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Glória Moral do Senhor Jesus Cristo - Parte 3/3

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Uma Breve Meditação Sobre a Glória Moral do Senhor Jesus Cristo

John Gifford Bellett

 

Parte 3


Mas ainda mais, em certo sentido, o próprio estilo e espírito desse relacionamento com Seus discípulos durante aquele intervalo de quarenta dias ainda é o mesmo. Ele os conhece pelo nome, como antes. Ele Se manifesta a eles da mesma maneira. Ele era o anfitrião da mesa, embora estivesse ali apenas como convidado, uma segunda vez, tanto antes como depois de Sua ressurreição (João 2; Lucas 24); e na profunda percepção e apreensão de alma, eles tratam a presença d’Ele da mesma forma.

 

Ao retornar a Ele junto ao poço de Sicar em João 4, eles não se intrometeram, mas caminharam silenciosamente. E assim, ao alcançá-Lo após a pesca, em João 21, eles caminharam silenciosamente de novo, julgando pela segunda vez pelo caráter do momento, para que suas palavras fossem poucas, embora o coração deles estivesse cheio de admiração e gozo.

 

Que laços, ternos e ao mesmo tempo fortes, são assim formados entre Aquele que já conhecemos nas caminhadas diárias da vida humana, e Aquele que será conhecido por nós para sempre. Ele desceu primeiro às nossas circunstâncias e então Ele nos leva às Suas. Mas nas nossas circunstâncias nós temos aprendido d’Ele, e aprendemos d‘Ele para sempre. Esta é uma verdade muito feliz. Pedro testemunha isso para nós. Já olhei para esta cena com outra intenção. Devo agora olhá-la uma segunda vez.

 

Na pesca dos peixes em Lucas 5, ou antes da ressurreição, Pedro foi convencido. O pescador Pedro, aos seus próprios olhos, tornou-se o pecador Pedro. “Senhor, ausenta-Te de mim, por que sou um homem pecador”. A quantidade de peixes (dando prova de que o Estranho que pediu-lhe o barco emprestado era o Senhor da plenitude do mar) trouxe Pedro, em espírito, à presença de Deus, e aí ele aprendeu o que ele era. Na verdade, nunca aprendemos essa lição em qualquer outro lugar. Mas o Senhor naquele momento, como que da glória, falou confortavelmente com Pedro. Ele disse: “Não temais”, e Pedro ficou à vontade. A glória ou a presença de Deus agora tinha uma morada para ele, bem como uma convicção, e Pedro está em plena quietude de coração diante do Senhor. E, consequentemente, na segunda grande pescaria, em João 21, após a ressurreição, Pedro ainda estava à vontade e só tinha que praticar a lição que já havia aprendido. E ele faz isso. Ele experimenta a presença do Senhor da glória como uma morada para ele. Ele prova em si mesmo e nos dá testemunho de que o que aprendeu de Jesus, tinha aprendido para sempre. Ele não sabia que o Estranho na praia era Jesus; mas quando João lhe revelou esse fato, o Estranho não era mais um estranho para ele, mas quanto mais cedo e mais perto ele pudesse chegar d’Ele, melhor.

 

Que consolo adicional é este! Se é um gozo saber que Ele é o mesmo, seja aqui ou lá – seja em nosso mundo ou em Seu próprio mundo – em nossas circunstâncias arruinadas, ou em Suas próprias circunstâncias gloriosas – que gozo adicional é ver um de nós mesmos, como Pedro, experimentando a bem-aventurança de tal fato em seu próprio espírito!

 

Jesus – o mesmo, de fato – Fiel e Verdadeiro! Todas as promessas que Ele lhes fez antes de sofrer, Ele cumpre depois de ressuscitar: todo o caráter que Ele sustentou no meio deles, Ele sustenta agora.

 

O Senhor estava continuamente dando a outros, mas raramente concordava com outros. Ele fez grandes comunicações onde encontrou pouca comunhão. Isso magnifica ou ilustra Sua bondade. Não havia, por assim dizer, nada que O atraísse, e ainda assim Ele estava sempre dando. Ele era como o Pai que está nos céus, de Quem Ele mesmo falava, fazendo nascer o Seu Sol sobre maus e bons, e enviando a Sua chuva sobre justos e injustos. Isto nos diz o que Ele é, para Seu louvor – o que nós somos, para nossa vergonha.

 

Mas Ele não era apenas assim, como o Pai no céu, o reflexo de tal Pessoa em Suas ações, mas também estava neste mundo como “o Deus desconhecido”, como fala Paulo. As trevas não O compreenderam; o mundo, nem pela sua religião nem pela sua sabedoria, O conheceu. A rica abundância de Sua graça, a pureza de Seu reino, o fundamento e o título sobre os quais a glória que Ele buscava em um mundo como este só poderia repousar, eram todos estranhos aos pensamentos dos filhos dos homens. Tudo isso é visto nos profundos erros morais que eles estavam continuamente cometendo. Quando, por exemplo, a multidão aclamava com grande entusiasmo o Rei e o reino em Sua Pessoa, em Lucas 19: “Mestre, repreende os Teus discípulos”, dizem os fariseus. Eles não tolerariam a ideia de o trono pertencer a Alguém assim. Era presunção n’Ele, Jesus de Nazaré como era, permitir que a alegria real O cercasse. Eles não sabiam – não tinham aprendido – o segredo da verdadeira honra neste nosso mundo falso e caído. Eles não aprenderam o mistério da “Raiz de uma terra seca”, nem perceberam em espírito “o braço do SENHOR” (Is 53). Foi para onde o seu próprio Espírito O conduziu, que foram feitas descobertas sobre Ele, e essas são muito doces e também variadas em sua medida.

