a Seus pés e ele não foge, porque se houver alguma esperança, ela está ali. Enquanto ele estava ocupado em lavar suas redes, ele não conhecia a Deus nem a si mesmo, mas agora conhece a ambos, e é notável que ele não julgue o que ele fez, mas o que ele é. Muitas almas reconhecem que precisam se arrepender de seus atos culpados e julgá-los, mas não foram levadas a ver a fonte desses atos. Debaixo dos pecados, há “um homem pecador”. A percepção da presença de Deus abre nossos olhos, nos mostra o que somos e nos faz ver que nosso único refúgio é n'Aquele que poderia nos condenar.
O seguidor
O temor tomou conta de Pedro, mas o Senhor nunca permite que o temor exista em Sua presença. Ele fala e lança fora o temor, porque Ele é o Senhor da graça. Ele permite que tudo o mais permaneça – não enfraquecendo de maneira alguma os efeitos do trabalho na alma – mas Ele remove o temor. Não, o Senhor não Se afasta dele. Ele diz: “Não temas; de agora em diante, serás pescador de homens”. É como se Ele dissesse: Se Eu não tivesse te encontrado para te salvar, não poderia salvar outros por seu intermédio. Ele faz mais do que fazer Simão Pedro feliz; Ele concede uma nova bênção a ele, prometendo-lhe serviço, para que, em vez de permanecer um pecador, Pedro se torne um servo, capaz de deixar tudo e seguir a Jesus.
Pedro indo a Jesus na água
O primeiro ato de Pedro foi prostrar-se aos pés de Jesus, reconhecendo sua condição pecaminosa. Mais tarde, ele decide sair ao encontro d’Ele caminhando sobre as águas (Mt 14:22-33). É importante observar essa ordem. Sair ao encontro do Salvador vem após a conversão e precede o serviço. Pedro, tendo até então apenas a promessa de ser feito um pescador de homens, já se sentia impelido a ir ao Seu encontro. Ele se virou para olhar Aquele que descia do topo do monte, e este foi apenas o começo das gloriosas revelações que ele receberia sobre a Pessoa de Cristo.
O conhecimento de Pedro a princípio é muito superficial. Ele diz: “Senhor, se és Tu”, mas é suficiente para o começo. Tudo depende, para ele, da identidade da pessoa e, se for Ele, Sua palavra é suficiente para fazer Pedro deixar o barco. Ele diz: “Manda-me ir ter Contigo por cima das águas”. Era uma coisa séria deixar o lugar de aparente segurança para andar onde não havia caminho, mas a palavra de Cristo era suficiente para ele. Ele conhecia seu poder. Sob Sua palavra, ele lançou a rede; Sob Sua palavra ele vai. Isto o capacita a andar sobre a água, assim como o levou a conhecer o Salvador. Ao pedir esse favor, Pedro não pensou em fazer um experimento ou mostrar sua esperteza em superar obstáculos; o que ele queria era ir até Ele. Cristo o atraiu e, no momento, ele não pensou no vento ou nas ondas. Se o coração natural ignora o caminho que leva a Cristo, a fé encontra um caminho em meio a dificuldades de todos os tipos, tanto na noite quanto na tempestade, e as utiliza para se aproximar do Senhor. A fé o leva a deixar o barco, o único abrigo aparente, sem considerar que seja o verdadeiro lugar de segurança, e a alcançar Jesus, cuja presença vale mais para ele do que chegar à outra margem.
Primeira fé e amor
Muitas vezes começamos bem; a primeira fé e o primeiro amor, a simplicidade de um coração preenchido por um objeto nos sustenta e, em seguida, permitimos que os olhos se desviem de seu objeto. Satanás procurou incomodar os discípulos, os deixando com medo de Jesus (v. 26), mas eles logo aprenderam com Seus lábios a ter bom ânimo. Então o inimigo os alarma com dificuldades. Que tolice ouvi-lo, pois as dificuldades não nos levam a Cristo? Pobres criaturas incrédulas que somos! Em nossas provações, assim como em nossas necessidades, a única coisa que esquecemos é a mesma coisa que não devemos perder de vista – o poder divino. Pedro também, depois de sair a Ele, começou a pensar na violência do vento e a se lembrar de suas próprias forças, esquecendo que tinha diante de si um poder de atração mais forte que o poder da gravidade que infalivelmente o levaria a Jesus. E ele começa a afundar.
Quem não esteve, como Pedro, a ponto de afundar? Não compartilhamos todos o mesmo destino? Mas um grito sai dos lábios do discípulo: “Senhor, salva-me!”; ele não diz: “Ausenta-Te de mim”, pois o crente conhece o Salvador e que Seu caráter é salvar. Pedro clama por ajuda, justamente quando está a ponto de alcançar seu objetivo, e Jesus só tem que estender a mão para atraí-Lo para Si mesmo. Um momento mais de fé e o discípulo não teria afundado. Ainda devemos duvidar? Confiemos n’Aquele que é capaz de nos salvar até o fim, pois a tempestade não cessará até que o Senhor e os Seus estejam definitivamente unidos.