 

Em Marcos 1, Seu ministério, em Sua graça e poder, é usado por muitos. Pessoas com todos os tipos de doenças vêm até Ele, as multidões O ouvem e reconhecem a autoridade com que Ele falou. Um leproso traz diante d’Ele a sua lepra, apreendendo-O assim como o Deus de Israel. Em diferentes medidas, havia então algum conhecimento d’Ele, seja quanto a Quem Ele era, ou o que Ele tinha; mas quando entramos em Marcos 2, recebemos conhecimento d’Ele Se expressando numa forma mais brilhante e mais rica: temos amostras da fé que O compreendeu; e esta é a coisa mais profunda.

 

O grupo de Cafarnaum, que traz até Ele seu amigo paralítico, O entende e também usa d’Ele; quando digo “O entende” quero dizer, em Si mesmo, em Seu caráter, nos hábitos e gostos de Sua mente. O próprio estilo com que eles O alcançam nos diz isso. Não é uma aproximação como se estivessem com reservas, duvidosos e intimidados. Era mais: “Não Te deixarei ir, se não me abençoares” – algo mais bem-vindo para Ele, mais de acordo com o caminho que o amor nos faria seguir. Não pedem licença, não fazem cerimônia, mas descobrem o telhado da casa para que pudesse alcançá-Lo; tudo isso nos dizendo que eles O conheciam e também usavam d’Ele; eles sabiam que Ele Se deleitava em ter Sua graça confiada e Seu poder usado em nossas necessidades sem reservas. Então Levi, logo depois, no mesmo capítulo, faz um banquete e acomoda publicanos e outros, em companhia de Jesus. E isso, da mesma maneira, nos diz que Levi O conhecia. Ele sabia a Quem hospedava, como Paulo nos diz que sabia em Quem ele havia crido.

 

Este conhecimento do Senhor é verdadeiramente abençoado! É divino! Carne e sangue não nos dão esse conhecimento; seus parentes não o tinham. Disseram d’Ele, quando estava Se dedicando ao serviço: “Ele está fora de Si”. Mas a fé faz grandes descobertas sobre Ele e age de acordo com essas descobertas. Às vezes, pode parecer que nos leva além dos limites devidos, além das coisas que são ordenadas e bem medidas; mas na estima de Deus isso nunca acontece. A multidão diz a Bartimeu para se calar, mas ele não o faz; pois ele conhece Jesus como Levi O conhece.

 

É para a sua obra completa que não estamos preparados, mas é aí que reside a glória dela. Ele nos atende em todas as nossas necessidades, mas, ao mesmo tempo, traz Deus à questão. Ele curou os enfermos, mas também pregou o reino. Isto, porém, não agradou ao homem. Isto pode parecer estranho, pois o homem sabe muito bem como valorizar as suas próprias vantagens. Ele conhece o regozijo da natureza restaurada. Mas tal é a inimizade da mente carnal contra Deus, que se a bênção vier em companhia da presença de Deus, ela não será bem-vinda. E de Cristo a bênção não poderia vir de outra forma. Ele glorificará a Deus e também aliviará o pecador. Deus foi desonrado neste mundo, assim como o homem foi arruinado nele – arruinado por si mesmo; e o Senhor, o Reparador da brecha, está fazendo uma obra perfeita – vindicando o nome e a verdade de Deus, declarando Seu reino e Seus direitos e manifestando Sua glória, tanto quanto Ele está redimindo e vivificando o pecador perdido e morto.

 

Isto não servirá para o homem. Ele quer cuidar bem de si mesmo e deixar a glória de Deus acontecer como puder. Assim é o homem. Mas quando, pela fé, algum pobre pecador pensa de forma diferente e pode realmente se regozijar na glória de Deus, muito bela é a visão. E vemos isso na mulher siro-fenícia. A glória do ministério de Cristo dirigiu-se à sua alma de forma brilhante e poderosa. Aparentemente, apesar da dor dela, o Senhor Jesus afirma os princípios de Deus e, como um Estranho, passa por ela. “Não fui enviado”, diz Ele, “senão às ovelhas perdidas da casa de Israel... Não é bom pegar o pão dos filhos e deitá-lo aos cachorrinhos”. Mas ela se curva, ela reconhece o Senhor como o Despenseiro da verdade de Deus, e nem por um momento suporia que Ele abriria mão dessa comissão (a verdade e os princípios de Deus) a favor dela e às suas necessidades. Ela deseja que Deus seja glorificado de acordo com Seus próprios conselhos, e que Jesus continue o testemunho fiel desses conselhos, e o Servo do bom prazer divino, não se importando ela com o que aconteceria a si mesma. “Sim, Senhor”, ela responde, justificando tudo o que Ele havia dito; mas, em plena coerência com isso, ela acrescenta, “mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus senhores”.

 

Tudo isso é lindo – fruto da luz divina em sua alma. A mãe em Lucas 2 está bem abaixo dessa mulher gentia de Marcos 7. Ela não sabia que Jesus cuidaria dos assuntos de seu Pai, mas essa estrangeira sabia que esse era exatamente o negócio que Ele sempre trataria. Ela permitiria que o caminho de Deus, na mão fiel de Cristo, fosse exaltado, embora ela mesma fosse posta de lado, mesmo em suas tristezas.

 

Isso era realmente conhecimento d’Ele; isto era aceitá-Lo em toda a Sua obra, como Alguém que representava Deus num mundo que se rebelou contra Ele, bem como pela pobre pecadora indigna que se abateu a si mesma.

 

Não é bom ser sempre compreendido. Nossos costumes e hábitos deveriam ser os de estranhos, de cidadãos de um país estrangeiro, cuja língua, leis e costumes são pouco conhecidos aqui. Carne e sangue não podem apreciá-los e, portanto, não está bem para os santos de Deus quando o mundo os compreende.

 

Seus parentes ignoravam Jesus. Será que a mãe O reconheceu quando quis que Ele manifestasse Seu poder e fornecesse vinho para as bodas? Será que Seus irmãos O reconheceram quando Lhe disseram: “Se fazes essas coisas, manifesta-Te ao mundo”? Que pensamento! Um esforço para levar o Senhor Jesus a tornar-Se, como dizemos, “um homem do mundo!” Poderia ter havido conhecimento d’Ele nos corações que expressaram tal pensamento como esse? Na verdade, eles estavam muito distantes de tal conhecimento e, portanto, é imediatamente acrescentado pelo evangelista: “nem mesmo Seus irmãos criam n’Ele” (Jo 7). Eles entendiam o Seu poder, mas não os Seus princípios; pois, à maneira dos homens, Eles conectam a possessão de poder ou talentos com o atendimento aos interesses de um homem no mundo.

 

Mas Jesus era a contradição disso, como não preciso dizer; e os parentes carnais de mentalidade mundana não podiam entendê-Lo. Seus princípios eram estranhos a tal mundo. Eles foram desprezados, assim como Davi dançando diante da arca nos pensamentos de uma filha do rei Saul.

 

Mas que atratividade havia n’Ele para quaisquer olhos ou coração que tivessem sido abertos pelo Espírito! Isto nos é testemunhado pelos apóstolos. Eles sabiam muito pouco sobre Ele doutrinalmente e não obtiveram nada permanecendo com Ele – quero dizer nada neste mundo. A condição deles no mundo não melhorou nada por caminharem com Ele; e não se pode dizer que eles se valeram de Seu poder milagroso. Na verdade, eles questionaram Seu poder em vez de o utilizarem. E ainda assim eles se apegaram a Ele. Eles não O acompanharam porque viam n’Ele um depósito completo e pronto para todas as suas provisões. Em nenhuma ocasião, creio que podemos dizer, eles usaram o poder que havia n’Ele para si próprios. E, no entanto, lá estavam eles com Ele – perturbados quando Ele falou em partir, e achados chorando quando pensaram que realmente O haviam perdido.

 

Certamente, podemos dizer novamente: Que atratividade deve ter havido n’Ele, para quaisquer olhos ou coração que tenham sido abertos pelo Espírito, ou atraídos pelo Pai! E com que autoridade um olhar Seu ou uma palavra Sua às vezes adentrava! Vemos isso em Mateus. Aquela única palavra nos lábios do Senhor: “Siga-Me!” foi o suficiente. E essa autoridade e essa atratividade foram sentidas por homens dos temperamentos mais opostos. O lento de coração e racional Tomé e o ardente e impulsivo Pedro foram igualmente mantidos próximos e em torno deste maravilhoso centro. Até mesmo Tomé respiraria naquela presença o espírito do sincero Pedro e diria sob a força dessa atração: “Vamos nós também, para morrermos com Ele”.

 

Não deveríamos dizer: Como será ver e sentir tudo isso em breve em sua perfeição, quando todos, reunidos de todas as regiões, raças e caracteres, da ampla família humana – todas as nações, famílias, povos e línguas, estiverem com Ele e ao Seu redor em um mundo digno d’Ele! Podemos nos deter, em memória, nessas amostras de Sua preciosidade para corações como o nosso, e dar-lhes as boas-vindas como penhores daquilo que, em esperança, é nosso e também deles.

 

A luz de Deus às vezes brilha diante de nós, deixando-nos, conforme tivermos poder, discerni-la, desfrutá-la, usá-la, segui-la. Ela não nos desafia ou exige muito de nós; mas, como eu disse, ela brilha diante de nós, para que possamos refleti-la, se tivermos graça. Vemos essa luz, da mesma maneira, fazendo seu trabalho na igreja primitiva em Jerusalém. A luz de Deus ali não exigia nada. Brilhou forte e poderosamente; mas isso foi tudo. Pedro falou a linguagem daquela luz, quando disse a Ananias: “Guardando-a, não ficava para ti? E, vendida, não estava em teu poder?”. Ela não fez exigências a Ananias, simplesmente brilhava em sua beleza ao lado ou diante dele, para que ele pudesse andar nela de acordo com a medida dele. E tal é, em grande sentido, a glória moral do Senhor Jesus. Nosso primeiro dever para com essa luz é aprender com ela o que Ele é. Não devemos começar nos medir ansiosa e dolorosamente por ela, mas aprender d’Ele com calma, alegria e gratidão em toda a Sua perfeita Humanidade moral. E certamente esta glória se foi! Não há imagem viva disso aqui. Temos seu registro nos evangelistas, mas não seu reflexo em parte alguma.

 

Mas tendo seu registro, podemos dizer, como disse um de nossos poetas: “Houve um Objeto revelado na Terra que poderia recomendar o lugar: mas agora Se foi: Jesus está com o Pai”.

 

Mas embora não esteja aqui, amado, Ele é exatamente o que era. Devemos conhecê-Lo de memória; e a memória não tem capacidade de inventar fábulas; a memória só pode folhear páginas vivas e verdadeiras. E assim O conhecemos por Sua própria eternidade. Num sentido eminente, os discípulos O conheceram pessoalmente. Era a Sua Pessoa, a Sua presença, Ele próprio, que era a atração deles. E se alguém pode falar pelos outros, é de mais disto que precisamos. Podemos estar ocupados em nos familiarizar com as verdades sobre Ele, e podemos ser bem-sucedidos nesse sentido; mas com todo o nosso conhecimento e com toda a ignorância dos discípulos, essas coisas podem nos deixar para trás no poder de uma afeição dominante para com Ele mesmo. E certamente, amados, não nos recusaremos a dizer que está tudo bem quando o coração é atraído por Ele para além do que o conhecimento que temos d’Ele pode explicar. Isso nos diz que Ele tem sido corretamente apreendido. E ainda existem almas simples que exibem isso; mas no geral não é assim. Hoje em dia, a nossa luz, o nosso conhecimento da verdade, está além da medida da resposta do nosso coração a Ele mesmo. E é doloroso para nós, se tivermos alguma correta sensibilidade que for, descobrir isso.