H. L. Rossier (adaptado)
Lições de Simão Pedro
Em Lucas 5, o Senhor queria estar um pouco mais afastado da massa do povo para evitar a pressão da multidão e ser capaz de falar melhor com eles. Por esse motivo, entrou no barco de Pedro. Observe a graça moral que brilha aqui. “Ele... pediu-lhe que o afastasse um pouco da terra”, embora Senhor de toda a criação – possuidor do céu e da Terra – Ele, no entanto, como o Homem humilde e gracioso, de maneira cortês reconhece a propriedade de Simão e pede, como um favor, que ele se afaste um pouco da praia. Isso era moralmente amável, e podemos ter certeza de que produziu seu próprio efeito no coração de Simão.
A pesca dos peixes
“E, quando acabou de falar, disse a Simão: faze-te ao mar alto, e lançai as vossas redes para pescar”. Havia poder, assim como graça, na palavra do Senhor! Simão estava prestes a ser bem pago pelo empréstimo de seu barco. Como resultado, nem sua rede nem seus barcos foram capazes de sustentar o fruto do poder e da bondade divinas. “E, vendo isso Simão Pedro, prostrou-se aos pés de Jesus, dizendo: Ausenta-Te de mim, Senhor, porque sou um homem pecador”. Se Simão deve ser chamado de Cefas, ele deve ser completamente quebrantado e levado ao fim de si mesmo. Se ele deve ser usado para pescar homens, ele deve aprender, de uma maneira divina, a verdadeira condição do homem. Se ele quiser ensinar aos outros que “toda a carne é como a erva”, ele deve aprender a aplicação dessa grande verdade ao seu próprio coração.
Mas Jesus nunca poderia Se afastar de um pecador pobre e de coração partido. “E disse Jesus a Simão: Não temas; de agora em diante, serás pescador de homens”. Aqui estava a resposta divina ao clamor de um coração contrito. A ferida era profunda, mas a graça era mais profunda ainda. Simão não foi apenas convencido, mas convertido. Ele se viu como um homem cheio de pecado, mas viu o Salvador cheio de graça; nem era possível que seu pecado estivesse além do alcance dessa graça. Oh, há graça no coração de Jesus, como há poder no Seu sangue, para alcançar até mesmo o principal dos pecadores. “E, levando os barcos para terra, deixaram tudo, e O seguiram”.
Seguindo a Cristo
Como é reconfortante contemplar o estilo decidido de Pedro! Seu começo foi da maneira correta. Ele deixou tudo e seguiu a Cristo. Não houve hesitação aqui, não havia vacilação entre Cristo e as coisas presentes. Barcos, redes, peixes, laços naturais – todos são abandonados sem hesitação e sem reservas, não como uma questão de serviço frio ou serviço legalista, mas como o grande e necessário resultado de ter visto a glória e ouvido a voz do Filho de Deus.
Assim foi com Simão Pedro, no início de sua notável carreira. Tudo foi claro e inequívoco, de todo o coração e decidido, no que diz respeito ao início, e devemos ter isso em mente, ao acompanharmos a sua história posterior. Sem dúvida, encontraremos erros e tropeços, fracasso, ignorância e pecado, mas, por baixo e apesar de tudo isso, encontraremos um coração fiel a Jesus – um coração divinamente ensinado a apreciar o Cristo de Deus.
Erros cometidos
Este é um grande ponto. Os erros podem muito bem ser enfrentados quando o coração bate fiel por Cristo. Alguém comentou que “os que cometem erros são os que fazem todo o trabalho”. Se isso é assim, a razão é que esses que erram têm uma verdadeira afeição pelo seu Senhor, e é exatamente isso que todos nós queremos. Um homem pode cometer muitos erros, mas se ele pode dizer quando é desafiado por seu Senhor: “Tu sabes que Te amo”, ele certamente acabará bem no final, e não apenas isso, mas mesmo em meio aos seus próprios erros, o coração é muito mais atraído para ele do que para um professo frio, correto e elegante, que pensa em si mesmo e procura tirar o melhor proveito dos dois mundos.
C. H. Mackintosh, adaptado
Andando Sobre as Águas
Na primeira parte de Mateus 14, você tem a empatia do coração do Senhor e, em seguida, ao alimentar a multidão, o poder de Sua mão é manifestado. Ele então subiu a um monte para orar. Os discípulos, despedidos ao entardecer, foram enviados a caminho de Cafarnaum, “açoitado pelas ondas” e “fatigavam a remar”, como Marcos 6:48 nos informa. A distância que eles precisavam percorrer era de apenas dezesseis quilômetros, mas haviam passado nove horas cobrindo pouco menos de cinco quilômetros. Fazemos pouco progresso se não temos o Senhor conosco.
Compaixão e poder
O lago de Tiberíades é conhecido por suas tempestades repentinas e violentas, e eles foram surpreendidos por uma delas. Mas em todas as suas dificuldades e perigos, o Senhor mantinha Seus olhos sobre os Seus. Ele estava no monte intercedendo por eles, e na quarta vigília Ele vem a eles. Ele nunca esquece os Seus nas suas dificuldades. Ele “pode socorrer” (Hb 2:18), Ele pode “compadecer-Se das nossas fraquezas” (Hb 4:15), e “pode também salvar perfeitamente” (Hb 7:25). Ele faz todas essas três coisas nesta cena. O fato de que Ele é capaz de “socorrer” é evidenciado no poder divino, quando Ele é visto “caminhando por cima do mar” para socorrê-los – Sua compaixão é revelada em Sua resposta: “Tende bom ânimo, sou Eu, não temais”, enquanto Seu poder de salvar é comoventemente visto em Sua ação para com Pedro, enquanto ele, angustiado, clama: “Senhor, salve-me!” Assim é o nosso Jesus, como agora Ele Se assenta em glória, e esses incidentes terrenais nos dão vislumbres benditos d'Ele.