 

“A prerrogativa da nossa fé Cristã”, diz alguém, “o segredo da sua força é este: tudo o que ela tem e tudo o que oferece está depositado numa Pessoa. Foi isto que a tornou forte, enquanto muitas outras coisas se revelaram fracas; que ela tem um Cristo como ponto central, de que não tem uma circunferência sem centro; que não tem apenas libertação, mas um Libertador; não apenas redenção, mas também um Redentor. É isso que a torna adequada para homens que peregrinam. Isto é o que faz dela a luz do Sol, e tudo o mais, quando comparada a ela, ser como a luz da Lua; Pode ser belo, mas frio e ineficaz, enquanto aqui a luz e a vida são uma só.” E novamente ele diz: “E, oh, quão grande é a diferença entre nos submetermos a um complexo de regras e nos lançarmos sobre um coração pulsante, entre aceitar um sistema e nos apegarmos a uma Pessoa. Nossa bem-aventurança – e não percamos isso – é que nossos tesouros estão guardados em uma Pessoa, que não é para uma geração um professor presente e um senhor vivo, e depois, por todas as gerações seguintes, um passado e um morto, mas que está presente e vivo para todas as gerações”. Creio que essas são palavras boas e oportunas de fato.

 

Uma grande combinação de glórias morais semelhantes no ministério do Senhor pode ser traçada, bem como em seu caráter. E no ministério podemos olhar para Ele em relação a Deus, a Satanás e ao homem. Quanto a Deus, o Senhor Jesus, em Sua própria Pessoa e maneiras, sempre representou o Homem para Deus, como Deus gostaria que o homem tivesse feito. Ele estava devolvendo a natureza humana como um sacrifício de descanso, ou de cheiro suave, como incenso puro e perfumado, como um molho de primícias imaculadas do solo humano. Ele restaurou a Deus Sua complacência no homem, que o pecado ou Adão havia tirado d’Ele. O arrependimento de Deus por ter feito o homem (Gn 6:6) foi trocado novamente pelo deleite e glória no homem. E esta oferta foi feita a Deus em meio a todas as contradições, todas as circunstâncias contrárias, tristezas, fadigas, necessidades e decepções de quebrar o coração. Que maravilhoso altar! Que maravilhosa oferta! Foi um sacrifício infinitamente mais rico do que uma eternidade da inocência de Adão teria podido oferecer. E assim como Ele representava o homem para Deus, Ele também representava Deus para o homem.

 

Por causa da apostasia de Adão, Deus foi deixado sem uma imagem aqui; mas agora Ele obtém uma imagem mais completa e brilhante de Si mesmo do que Adão jamais poderia ter apresentado. Jesus estava permitindo que, não uma criação bela, mas um mundo arruinado e sem valor, saber o que Deus era, representando-O em graça, e dizendo: “Quem Me vê a Mim vê o Pai. Ele declarou Deus. Tudo o que é de Deus, tudo o que pode ser conhecido da “luz” à qual nenhum homem pode se aproximar, agora passou diante de nós em Jesus.

 

E novamente, no ministério de Cristo, visto em relação a Deus, O encontramos sempre atento aos direitos de Deus, sempre fiel à verdade e aos princípios de Deus, assim como nas ações diárias e incansáveis de aliviar as necessidades do homem. Que a tristeza humana se dirija a Ele com o apelo que for, Ele nunca sacrificou ou abriu mão de algo que fosse de Deus em favor desse apelo. “Glória a Deus nas maiores alturas”, foi ouvido sobre Ele em Seu nascimento, também. “e na Terra... bom prazer no homem” (JND); e de acordo com isso, a glória de Deus, durante todo o Seu ministério, foi tão zelosamente consultada, assim como a necessidade e a bênção do pecador foram diligentemente atendidas. O eco daquelas vozes, “Glória a Deus” e “Paz na Terra”, foi, como posso expressar, ouvido em todas as ocasiões. O caso da mulher siro-fenícia, já observado, é um exemplo vívido disso. Até que ela assumisse seu lugar em relação aos propósitos e dispensações de Deus, Ele nada poderia fazer por ela; mas então, tudo.

 

Certamente estas são glórias no ministério do Senhor Jesus, nas relações desse ministério com Deus.

 

Então, quanto a Satanás. Em primeiro lugar, e oportuna e apropriadamente, o Senhor o enfrenta como um tentador. Satanás procurou no deserto impregná-Lo com aquelas corrupções morais que ele conseguiu implantar em Adão e na natureza humana. Esta vitória sobre o tentador foi a necessária introdução justa a todas as Suas obras e ações que Lhe diziam respeito. Foi, portanto, o Espírito que O conduziu a esta ação. Como lemos: “Então, foi conduzido Jesus pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo”. Antes que o Filho de Deus pudesse sair e saquear a casa do homem forte, Ele deveria amarrá-lo (Mt 12:29). Antes que pudesse “condenar” as obras das trevas, Ele deveria mostrar que não tinha comunhão com elas (Ef 5:11). Ele deveria resistir ao inimigo e mantê-lo afastado de Si mesmo, antes que pudesse entrar em seu reino para destruir suas obras.

 

Jesus assim silenciou Satanás. Ele o amarrou. Satanás teve que retirar-se como um tentador completamente derrotado. Ele não conseguia colocar nada dele n’Ele; mas ele descobriu que tudo o que existia era de Deus. Cristo manteve fora tudo o que Adão, sob igual tentação, havia deixado entrar; e tendo assim mantido a coisa limpa, Ele pode, sob um título moral perfeito, reprovar o impuro.

 

“Pele por pele”, o acusador pode ter que dizer de outra pessoa, e palavras semelhantes que acusam e desafiam a natureza corrompida comum; mas ele não tinha nada a fazer, como acusador de Jesus, diante do trono de Deus. Ele foi silenciado.