Fé e amor
Agora, enquanto eles se esforçam, sacudidos pela tempestade e miseráveis, que música há na voz que lhes chega acima da fúria do vento e das ondas, dizendo: “Sou Eu; não temais”. E quando ouviram o timbre de Sua voz, Pedro, sempre enérgico, destemido e cheio de afeição, diz: “Senhor, se és Tu, manda-me ir ter Contigo por cima das águas”. Veja a energia e o amor do coração daquele homem. É muito reconfortante. Você tem o Mestre percorrendo as profundezas tempestuosas e, em resposta à palavra “Vem”, você vê o discípulo imitando seu Mestre, e Pedro, sustentado pelo poder divino, “andou sobre as águas para ir ter com Jesus”. Somente fé e amor agirão assim. É uma ação que o Senhor admira.
Quaisquer que tenham sido os motivos em seu coração, eles certamente parecem estar todos a seu favor. Evidentemente, ele queria estar perto do Senhor, e isso era correto. Cuidado e consideração própria o teriam mantido no barco com seus irmãos. Afeição e fé o levaram a deixar tudo em que a natureza se apoia. Homens com menos zelo e energia teriam poupado a si mesmos de possíveis fracassos e constrangimentos, e diriam: “Vamos apenas esperar onde estamos até que Ele venha a bordo”. Pedro, assegurado de que era seu amado Mestre, e encantado em vê-Lo assim tão superior às águas em que pisava com tanta firmeza, contando também com o Seu amor que gostaria de tê-lo perto de Si, diz em seu coração: “Eu irei me encontrar com Ele, se Ele me permitir”. Fiel ao seu caráter natural de impulsividade desenfreada – pois Pedro não era hipócrita – ele diz: “Senhor, se és Tu, manda-me ir ter Contigo por cima das águas”. Obtendo como resposta a única palavra “Vem”, ele imediatamente obedece. E “descendo do barco, andou sobre as águas para ir ter com Jesus”. Ele estava completamente certo. Ele tinha um mandado divino para agir sobre a palavra “Vem”, e poder divino que ele sabia que não faltaria, já que agora ele estava na presença d'Aquele que só podia ser Deus para andar nas águas tão majestosamente quanto Ele andou.
Com os olhos em Jesus
E, no entanto, descobrimos que Pedro falhou. É verdade, mas por quê? Porque ele agiu de maneira tola ao deixar o barco? Não, pois diz que ele “andou sobre as águas para ir ter com Jesus”. Por um momento, ele foi como seu Mestre. Por que então ele começou a afundar? Porque ele tirou os olhos de Jesus. Enquanto ele mantinha os olhos n'Ele, tudo corria bem; no momento em que sentiu “o vento forte, teve medo”, e afundou. O vento já estava tão forte e as ondas tão agitadas quanto antes de ele deixar o barco. No momento em que ele desceu do barco, era uma questão de Cristo sustentá-lo ou ele se afogaria. Se ele mantivesse os olhos onde ele fixou pela primeira vez, na Pessoa do Senhor, tudo teria corrido bem, mas no momento em que deixou as circunstâncias ao seu redor interferirem entre ele e o rosto bendito do Senhor, ele começou a afundar. Sempre será assim. Enquanto eu mantiver Deus entre mim e minhas circunstâncias, tudo estará bem. No momento em que deixo que as circunstâncias entrem entre meu coração e Deus, tudo está errado, e “começando a ir para o fundo” pode muito bem descrever a situação.
A fé pode andar nas águas mais agitadas quando os olhos estão no Senhor. “Olhando para Jesus” deve ser sempre o lema da alma e o hábito constante do coração, se quisermos trilhar adequadamente esse caminho abençoado de superioridade às circunstâncias. O fracasso de Pedro carrega suas lições para nós, mas acredito que o Senhor valorizou muito o amor que o levou a fazer o que fez. Eu acho que o ponto da passagem não é tanto ele ter fracassado no final, mas sim que ele foi, de fato, imensamente semelhante ao seu Senhor, até o momento quando fraquejou. “Posso todas as coisas n’Aquele que me fortalece” (ARC), disse outro servo em um dia posterior.
O poder de salvar
Mas voltando: “Mas, sentindo o vento forte, teve medo; e, começando a ir para o fundo, clamou, dizendo: Senhor, salva-me!”. Por que ele afundou? A água era um pouco mais instável quando turbulenta do que quando calma? Certamente não. Você não conseguiria andar sobre um lago calmo mais do que sobre um lago com as ondas mais turbulentas que já surgiram, sem o poder divino. O poder de Cristo pode sustentar você e eu nas circunstâncias mais difíceis, e nada além do poder e da graça de Cristo pode nos sustentar nas circunstâncias mais tranquilas. Então, quando Pedro clama, o Senhor “estendendo a mão, segurou-o, e disse-lhe: Homem de pouca fé, por que duvidaste?” Pedro tinha fé, embora fosse pouca.
A graça primorosa de Cristo nesta passagem é incomparável. Pedro falhou completamente em chegar ao seu Senhor, mas o Senhor não deixou de alcançá-lo com tempo de sobra. Seu próprio fracasso o levou aos pés do seu Salvador e, no momento de sua profunda angústia, ele se vê nos braços do bendito Salvador. Seu apelo, “Senhor, salve-me”, foi ouvido e atendido imediatamente. Também podemos testemunhar a terna piedade e o amor compassivo daquele mesmo precioso Jesus, pois “Jesus Cristo é o mesmo ontem, e hoje, e eternamente”.
O Filho de Deus
Assim que o Senhor entrou no barco, o vento cessou, e João 6:21 acrescenta: “e logo [imediatamente – TB] o barco chegou à terra para onde iam”. Quão belo! Quão calmo fica tudo assim que entramos na presença do Senhor! E agora eles O adoram, dizendo: “És verdadeiramente o Filho de Deus”. Pedro O havia reconhecido como Messias em João 1, ele havia aprendido a conhecê-Lo como o Filho do Homem e Senhor sobre os peixes do mar em Lucas 5, e agora, ao contemplar mais das glórias morais de Sua Pessoa, ele recebe outra lição mais preciosa, que Aquele que é o Messias e o Filho do Homem também é o Filho de Deus.
W. T. P. Wolston (adaptado)
“Bem-aventurado és tu, Simão” – “Para trás de mim, Satanás”
As duas partes deste título se destacam no contraste mais nítido possível, embora tenham sido faladas ao mesmo homem pelo mesmo Orador – o Senhor Jesus Cristo – e sejam encontradas apenas a seis versículos de distância em Mateus 16.
“Bem-aventurado és tu, Simão”
Simão Pedro foi declarado “bem-aventurado” depois de ter expressado a maravilhosa verdade sobre a Pessoa do Senhor Jesus. O mundo em geral e até o povo Judeu privilegiado não entendia Quem Ele era. “Ele estava no mundo... e o mundo não O conheceu. Veio para o que era seu, e os Seus não O receberam”. Mas havia um pequeno grupo ligado a Ele – atraído por Sua Pessoa – embora mesmo para eles fosse apenas pela revelação do Pai que eles podiam ver Quem era Aquele glorioso.
A multidão especulava sobre Quem Ele era – um Jeremias, um Elias, um João Batista ou um dos profetas. Quando o Senhor perguntou aos discípulos Quem Ele era, Pedro respondeu: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”, pelo que o Senhor o chama de “bem-aventurado”, pois ele teve o privilégio de receber essa revelação do Pai.
Feliz Pedro! Felizes discípulos! Serem capazes, pela fé, de ver no humilde Jesus, o Cristo – o Ungido de Deus – o Filho do Deus vivo (v. 16). Oh, que nosso coração possa absorver mais de Sua beleza, de Sua glória! Ele preencherá o alcance de nossa ampliada visão no céu; que Ele Se torne cada vez mais precioso para nós aqui – aqui onde Ele ainda é desprezado e onde os homens restringem Sua glória à de um mero homem – um dos profetas.
“Para trás de Mim, Satanás”
Quando chegamos ao versículo 21, o Senhor “começou... a mostrar aos Seus discípulos que convinha... padecer muito... e ser morto”. Isso foi realmente um golpe para eles; eles viram n'Ele o Filho de Deus e o Rei de Deus, mas demoraram a entender Seus sofrimentos e morte. Eles esperavam que Ele tomasse o reino e reinasse, mas antes disso Ele deveria sofrer. Os sofrimentos devem preceder a glória; a cruz deve vir antes da coroa. Era natural que eles recuassem diante da rejeição e do sofrimento por seu Senhor e Mestre, pois, se Ele fosse rejeitado e sofresse neste mundo, eles deveriam receber o mesmo: “não é o discípulo mais do que o mestre, nem é o servo mais do que o seu senhor”.
Tais pensamentos provocaram Pedro a ousar repreender o Senhor e dizer, como diz em uma tradução: “Seja favorável a Ti, Senhor; de modo nenhum isso Te acontecerá” (v. 22 – JND). Bendito Senhor! Ele conhecia a fonte de tais pensamentos; Satanás tinha procurado a Ele antes, no deserto, para afastá-Lo do caminho da dependência e obediência como Homem; agora ele estava usando um dos principais apóstolos para induzir o Senhor a evitar o caminho da reprovação e do sofrimento. O Senhor reconheceu instantaneamente nas palavras de Pedro outro esforço de Satanás e prontamente disse a Pedro: “Para trás de Mim, Satanás, que Me serves de escândalo; porque não compreendes as coisas que são de Deus, mas só as que são dos homens” (v. 23).
Pobre Pedro – pouco antes ele havia sido chamado de “bem-aventurado”, agora é repreendido como sendo o instrumento nas mãos de Satanás. Antes foi o receptor da revelação divina quanto ao Filho; agora é o porta-voz do inimigo. Tal é o homem; não se pode confiar nele. É natural para o coração humano recuar diante da reprovação e do sofrimento, e também buscar honra neste mundo. Quão facilmente a mente de Pedro se ocupava nas coisas dos homens.
E nós, que temos maior luz do que Pedro tinha naquela época, somos tão facilmente influenciados pelas coisas dos homens que nos esquivamos de um pouco de reprovação por Cristo e buscamos parte da honra ou favor deste mundo. Nós às vezes cantamos:
“Adeus, adeus, pobre mundo infiel
Com todo o teu vangloriado tesouro;
Não queremos ter alegria onde Ele teve dor —
Ser ricos onde Ele foi pobre.”