 

Assim começa Seu relacionamento com Satanás. Diante disso, Ele entra em sua casa e saqueia seus bens. Este mundo é essa casa, e ali o Senhor, em Seu ministério, é visto extinguindo diversas e profundas expressões da força do inimigo. Todo surdo ou cego curado, todo leproso limpo; era assim toda obra reparadora de qualquer tipo sob Sua mão. Foi uma pilhagem dos bens do homem forte em sua própria casa. Já o tendo amarrado, Ele agora saqueia seus bens. Por fim, ele cede a Ele como aquele que tinha “o poder da morte”. O Calvário foi a hora do poder das trevas. Todos os recursos de Satanás foram trazidos para lá e toda a sua sutileza aplicada; mas ele foi derrubado. Seu cativo foi seu Conquistador. Pela morte Ele destruiu aquele que tinha o poder dela. Ele aniquilou o pecado pelo sacrifício de Si mesmo. A cabeça da serpente foi ferida; como outro disse, que “a morte, e não o homem, ficou sem forças”.

 

Assim, Jesus, o Filho de Deus, foi o Esmagador de Satanás, como antes havia sido seu Amarrador e seu Saqueador. Mas há outra glória moral que brilha no ministério de Cristo, no contato que Ele tem com Satanás. Quero dizer isto: Ele nunca permite que ele dê testemunho de Si. O testemunho pode ser verdadeiro e, como dizemos, palavras lisonjeiras, boas e belas, como: “bem sei Quem és, o Santo de Deus”, mas Jesus não permitiu que ele falasse. Pois Seu ministério era tão puro quanto gracioso. Ele não seria ajudado em Seu ministério por aquele a quem Ele veio destruir. Ele não poderia ter comunhão com as trevas, em Seu serviço, assim como em Sua natureza. Ele não agiria por conveniência, portanto, repreendê-lo e silenciá-lo foi a resposta que obteve ao seu testemunho[1]·. Então, quanto ao homem, as glórias morais que se manifestam no ministério do Senhor Jesus são realmente brilhantes e excelentes. [1] No que diz respeito ao ministério do Senhor no Evangelho em relação a Satanás, Ele é simplesmente, como vimos agora, seu Amarrador, seu Saqueador, seu Esmagador. No Apocalipse, nós O seguimos em outras relações com o mesmo adversário. Ali O vemos “lançá-lo do céu”; depois, no devido tempo, “lançou-o no abismo”; e depois “lançou-o no lago de fogo e enxofre” (Ap 12, 20). Assim, seguimos Sua conquista sobre ele desde o deserto da tentação até o lago de fogo.

 

Ele estava constantemente aliviando e servindo o homem em toda a variedade de sua miséria; mas Ele certamente o estava expondo, mostrando que ele tinha uma natureza totalmente afastada de Deus em revolta e apostasia. Mas além; Ele o estava exercitando. Isto deve ser muito considerado, embora talvez não seja tão comumente notado. Em Seus ensinamentos, Ele exercitava as pessoas em qualquer relação que elas mantivessem Consigo mesmo; discípulos ou a multidão, ou aqueles que Lhe trouxeram suas aflições, ou aqueles que eram amigos, como posso chamá-los, ou aqueles que, como inimigos, O resistiram. Ele continuamente exercitava o coração ou a consciência dos discípulos, enquanto caminhava com eles e os ensinava. Isso é tão comum que não precisa ser repetido. Ele trataria da mesma forma a multidão que O seguia. “Ouçam e entendam”, Ele lhes dizia; exercitando assim suas próprias mentes, enquanto Ele os ensinava.

 

Para alguns que Lhe traziam suas aflições, Ele dizia: “Credes vós que Eu possa fazer isto?” ou palavras semelhantes. A mulher siro-fenícia é uma testemunha eminente para nós de como Ele exerceu esse grupo de pessoas.

 

Dirigindo-Se ao gentil Simão em Lucas 7, depois de lhe contar a história do homem que tinha dois devedores: “Dize, pois”, diz Ele, “qual deles o amará mais?”

 

Da mesma forma, Ele constantemente exercitava os fariseus, seus opositores incansáveis. E há uma grande voz nisso, um grande testemunho do que Ele é. Isso nos diz que Ele não estava realizando um julgamento sumário sobre eles, mas de bom grado queria leva-los ao arrependimento: e assim, ao chamar os discípulos ao exercício, Ele nos diz que aprendemos Suas lições apenas da maneira devida, na medida em que somos atraídos, em alguma atividade de entendimento, coração ou consciência, sobre elas. Esta maneira de exercitar aqueles que Ele liderava ou ensinava é certamente outra das glórias morais que marcaram o Seu ministério. Mas, além disso: em Seu ministério para com o homem, nós O vemos frequentemente como um Reprovador, necessariamente assim, no meio de algo como a família humana; mas Sua maneira de reprovar brilha com uma excelência que bem podemos admirar. Quando repreendeu os fariseus, a quem o mundanismo colocou em oposição a Ele, Ele usou palavras muito solenes: “quem não é Comigo é contra Mim”. Mas quando Ele se refere àqueles que O reconhecem e o amavam, mas que precisavam de mais força de fé ou medida de luz, para estarem em plena companhia d’Ele, Ele ajusta em outros termos: “quem não é contra nós é por nós”.

 

Vemos a Ele novamente nesse caráter em Mateus 20, no caso dos dez e dos dois irmãos. Como Ele modera Sua repreensão por causa do bem e do direito que havia naqueles a quem Ele teve que repreender? E nisso Ele toma um lugar à parte de seus discípulos irados, que não teriam poupado os dois irmãos em qualquer medida. Ele pacientemente se assenta sobre todo o material e separa o precioso do vil que estava nele.