E com que facilidade nos afastamos das expressões de nossos lábios! Às vezes, podemos ser como Pedro, quando ele desfrutou da revelação divina, e nos regozijamos em Cristo Jesus, nosso Senhor, e outras vezes podemos estar profundamente interessados pelas “coisas... que são dos homens”.
Mau conselho
Mais triste ainda! Podemos falar das glórias do Filho de Deus e encorajar outras pessoas em um momento, e em outro, se não estivermos na corrente dos pensamentos de Deus, dar conselhos aos companheiros seguidores de um Cristo rejeitado que serão os conselhos do próprio Satanás. Quão facilmente somos influenciados pelas “coisas... que são dos homens” e podemos ser, por ato ou palavra, o instrumento do mal convencendo um jovem Cristão (ou mais velho) a buscar ganho, posição, honra mundanos ou aplausos do próprio mundo para o qual Cristo morreu; e morreu para nos libertar dele. Que tenhamos mais cuidado em nosso pensamento, para que não seja da filosofia deste mundo – “as coisas... que são dos homens” (Mc 8:33) – e que possamos estar atentos contra dar o conselho de Satanás a um seguidor de um Cristo rejeitado.
Por outro lado, que sejamos cuidadosos ao receber tais conselhos. Que “as coisas que são de Deus” influenciem tanto nosso pensamento que, quando recebemos conselhos para buscar progresso, popularidade, riqueza, posição ou algo assim no mundo, possamos discernir a voz do inimigo. Isso não deve ser interpretado como se um empregado não pudesse aceitar uma posição melhor em seu trabalho, mas, mesmo ao fazer isso, deve primeiro buscar a orientação do Senhor e ponderar as consequências. Pode ser perguntado se poderá cumprir os deveres dessa melhor posição “de todo o coração como ao Senhor” – se haveria certas exigências que ele não poderia cumprir com uma boa consciência. Quanto mais alto subimos no mundo, mais nos aproximamos do seu príncipe. Muitos que seguiam felizes com o Senhor quando em posições mais humildes foram apanhados pelo turbilhão do mundo quando atingiram posições mais altas, para desonra do Senhor e seu prejuízo próprio. Somos responsáveis por nossa conduta e devemos vigiar contra a influência do mundo, mesmo que ela possa vir dos lábios de quem, em outro momento, pode ter emocionado nosso coração ao falar das coisas celestiais e das glórias do Filho de Deus.
O Senhor segue Sua palavra a Pedro com uma palavra a todos os discípulos: “Então disse Jesus aos Seus discípulos: Se alguém quiser vir após Mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-Me. Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, e quem perder a sua vida por amor de Mim, achá-la-á” (Mt 16:24-25).
P. Wilson
Peneirado Como Trigo
Quão bom e precioso é o fato de termos o Senhor, para sempre olhar para Ele, pois, se nossos olhos sempre estivessem fixos no “eu”, não apenas não avançaríamos, mas seríamos completamente desencorajados ao considerarmos o mal que há em nosso interior. Nós nos limitaríamos à ideia do mal e, assim, nos privaríamos da força que pode vencê-lo.
A natureza da carne e a cegueira do coração do homem são dignas de observação. Que coisas tolas se interpõem entre Deus e nós, para esconder de nós aquilo que deveríamos ver! Quão estranhamente, também, os pensamentos do coração natural seguem seu curso natural (mesmo quando o Senhor está perto de nós) e nos privam da consciência das coisas mais marcantes! Encontramos isso apresentado neste caso de Pedro.
“Simão, Simão, eis que Satanás vos pediu para vos cirandar como trigo; Mas Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça” (Lc 22:31-32). Ele não diz: “Não serás tentado; Impedirei Satanás de te peneirar”; não, Ele não faz isso. Vemos aqui que Deus muitas vezes deixa Seus filhos na presença de seu inimigo, mas, mesmo estando assim na presença do inimigo, Ele cuida dos Seus, como vemos em Apocalipse 2:10: “Eis que o diabo lançará alguns de vós na prisão, para que sejais tentados… Sê fiel até à morte, e dar-te-ei a coroa da vida”.
Pedro poderia ter dito ao Senhor: “Tu podes impedir que eu seja assim peneirado”, assim como Marta e Maria pensaram que Jesus poderia ter impedido a morte de Lázaro, e, verdadeiramente, Aquele que pode dar a coroa da vida pode nos proteger, mas Ele não faz isso, mas permite que sejamos provados. Satanás desejou ter Jó para peneirá-lo como trigo, e Deus permitiu que ele o fizesse, e isso também acontece conosco. Muitas vezes dizemos no nosso interior: Por que Ele agiu assim comigo? Por que Ele me colocou nessa ou naquela prova severa? Ah, foi Satanás quem desejou, e Deus Quem permitiu. Muitas vezes ocorrem coisas que não conseguimos entender; essas coisas são destinadas a nos mostrar o que é a carne.
O desejo de Satanás, o cuidado do Senhor e o poder de Pedro
Quando Deus está prestes a usar um Cristão em Sua obra, Ele toma aquele que foi o mais longe no caminho da provação. Assim, aqui é dito: “Satanás vos pediu para vos cirandar como trigo”. O perigo é apresentado a todos, mas Ele acrescenta, falando a Pedro: “Eu roguei por ti”, por ti em particular, porque Jesus o distingue de todos os demais porque ele havia assumido uma posição mais proeminente do que os outros, e, assim, ele estava mais exposto, embora todos tenham sido peneirados na morte de Jesus.
O Senhor então diz a Pedro: “E tu, quando te converteres, confirma teus irmãos”. Ele não iria poupar nenhum de seus discípulos de ser peneirados, mas Pedro seria o mais severamente provado e, portanto, o mais apto para fortalecer seus irmãos. Apesar de tudo isso, Pedro está cheio de confiança própria. “Senhor, estou pronto a ir Contigo até à prisão e à morte”. Mas Jesus responde: “Digo-te, Pedro, que não cantará hoje o galo antes que três vezes negues que Me conheces”.
A carne agindo em Pedro tinha apenas o poder de levá-lo até o momento da provação, e ali falhou, pois Pedro negou o Senhor Jesus, mesmo em Sua própria presença. Ele poderia ter visto seu Salvador, se seu coração não tivesse se desviado d’Ele. Jesus estava olhando para ele, e mesmo assim ele o negou à criada, dizendo: “mulher, não O conheço”. Pedro havia sido avisado, mas o Senhor não permitiria que ele fosse mantido pelo poder divino naquele momento, porque ele precisava aprender por experiência o que ele era em si mesmo.
Se notarmos tudo o que Cristo fez, veremos como Ele estava atento a Pedro, naquele momento; Sua graça, por assim dizer, saiu ao seu encontro e cuidou dele durante toda a tentação. A primeira coisa que Jesus lhe diz é que Ele orou por ele. Não foi que o arrependimento de Pedro levou à intercessão de Jesus, mas a intercessão de Jesus produziu o arrependimento em Pedro. “Eu orei por ti” e “Jesus... olhou para Pedro”. Quanto a Judas, ele negou o Senhor e, quando sua consciência foi despertada, ele se matou. Assim que o crime foi cometido, toda a confiança fugiu e ele se matou. Mas, aqui, o efeito da oração de Jesus foi preservar a fé no fundo do coração de Pedro, de modo que, quando Jesus olhou para ele, ele foi quebrantado.
A primeira coisa a observar é que o Senhor havia orado por Pedro, e a segunda, que Ele sempre Se lembrava de Seu discípulo, e assim que o galo cantou, Jesus olhou para ele, e Pedro chorou amargamente. É dessa maneira que o Senhor trata conosco: Ele ora por nós e permite que entremos em tentação. Se Ele nos conduz quando estamos nela, também nos exorta a orar para que não entremos em tentação, mas Deus permite tudo isso porque Ele vê o fim dela. Se Pedro tivesse consciência de sua própria fraqueza, não ousaria se mostrar diante do sumo sacerdote. Essa provação foi a consequência natural do que ele era na carne, mas era o propósito de Deus usá-lo e até colocá-lo em uma posição de destaque em Sua obra. A causa de sua queda foi a confiança própria; a carne estava presente ativamente.
A peneiração
Deus fez tudo bem para ele, e Pedro viu qual era o poder da peneiração de Satanás. Os outros discípulos, não tendo a mesma força carnal, fugiram imediatamente. Eles não tinham tanta confiança quanto Pedro, mas Deus o deixou lutar contra Satanás, e Jesus orou por ele, apesar de sua queda, para que sua fé não desfalecesse. No momento em que Pedro caiu, os olhos de Jesus Se voltaram para ele. Aquele olhar não dava paz, mas confusão de rosto; Pedro chorou; ele saiu e estava tudo acabado. Ele havia aprendido o que ele era. Houve seu fracasso; o pecado foi cometido e não pôde ser desfeito; poderia ser perdoado, mas nunca apagado [da memória de Pedro]. Pedro não podia esquecer que havia traído o Senhor, mas Jesus fez uso dessa queda para curá-lo de sua presunção.
É o mesmo conosco. Muitas vezes cometemos falhas que são irreparáveis, por causa de uma excessiva confiança na carne. Quando não há possibilidade de corrigir as falhas, o que deve ser feito? O único recurso é se lançar na graça de Deus. Quando a carne é muito forte, Deus geralmente nos permite cair, porque não estamos nesse precioso estado de dependência que nos preservaria.
A consciência e o coração
Quando Deus prova o coração dessa maneira, Ele às vezes o deixa nas mãos de Satanás, mas nunca deixa a consciência de Seus filhos nas mãos do inimigo. A consciência de Judas estava nas mãos de Satanás e, portanto, ele se desesperou. O coração de Pedro esteve em suas mãos por um tempo, mas sua consciência nunca. Portanto, em vez de se desesperar, como Judas, o amor de Jesus, expresso em um olhar, tocou o coração de Pedro.