 

Assim, Ele é ouvido novamente como um Reprovador no caso de João, proibindo qualquer um de expulsar demônios em Seu nome, se não andasse com eles. Mas naquele momento o espírito de João estava sob correção. À luz das palavras anteriores do Senhor, ele descobriu o erro que havia cometido e se refere a esse erro, embora o próprio Senhor não tivesse de forma alguma aludido a ele. Mas sendo assim, João já tendo uma percepção de seu erro, e simplesmente deixando-o revelar-se, o Senhor trata com isso com a maior gentileza (veja Lucas 9:46-50).

 

O mesmo acontece com João Batista: o Senhor o repreende com acentuada consideração. Ele estava na prisão então. Que fato isso deve ter sido apreciado pelo Senhor naquele momento! Mas Ele seria repreendido por ter enviado uma mensagem ao seu Senhor que O reprovava. Mas a delicadeza da repreensão é bela. Ele retorna uma mensagem a João que ninguém, exceto o próprio João, poderia avaliar: “bem-aventurado é aquele que se não escandalizar em Mim”. Mesmo os discípulos de João, que levaram a mensagem entre ele e o Senhor, não poderiam ter entendido isto. Jesus exporia João a si mesmo, mas não aos Seus discípulos nem ao mundo.

 

Além disso, Sua repreensão aos dois de Emaús e a de Tomé após a ressurreição, cada um tem sua própria excelência. Pedro, tanto em Mateus 16 como em 17, tem que enfrentar repreensão; mas a repreensão é ministrada de maneira muito diferente em cada ocasião.

 

Mas toda essa variedade está repleta de beleza moral; e podemos dizer com certeza que, quer Seu estilo seja decisivo ou gentil, afiado ou atencioso; quer a repreensão em Seus lábios seja tão reduzida a ponto de quase não ser uma repreensão, ou tão intensificada que quase se torna a linguagem de repulsa e da renúncia; ainda assim, quando a ocasião é ponderada, toda essa variedade será considerada como sendo apenas várias perfeições. Todas essas Suas repreensões eram “pendentes de ouro e gargantilhas de ouro fino”, pendurados ou não em “ouvido atento” (Pv 25:12 – ACF). “Fira-me o Justo, será isso uma benignidade; e repreenda-me, será um excelente óleo, que a minha cabeça não rejeitará” (Sl 141:5). Certamente o Senhor deu aos Seus discípulos a oportunidade de provar isso.

 

 Conclusão

 

Tenho agora traçado algumas das características de Cristo. Ele representou o homem para Deus – o homem como ele deveria ser – e Deus descansou n’Ele.

 

Esta perfeição moral do Homem Cristo Jesus, e a aceitação d’Ele por Deus, foi significada pela oferta de manjares, aquele bolo de flor de farinha, que era assado no forno, na panela ou na frigideira, com seu óleo e seu incenso (Lv 2).

 

Quando o Senhor Jesus esteve aqui, e assim Se manifestou como Homem a Deus, o deleite de Deus n’Ele estava sempre se expressando. Ele cresceu diante d’Ele na natureza humana e na exibição de todas as virtudes humanas; e Ele não precisava de nada em nenhum momento para recomendá-Lo, a não ser Ele próprio, assim como era. Em Sua Pessoa e em Seus caminhos, o homem foi moralmente glorificado, de modo que, quando chegasse o fim ou a perfeição de Sua carreira, Ele pudesse ir “direto” para Deus, assim como o molho das primícias de antigamente era levado direta e imediatamente, assim como estava, diretamente do campo, sem precisar de nenhum processo para se preparar para a presença e aceitação de Deus (Lv 23:10). O título de Jesus à glória era moral. Ele tinha o direito moral de ser glorificado; Seu título estava n’Ele mesmo. João 13:31-32 é a exposição bendita disso em sua devida conexão. “Agora, é glorificado o Filho do Homem”, diz o Senhor, assim que Judas saiu da mesa; pois essa ação de Judas foi o prenúncio inegável de o Senhor ser levado pelos judeus, e esse foi o firme anúncio de Ele ser morto pelos gentios. E sendo a cruz a completude e perfeição da plena forma de glória moral n’Ele, foi neste momento que Ele pronunciou estas palavras: “Agora o Filho do Homem é glorificado”. Depois acrescenta: “e Deus é glorificado n’Ele”.

 

Deus foi tão perfeitamente glorificado então quanto o Filho do Homem foi, embora a glória fosse outra. O Filho do Homem foi então glorificado ao completar aquela forma plena de beleza moral que esteve brilhando n’Ele durante toda a Sua vida. Nada disso deveria então faltar, assim como nada, desde o início até aquela hora tardia, jamais se misturou a ela que fosse indigno dela. A hora estava próxima quando deveria brilhar o último raio que lhe daria o seu brilho total. Mas Deus também foi glorificado, porque tudo o que era d’Ele foi mantido ou exibido. Seus direitos foram mantidos, Sua bondade demonstrada. Misericórdia e verdade, justiça e paz eram iguais e igualmente satisfeitas ou gratificadas. A verdade, a santidade, o amor, a majestade de Deus e tudo mais foi magnificado de uma forma e ilustrado com uma luz que ultrapassa tudo o que jamais poderia ter sido conhecido d’Eles em outro lugar. A cruz, como alguém falou, é a maravilha moral do universo.

 

Mas então novamente o Senhor acrescenta: “Se Deus é glorificado n’Ele, também Deus O glorificará em Si mesmo e logo O há de glorificar”. Este é o reconhecimento do Seu próprio título à glória pessoal. Ele já havia aperfeiçoado a forma plena de glória moral durante a vida e na morte. Ele também tinha vindicado a glória de Deus, como temos visto. Portanto, era apenas uma coisa justa que Ele agora entrasse em Sua própria glória pessoal. E isso Ele fez quando assumiu Seu lugar no céu, à direita da majestade ali, como em companhia do próprio Deus, e tudo isso de uma vez, ou “imediatamente”.