Então a graça age no coração; ela dá a consciência do pecado, mas, ao mesmo tempo, o amor de Cristo alcança a consciência, aprofundando a consciência do pecado, mas se essa é profunda, é porque a consciência do amor de Cristo também é profunda. Por mais perfeito que fosse o perdão de Pedro, ele nunca poderia esquecer seu pecado. Não apenas ele foi totalmente perdoado, mas sua consciência estava nas mãos do Senhor quando o Espírito Santo revelou a plenitude do coração de Jesus para ele. Sua consciência estava tão completamente purificada que ele poderia acusar os judeus do próprio pecado que cometera sob as circunstâncias mais solenes. “Mas vós negastes o Santo e o Justo” foram suas palavras. O sangue de Cristo havia purificado completamente sua consciência, mas se a questão de sua força na carne fosse levantada, tudo o que ele tinha a dizer era: eu neguei o Senhor e, se não fosse por Sua pura graça, eu não poderia sequer abrir minha boca.
Amor e autoconfiança
Jesus nunca censurou Pedro com seu pecado naquelas conversas que teve com ele. Nunca há a pergunta: por que você Me negou? Não; Ele não o lembra nem uma vez sequer de seu fracasso. Pelo contrário, Ele age de acordo com a expressão de amor do Espírito Santo: “de seus pecados e de suas prevaricações não Me lembrarei mais”. Jesus havia esquecido tudo. Mas havia uma coisa que Ele tinha para mostrar a Pedro; era a raiz do pecado, o ponto em que ele havia falhado. A tentação de Satanás, juntamente com sua própria falta de amor, foi a causa de sua queda e destruiu sua confiança própria, mas agora, com sua consciência sendo tocada, era necessário que sua inteligência espiritual fosse formada. Pedro se vangloriou de ter mais amor por Jesus do que os outros, e Pedro foi o que mais falhou dentre todos.
O Senhor lhe disse: “Amas-Me mais do que estes?” Onde está agora a confiança própria de Pedro? Jesus repete três vezes: “Amas-Me?” Mas Ele não o relembra de sua história. A resposta de Pedro é: “Senhor, Tu sabes todas as coisas, Tu sabes que eu Te amo”. Ele apela a Jesus e ao Seu conhecimento divino; “Tu sabes que eu Te amo”. Isso foi o que Jesus fez por Pedro, e isso depois da queda dele.
Confiança em Jesus
Jesus havia predito o fracasso de Pedro, e aqui Ele lhe perguntou: “Amas-Me mais do que estes?” Pedro não pode dizer nada, exceto que ele aprendeu sua fraqueza e que amou Jesus menos que os outros discípulos. O relacionamento entre Jesus e Pedro é inteiramente em graça; ele não tinha nenhum recurso, exceto confiar em Jesus, e agora ele poderia ser uma testemunha d’Ele; ele sentiu o poder de um olhar de Jesus.
Pedro parece dizer: “eu confio em Ti; Tu sabes como te neguei; faça comigo o que parece bem”. Então, vemos Jesus sustentando o coração de Seu discípulo, para que Satanás não lhe roube sua confiança. Ele disse: “quando te converteres, confirma teus irmãos”. O que o capacitou a fortalecer seus irmãos? Sua negação havia ensinado tanto a ele o que era a carne que ele já não se apoiaria em si mesmo para mais nada; ele sabia que não tinha outra coisa a fazer senão confiar em Deus. Qualquer que seja sua incapacidade de resistir a Satanás, ele poderia apelar para a graça d’Aquele que conhece todas as coisas. Saber que ele podia confiar em Jesus era aquilo que o tornava forte. Foi depois de lembrar a Pedro da total incapacidade da carne que o Senhor lhe confiou Suas ovelhas: “Apascenta os Meus cordeiros”, e só então foi que ele pôde fortalecer seus irmãos.
A carne tem uma certa confiança em si mesma, e essa é frequentemente a loucura em que caímos. É então necessário que conheçamos a nós mesmos pelo conflito com Satanás; todo Cristão precisa aprender o que ele é por meio das circunstâncias em que é colocado. Deus nos deixa ali para sermos peneirados por Satanás, para que possamos aprender sobre nosso próprio coração. Se tivéssemos humildade e fidelidade suficientes para dizer, eu não posso fazer nada sem Ti, Deus não nos deixaria nesta triste experiência de nossa fraqueza. Quando estamos realmente fracos, Deus nunca nos deixa, mas quando estamos inconscientes de nossas fraquezas, precisamos aprendê-las por experiência.
O resultado final
Tudo isso deve nos ensinar a nos humilharmos sob a poderosa mão de Deus, para que Ele nos exalte no devido tempo. Devemos aprender a nos entregar à Sua mão poderosa, até que Ele nos exalte. Que Deus nos faça conhecer apenas a Ele. Se tivéssemos que apenas aprender o que somos, ficaríamos abatidos e afundaríamos no desânimo, mas Seu objetivo ao nos dar um conhecimento de nós mesmos e de Sua graça é nos dar um fim esperado. Alguém então pode dizer: “Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na Casa do SENHOR por longos dias”.
J. N. Darby, selecionado
Serviço e Comida
Depois das tantas experiências, parecia que Pedro agora estava qualificado para o serviço. Ele saiu, seguido por seis outros discípulos, para pescar no mar de Tiberíades. O que caracterizou esse empreendimento foi o fato de Pedro ter tomado a iniciativa de começar a trabalhar para obter os resultados de seu esforço. Foi em vão, e a noite passou antes que ele e seus companheiros vissem seus esforços coroados com algum sucesso. Pedro empregou os mesmos meios que usou em uma ocasião correspondente, anterior à sua conversão. Quantas vezes quando Deus nos confia um serviço ativo, nós o fazemos como homens na carne, e nosso trabalho é estéril? É importante entender que, no ministério, tudo, absolutamente tudo, deve ser de Deus e nada do homem.
O lado direito
A cena mudou assim que Jesus Se apresenta na praia; Sua presença inaugurou o amanhecer de um dia de bênção. Sua presença era o que era mais necessário. Enquanto eles haviam trabalhado duro sem Ele, seus esforços foram infrutíferos. Era o amanhecer quando essa cena aconteceu. Há um momento especial determinado por Deus para o serviço, e os discípulos, indiferentes a isso, perderam seu tempo durante toda a noite. Eles encontraram o peixe no lado direito do barco, em um lugar especial conhecido apenas por Jesus, e Pedro teve que confiar nesse conhecimento antes que sua atividade pudesse ser coroada de sucesso. Os discípulos lançaram a rede de acordo com Sua palavra, não tendo mais nada em que confiar, e capturaram 153 grandes peixes; suas pescarias neste local foram encerradas com um número determinado e conhecido apenas pelo Senhor. A partir desse momento eles tinham algo mais a fazer; eles trouxeram o resultado de seu trabalho para Jesus (v. 10). Eles não pescaram para si ou para os outros, mas somente para o Senhor.
Oh, que o nosso coração possa aprender essa lição! Será que nossa vida consiste em uma longa noite de atividade humana dirigida pela vontade do homem, ou se assemelha a uma aurora iluminada pela presença do Senhor? Vemos nossas redes cheias porque trabalhamos em dependência d'Ele?
Quanto à comida, Jesus estava em pé na praia e disse: “Filhos, tendes alguma coisa de comer? Responderam-Lhe: Não”. Sem dúvida, eles pensaram que esse Estranho, a quem ainda não haviam reconhecido, estava precisando de comida. Mas a pergunta os forçou a afirmar que até agora todo o seu trabalho não havia dado nada a Cristo. Depois vieram as palavras: “Lançai a rede”. Era como se Ele lhes dissesse: “Se quiserdes dar-Me algo, deveis recebê-lo de Mim”. A partir desse momento João, o discípulo a quem Jesus amava, não podia mais estar enganado, pois para ele o Senhor era Aquele que dava e a Quem nada era dado.
Trabalho
Aqui outro ponto aparece; os próprios discípulos não tinham nada para comer. O trabalho não alimenta; ele provoca fome. Mesmo um trabalho frutífero, uma pesca milagrosa, deixou os discípulos muito famintos. Quantas almas existem nos dias atuais de atividade que permanecem infrutíferas apesar de todo o seu trabalho, porque se iludem quanto ao proveito espiritual que sua atividade traz à sua vida espiritual! Não foi no mar em meio a todo o esforço e agitação ao redor, mas na costa onde tudo estava quieto, quando os discípulos ouviram o Senhor lhes dizendo: “Vinde, jantai”. A refeição não foi preparada inicialmente com peixes retirados da rede, mas fornecida pelo próprio Senhor, que a distribuiu a eles. Eles se alimentaram do resultado da obra de Cristo – do que somente Ele havia feito por eles.
Que assim seja conosco, amados. Quando tivermos levado o resultado do nosso serviço ao Senhor, para que Ele faça com isso o que achar melhor, assentemo-nos, convidados por Ele, para nos alimentarmos d’Ele no retiro da praia.
Voltemos à santa Palavra que revela Cristo, não apenas para os outros, mas, acima de tudo, para nós mesmos. Depois de ter se alimentado, Pedro foi conduzido um passo adiante em seu serviço e foi capacitado a alimentar os cordeiros e ovelhas do Senhor.
H. L. Rossier
Restauração
Três etapas marcam a restauração de Pedro pelo Senhor: Sua oração, Seu olhar e Sua Palavra (Lc 22:31‑34; 22:61‑62; Jo 21:15-19). Assim, restabelecido na confiança de Seu Mestre e mais uma vez incumbido de uma missão em Seu serviço, Pedro estava pronto, quando o Espírito Santo desceu do céu, para desempenhar seu papel específico no grande empreendimento da graça que chamamos de Cristianismo. Ninguém é competente para servir nosso Senhor Jesus Cristo, se não houver trilhado o caminho de Pedro. Primeiro, é preciso nascer de novo pela ação vivificante do bendito Espírito de Deus, tendo seus pecados perdoados em virtude do sangue expiatório do Salvador, e sua confiança própria tão despedaçada que, dali em diante, nenhum poder operará dentro dele, senão o do Espírito divino.
W. W. Fereday
Jesus nos Chama
Jesus nos chama sobre o tumulto
Do mar bravio e inquieto da nossa vida;
Dia após dia soa Sua doce voz,
Dizendo: Cristão, segue-Me!
Jesus nos chama da adoração
Do vão estoque de ouro do mundo;
De cada ídolo que nos retém,
Cristão, Me amas mais que a tudo?
Em nossas alegrias e em nossas dores,
Nos dias de labuta e nas horas de paz,
Ainda Ele chama, em cuidados e prazeres:
Me amas mais do que a todos esses?
Jesus nos chama — por Tuas misericórdias,
Salvador, que ouçamos Teu chamar;
Dá-nos corações prontos à obediência,
Para amar e servir-Te acima de tudo!
Autor Desconhecido
“E disse Jesus a Simão: Não temas; de agora em diante, serás pescador de homens”
Lucas 5:10
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