 

A obra de Deus como Criador foi rapidamente maculada nas mãos do homem. O homem havia se arruinado; de modo que está escrito: “arrependeu-Se o SENHOR de haver feito o homem” (Gn 6). Uma terrível mudança na mente Divina, desde o dia em que Deus viu tudo o que havia feito, e eis que era muito bom! (Gn 1). Mas no Senhor Jesus, a complacência divina no homem foi restaurada.

 

Isso foi abençoado! E o mais aceitável, como podemos dizer, do arrependimento anterior. Foi mais do que o primeiro regozijo, foi uma recuperação após perdas e decepções; e isso também, de uma forma que excedia a primeira. E como o primeiro homem, por causa do seu pecado, foi colocado fora da criação, como posso dizer, este Segundo Homem, (sendo, como Ele também era, “o Senhor do céu”), ao glorificar a Deus, foi assentado como a cabeça da criação, como à direita da majestade nas alturas. Jesus está no céu como Homem glorificado, porque aqui na terra Deus foi glorificado n’Ele como Aquele obediente na vida e na morte. Ele está lá de fato em outros caracteres. Certamente sabemos disso. Ele está lá como um Conquistador, como um Expectante, como o Sumo Sacerdote no tabernáculo que Deus ergueu, como nosso Precursor e como o Purificador de nossos pecados. Mas Ele também está lá, nos mais altos céus, glorificado, porque n’Ele Deus foi glorificado aqui na Terra.

 

A vida e a glória eram d’Ele por direito pessoal e por título moral. Um Se deleita em Se demorar em tal verdade, e repeti-la continuamente. Ele nunca perdeu o jardim do Éden. Na verdade, Ele caminhou fora dele todos os Seus dias, ou entre os espinhos e cardos, as tristezas e as privações de um mundo em ruínas. Mas isso Ele fez em graça. Ele assumiu tal condição sobre Si; mas Ele não foi exposto a isso. Ele não estava, como Adão e como todos nós, de um lado dos querubins e da espada flamejante, estando do outro lado a árvore da vida e o jardim do Éden. Em Sua história, em vez de anjos mantê-Lo fora ou para além da entrada, quando Ele havia passado pela tentação, eles vieram e ministraram a Ele. Pois Ele ficou firme onde Adão falhou e caiu. Portanto, Homem como Ele era, verdadeira e simplesmente Homem, Ele era esse Homem distinto. Deus foi glorificado n’Ele, pois em tudo o mais Ele havia sido desonrado e desapontado.

 

Num certo sentido, esta perfeição do Filho do homem, esta perfeição moral, é tudo para nós. Ela concede seu cheiro ao sangue que expia nossos pecados. Foi como a nuvem de incenso que entrava na presença de Deus, junto com o sangue, no dia da expiação (Lv 16).

 

Mas, noutro sentido, esta perfeição é demais para nós. É elevada, não podemos alcançá-la. Ela supera o sentido moral, na medida em que olhamos para ela na lembrança do que nós mesmos somos, ao mesmo tempo em que nos enche de admiração, na medida em que olhamos para ela como nos dizendo o que Ele é. A glória judicial pessoal, quando manifestada antigamente, era avassaladora. Os mais favorecidos dos filhos dos homens não puderam parar diante dela, como Isaías, Ezequiel e Daniel; e Pedro e João experimentaram o mesmo. E esta glória moral, da mesma forma nos expondo, é avassaladora.

 

A fé, porém, sente-se em casa na presença dessa glória. O deus deste mundo cega a mente para a apreensão e gozo disso; mas a fé lhe dá as boas-vindas. Essas são as histórias dela aqui entre os homens. Na presença dela, fariseus e saduceus pediram juntos um sinal do céu. A mãe, por vaidade, erra a respeito dela, e os irmãos do Senhor erram por mundanismo (Jo 2:7). Os próprios discípulos estão sob constante repreensão por parte dela. O azeite batido para esta luz era puro demais para qualquer um; mas estava sempre queimando no santuário, ou “diante do Senhor”. A sinagoga de Nazaré nos permite aprender de maneira impressionante o despreparo do homem quanto a ela. Eles reconheceram as palavras graciosas que saíram dos lábios do Senhor; eles sentiram o poder delas. Mas rapidamente uma forte corrente de corrupção da natureza se instalou e resistiu a este movimento nos seus corações, e a venceu. O testemunho humilhado e abnegado de Deus, no meio de um mundo orgulhoso e revoltado, foi descoberto; e isso não serviria para eles. Deixe o “filho de José” falar como quiser, palavras boas e palavras confortáveis, Ele não será aceito – Ele é filho de carpinteiro (Lucas 4). É maravilhoso – maravilhoso testemunho da profunda corrupção incrustada. O homem tem as suas amabilidades, os seus gostos, as suas virtudes, as suas sensibilidades, como nos pode dizer esta cena de Nazaré em Lucas 4. As graciosas palavras de Jesus suscitaram por um momento uma corrente de bons sentimentos; mas o que foi tudo isso e onde estava tudo quando Deus os testou? Ah! Amados, ainda podemos dizer, apesar disso, nossa amabilidade e respeitabilidade, nossos gostos e emoções, que em nós (isto é, em nossa carne) “não habita bem algum”.

 

Mas novamente, eu digo, a fé está em casa com Jesus. Podemos, pergunto eu, tratar tal Pessoa com medo ou suspeita? Podemos duvidar d’Ele? Poderíamos ter escolhido um lugar distante d’Ele que estava assentado junto ao poço com a mulher de Sicar? Ela mesma ocupou esse lugar? Certamente, amado, devemos buscar intimidade com Ele. Os discípulos que O acompanharam tiveram que aprender continuamente suas lições. Sabemos algo sobre isso. Eles tiveram que descobri-Lo novamente, em vez de apreciá-Lo como já descoberto. No capítulo 14 de Mateus eles tiveram que clamar: “és verdadeiramente o Filho de Deus”. Isso foi descobri-Lo novamente. Se a fé deles fosse simples, eles teriam dormido no barco com Ele. Que cena foi aquela, para vergonha deles e para Sua glória! Eles falaram de forma insultuosa ou reprovadora ao Senhor, como se Ele fosse indiferente ao perigo deles: “Mestre, não Te importa que pereçamos?” Ele acordou ao som da voz deles e imediatamente os colocou em segurança. Mas então, Ele os repreende, não pela injustiça que suas duras palavras Lhe causaram, mas pela falta de fé deles.

 

Quão perfeito foi isso! Quão perfeito, certamente, era tudo; e cada uma delas em sua geração! – as virtudes humanas, os frutos da unção que estava sobre Ele e as Suas glórias divinas. As naturezas da Única Pessoa não se confundem; mas a refulgência da divina é restringida, a simplicidade da humana é elevada. Não há nada assim, não poderia haver nada assim, em toda a criação. E ainda assim o humano era humano, e o divino era divino. Jesus dormiu no barco: Ele era Homem. Jesus acalmou os ventos e as ondas: Ele era Deus.

 

Esta glória moral deve brilhar. Outras glórias deverão dar lugar até que isso seja feito. Os gregos, que vieram adorar em Jerusalém durante a festa, perguntam por Jesus, desejando vê-Lo. Isso tinha o cheiro do reino ou da glória real do Messias. Foi um exemplo daquele dia, quando as nações subirão à cidade dos Judeus, para celebrar o dia santo; e quando, como Rei em Sião, Ele for Senhor de tudo e Deus de toda a Terra.

 

Mas havia um segredo mais profundo do que este. É necessário uma percepção mais justa do caminho de Deus, do que simplesmente estar esperando um reino. Os fariseus precisavam disso, quando em Lucas 17 perguntaram ao Senhor quando o reino deveria aparecer. Ele teve que falar-lhes de outro reino, que eles não apreenderam – um reino interior, um reino presente, no qual era necessário entrar e conhecer, antes que o glorioso reino manifestado pudesse aparecer. Os discípulos precisavam disso em Atos 1, quando perguntaram ao Senhor se naquele momento Ele restauraria o reino a Israel. Ele teve que contar-lhes também outra coisa, antes que a restauração pudesse ocorrer; que eles deveriam ser dotados pelo Espírito, para testemunho d’Ele em todo o mundo.

 

Então aqui em João 12. O Senhor nos deixa saber que a glória moral deve preceder o reino. Ele certamente brilhará na glória do trono em breve, e os gentios então virão a Sião e verão o Rei em Sua beleza; mas antes que isso aconteça, a glória moral deve ser exibida em toda a sua plenitude e imaculabilidade. E este foi o Seu pensamento agora, quando os gentios perguntaram por Ele. “Agora, é glorificado o Filho do Homem, e Deus é glorificado n’Ele”. Esta foi a Sua glória moral, como dissemos antes, em João 13:31-32. Ela brilhava em todos os Seus caminhos, desde o Seu nascimento até então; Sua morte seria a completude disso; e, portanto, chegou a hora em que deveria brilhar o último raio que iria formá-la e dar-lhe perfeição. O Senhor, portanto, fornece ou introduz nesta ocasião, como fez, como vimos, em Lucas 17 e em Atos 1, a verdade, a verdade adicional, que precisa de uma percepção mais rica e justa dos caminhos de Deus para ser apreendida. A glória moral deve ser plenamente manifestada, antes que o Messias possa mostrar-Se em glória real até os confins da Terra.

 

Ela é, no entanto, d’Ele e apenas d’Ele. Quão infinitamente distante do coração de alguém está qualquer outro pensamento! Quando os céus se abriram, em Atos 10, o lençol foi visto descendo antes que Pedro fosse ordenado a ter comunhão com ele, ou antes que ele subisse e se perdesse ou se escondesse novamente no alto. Seu conteúdo tinha que ser purificado ou santificado. Mas quando o céu foi aberto em Mateus 3, Jesus na Terra não precisou ser elevado para ser aprovado ali, mas vozes e visões do alto selaram-No e atestaram-No tal como Ele era. “Este é o Meu Filho amado, em Quem Me comprazo”.

 

E quando os céus se abriram novamente, como em Mateus 27, ou seja, quando o véu do templo se rasgou em dois, tudo estava consumado, nada mais era necessário, a obra de Jesus foi selada e atestada tal como foi então. Um céu aberto no início brilhou na plena aceitação da Sua Pessoa; um céu aberto no final brilhou em plena aceitação de Sua obra.

 

E deixe-me encerrar dizendo que é abençoado e feliz, bem como parte de nossa adoração, notar as características do caminho e ministério do Senhor aqui na Terra, como tenho procurado fazer neste artigo; por tudo o que Ele fez e disse, todo o Seu serviço, seja na substância ou no estilo, é o testemunho do que Ele era, e Ele é o testemunho para nós do que Deus é. E assim chegamos a Deus, o Bendito, por meio dos caminhos do Senhor Jesus, nas páginas dos evangelistas. Cada passo nesse caminho se torna importante para nós. Tudo o que Ele fez e disse foi uma expressão real e verdadeira de Si mesmo, assim como Ele próprio era uma expressão real e verdadeira de Deus. E se pudermos entender o caráter de Seu ministério, ou ler a glória moral associada a cada momento e cada detalhe de Sua caminhada e serviço aqui na Terra, e assim aprendermos o que Ele é, e assim aprendermos o que Deus é, alcançaremos Deus, no conhecimento certo e claro d’Ele, por meio dos caminhos e atividades cotidianas da vida d’Este divino Filho do Homem.

 

J. G. Bellett

 

 



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